"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Aprendendo com os índios

Índios Apiaká no rio Arinos, Hércules Florence

O sucesso da colonização portuguesa só foi possível com a consolidação do povoamento, garantido pela colaboração dos indígenas e o aprendizado de seus conhecimentos sobre a natureza. Num primeiro momento, os europeus tinham muitas deficiências diante do meio natural desconhecido, ao passo que os índios eram capazes de percorrer os caminhos, evitar animais perigosos, utilizar-se de frutas, plantas e raízes para sua alimentação, enfim, sabiam conviver com o ambiente a que estavam acostumados. Foi com os índios que os europeus aprenderam a caçar e pescar nas matas e rios brasileiros, a colher a mandioca (e livrar-se de seu veneno), a cultivar o milho, o fumo, a batata-doce, a alimentar-se com frutas e animais "exóticos", a lidar com os infernais insetos e com os caprichos do clima.

Muitos costumes indígenas foram incorporados, então, pelos colonos - agricultores, comerciantes, sertanistas, burocratas - que, algumas vezes, acharam por bem distanciar-se dos hábitos europeus inadequados à vida nas novas terras. Em alguns casos, adaptações foram feitas procurando harmonizar traços da cultura europeia com elementos da indígena.

Com relação à postura diante da natureza, havia, entretanto, uma diferença básica entre europeus e índios. Enquanto estes concebiam o homem como parte praticamente indistinta da natureza, enxergando o universo como um todo, os europeus, apoiados ideologicamente na tradição bíblica, que atribuía ao homem direito de vida e morte sobre os animais e plantas, acreditavam no ser humano como o senhor absoluto da natureza, com direito e poder de usufruir de seus recursos sem preocupar-se com as consequências predatórias e destrutivas desse tipo de exploração do meio ambiente.

E, finalmente, os europeus utilizaram-se dos índios como instrumento de apropriação dos recursos naturais. Por ocasião dos primeiros contatos e no início da colonização, em troca de objetos de metal e ferramentas, os índios atuaram na extração do pau-brasil e outros produtos desejados pelos comerciantes europeus, colaboraram no assentamento de povoações, na formação de pequenas roças e de grandes plantações, forneceram alimentos, animais e peles aos navegantes, aventureiros, missionários e colonos.

Foi com o auxílio dos saberes indígenas - senso de orientação, conhecimentos geográficos, capacidades desenvolvidas para andar adequadamente na mata e navegar com segurança nos rios - que os portugueses puderam desbravar o litoral e os sertões. A habilidade e a força dos indígenas para a corrida, o salto, a caça, a pesca e a  natação os tornava também muito úteis para os colonos. Revelaram-se grandes remadores e hábeis no manejo dos barcos a vela. Aprendiam ainda com facilidade ofícios como o de marceneiro, carpinteiro, oleiro, saleiro, carreiro e vaqueiro.

MESGRAVIS, Laima e PINSKY, Carla Bassanezi. O Brasil que os europeus encontraram. São Paulo: Contexto, 2000. p. 26-27.

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