"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

Breve história do poder

Na aurora da humanidade todos os homens viviam como caçadores-coletores. Todos eram iguais. Não havia poder. Mas os homens temiam as águas oriundas das cheias, os eclipses, a lava que escorria do vulcão, os raios, os tigres dentes de sabre... O homem teme a morte e assim nascem os primeiros deuses e a casta privilegiada de sacerdotes: o poder religioso. Todavia, os deuses eram inúmeros e os sacerdotes inventaram o poder teocrático, ou seja, os deuses escolhiam um chefe para governar todos. Nascem as dinastias no mundo antigo. Os reis-deuses de seus palácios ditam as ordens para os súditos: escravos erguem templos e tumbas, camponeses aram as terras e pagam tributos.

Com o aparecimento da escrita o conhecimento é manipulado pelas castas (sacerdotes, escribas, guerreiros). O povo continua iletrado. Sacerdotes criam então o Deus único – fálico infalível. Nasce o monoteísmo e o poder se concentra numa corte luxuosa: primeiro os judeus, depois os cristãos e, em seguida, os muçulmanos. Quem não acreditasse no Deus fálico infalível era exterminado. E assim tem ‘sobrevivido’ a humanidade nessas três caixinhas por três mil anos: pensar diferente é motivo para ser perseguido, humilhado, torturado, morto. Um banho de sangue em nome do Deus único. 

As guerras de conquista fizeram as riquezas dos donos do poder. Os que falavam da misericórdia do Deus fálico infalível são os que mantinham nas frias masmorras milhares de homens, mulheres e crianças e os torturavam e matavam. E dessa forma aumentava o poder e a riqueza da dupla Estado-Igreja através da Inquisição medieval, da invasão da América, da escravidão africana, do holocausto nazista, das bombas de Hiroshima e Nagasaki, do apartheid e dos incontáveis genocídios ocorridos no primeiro quartel do século XXI.

O próximo passo para a concentração de poder foi a tecnologia. As máquinas substituem os homens. Os tributos pagos pelos trabalhadores alimentam o luxo das ‘elites’ político-religiosas. Para o povo sobram escolas sucateadas, hospitais em ruínas, ruas esburacadas, esgotos a céu aberto... e quando ocorrem manifestações reivindicando melhores condições de vida e trabalho, o poder responde com a truculência das forças repressivas: polícias e exércitos. Cidadanias negadas para favelados, pobres, negros, gays, lésbicas...

As insanidades continuam. A arrogância fez com que os cientistas modificassem milhares de espécies vegetais e animais: tudo é geneticamente manipulado. Como resultado temos mais doenças e uma alimentação de péssima qualidade. A água? Comprada. O ar? Envenenado. A natureza? Destruída para dar lugar a shoppings centers, condomínios luxuosos, fábricas, resorts... E o homem? Continua a guerrear, escravizar, saquear, aterrorizar os outros homens.

© 2016 by Orides Maurer Jr. é historiador, autor do blog "História e Sociedade" e dos livros "Ecos do tempo: uma viagem pela história" (2015), "O olhar do historiador: vidas cotidianas" (2016), "Leituras da história: atas das confissões do Diabo" (inédito) e "História insurgente" (inédito).

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