"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

domingo, 5 de maio de 2013

O despotismo ilustrado em Portugal: Pombal

As novas ideias dos filósofos e economistas da Ilustração difundiram-se por entre as pessoas cultas da burguesia e em alguns setores das classes privilegiadas. Chegaram, mesmo, a influenciar chefes de Estado (monarcas, primeiros-ministros). Alguns destes adaptaram sua política às doutrinas do Iluminismo e tentaram realizar o programa dos filósofos: governar por meio da razão em prol do bem público, a fim de estabelecer "o reino das luzes".

Todos eles se consideravam servidores do Estado, obrigados a trabalhar pelo bem público. Para saber como realizar a felicidade dos seus súditos, o monarca devia ser esclarecido. Mas, para poder governar livremente, em prol do povo, o soberano devia ser absoluto. Os sistemas representativos dos regimes democráticos eram considerados desnecessários e mesmo, "subversivos e perigosos".

As reformas foram realizadas sem consultar o povo, muitas vezes à força. "Tudo para o povo, mas sem o povo". É o que se denomina despotismo esclarecido (ou ilustrado).

Nem todos os "déspotas esclarecidos" foram inteiramente sinceros. Ademais, às vezes não puderam levar à prática as teorias iluministas. Finalmente, nem sempre a realização das reformas deu bons resultados.

Mesmo assim, houve evidentes progressos em muitos setores.

Na segunda metade do século XVIII, o despotismo "esclarecido" esteve em moda em toda a Europa. Entre os estadistas reformadores destacam-se:

José II, da Áustria,
Frederico II, da Prússia,
Catarina II, da Rússia,
Carlos III, da Espanha,
o marquês de Pombal, em Portugal.

* O despotismo ilustrado em Portugal: Pombal. D. João V o Magnânimo (reinado: 1706-1750), exerceu o governo absoluto e nunca reuniu as Cortes. Riquezas fabulosas, provenientes das minas de ouro e diamantes do Brasil, entraram em Portugal. Mas, em lugar de empregá-la no desenvolvimento da economia portuguesa, D. João V esbanjou-as com insensata prodigalidade. O luxo da corte era deslumbrante. Quando morreu, D. João V deixou o Estado mergulhado em dívidas e o povo esmagado pelos impostos.

Sucedeu-lhe D. José I o Reformador, rei de Portugal de 1750 a 1777. Logo que assumiu o trono, escolheu para ministro Sebastião José de Carvalho e Melo - depois marquês de Pombal - que se revelou brilhante estadista, o mais ilustre na história de Portugal.


Retrato do Marquês de Pombal, Louis-Michel Loo e Claude Joseph Vernet


A reconstrução de Lisboa e a repressão das desordens, após o terrível terremoto de 1755, revelaram a energia e as notáveis qualidades de organizador do marquês de Pombal - e deram-lhe prestígio popular. A partir de então, D. José confiou-lhe inteiramente a direção dos negócios públicos.

O marquês de Pombal, ex-diplomata em Londres, partidário das ideias filosóficas do século XVIII, foi um dos mais eminentes representantes do "despotismo esclarecido". Seu governo foi despótico, mas realizou admiráveis reformas, despertando o país de seu letargo depois de dois séculos e dando novo impulso à vida portuguesa:

- fortaleceu o poder real;
- propôs-se opor às classes aristocráticas um povo independente e ilustrado;
- proibiu a exportação de ouro para a Inglaterra;
- reorganizou a instrução pública e reformou a Universidade de Coimbra;
- reorganizou o exército;
- incrementou a agricultura, a indústria e o comércio.

O marquês de Pombal governou o país com mão de ferro, às vezes com crueldade. perseguiu a nobreza em geral. Lutou contra os jesuítas, cuja influência achava prejudicial no governo, e acabou expulsando-os (1759). [A Companhia de Jesus foi suprimida em 1773, por uma bula pontifical de Clemente XIV. Mas foi restabelecida em 1814, pelo papa Pio VII.]

Quando el-Rei D. José I morreu, subiu ao trono D. Maria I, inimiga da reforma e das ideias de Pombal. A rainha demitiu o marquês, imediatamente, e mandou que o processassem. O marquês foi condenado ao desterro da corte; e morreu, amargurado, em 1782. Quase todas as reformas pombalinas foram então anuladas. E Portugal voltou ao antigo regime.

* Reflexos no Brasil. A ação do marquês de Pombal refletiu no Brasil, em vários setores:

- transferiu a capital da Bahia para o Rio de Janeiro;
- libertou os ameríndios e compensou a falta de braços com uma grande emigração de ilhéus (mais de 20.000 vieram dos Açores);
- proibiu a ourivesaria, a fim de evitar o contrabando de joias e de metais preciosos;
- estimulou o comércio, diminuindo os monopólios e criando bancos comerciais (os mais importantes: de Grão-Pará e de Pernambuco);
- cuidou especialmente da administração das minas;
- administrou com eficiência os tesouros do Brasil;
- reformou a administração da Justiça;
- expulsou os jesuítas, aboliu a Inquisição e todos os direitos temporais do clero; 
- organizou um bom exército, equipou uma frota condizente, e reconstruiu as fortalezas do Brasil de acordo com o novo sistema de bastiões de Vauban;
- aboliu todos os direitos dos antigos capitães-mores, que se tinham conservado desde 1534 (as capitanias de Porto Seguro e de Ilhéus foram anexadas à Bahia).

Houve, porém, aspectos negativos na política de Pombal. A expulsão dos jesuítas trouxe prejuízos ao Brasil. Eles se viram forçados a abandonar, no Amazonas, umas 80 povoações que dirigiam e sustentavam. Em substituição aos religiosos, o governo português enviou funcionários leigos, mas estes fracassaram na tarefa. Os aldeamentos decaíram e muitos deles desapareceram completamente.

Além disso, o ensino ficou notavelmente prejudicado em todo o país. A maioria das escolas achava-se nas mãos dos jesuítas, que tinham trazido ao Brasil sua vasta experiência educacional, textos modernizados, mais competente erudição e melhores métodos pedagógicos. A expulsão dos jesuítas provocou o fechamento de grande número de colégios e a perda de excelentes professores. Só muito lentamente foi possível suprir tais lacunas.

BECKER, Idel. Pequena História da Civilização Ocidental. São Paulo: Nacional, 1974. p. 407-409.

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