"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

A sexualidade no mundo medieval

Sob a influência da Igreja, o termo “fornicação” designava, na Idade Média, toda forma de relação sexual fora do casamento e não mais, como em Roma, o comércio com as prostitutas. Em termos de repressão, a união consentida entre duas pessoas livres de qualquer laço (fornicação simples) era sancionada apenas em foros internos, por penitências privadas. As formas mais graves de fornicação tais como o estupro (relações, mesmo que consentidas, com uma virgem, uma freira, uma viúva ou uma doméstica), o adultério, a violação, o rapto, o bestialismo e a sodomia resultavam em penas criminais que, dependendo do caso, poderiam ser até de morte. (Jacques Poumarède)


Casal homossexual. Relevo. Église de Maillezais. 
Foto: Martial34


Em termos médicos, filosóficos e até religiosos, a antropologia cristã se baseou nos saberes antigos, e as principais ideias do corpus médico greco-latino permaneciam: o esperma era considerado um sangue puro e o orgasmo, um esforço difícil. Era importante, portanto, moderar a atividade genésica, que poderia levar à estupidez. E também conter o desejo da mulher, insaciável, se necessário acalmá-la por meio de uma gravidez. Havia uma relação entre o prazer feminino, a normalidade do coito (a penetração) e a finalidade genésica. Além disso, o prazer intenso era visto como epilético.

Médicos e filósofos acreditavam que a saúde do espírito era inversamente proporcional ao vigor genital. O desejo era a submissão do ser, uma fonte de desordem e um obstáculo à sabedoria. O sexo tinha, portanto (como no judaísmo e várias religiões antigas), uma relação perigosa com o sagrado.

Durante toda a Alta Idade Média, o modelo conjugal romano-cristão se chocava com as restrições dos clãs, e a uma poligenia generalizada em toda a aristocracia. A partir do século XI, lentamente a ordem sexual sonhada por alguns clérigos foi sendo parcialmente realizada. Mesmo se alguns “arquipélagos” de padres concubinários persistissem, o clero secular aceitou de bom grado a continência.

Os atos sodomitas heterossexuais – entre eles o coitus interruptus – eram praticados, mas a contracepção era reservada a algumas minorias (sobretudo urbanas) que desenvolveram, sem muita vergonha, a erótica do vestuário, do corpo e dos encontros carnais. Miniaturas, poemas e romances testemunham esse erotismo. (Jacques Rossiaud, professor da Universidade Lyon II)


In: BETING, Graziella. Coleção história de A a Z: [volume] 2: Idade Média. Rio de Janeiro: Duetto, 2009. p.12 e 16.

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