"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

terça-feira, 9 de maio de 2017

Do Império Celta ao Império Assírio II

A Europa do Norte continua inóspita, com seu nevoeiro e suas chuvas. Os celtas encontram-se aí em eternos combates com os germanos, contra os quais se fortificaram em Turíngia. Às vezes os rechaçam, sem jamais atravessar o Elba.

Os germanos permaneceram bem primitivos: os landes pobres e as sombrias florestas que eles ocupam predispõem-nos a uma instabilidade perigosda - o movimento do sol orienta suas cobiças e a conquista se tornará a obsessão da sociedade germânica.

Mas por muito violentos que sejam seus contatos com os celtas, os germanos se familiarizam pouco a pouco com a civilização. Os celtas traficam com os mais evoluídos dentre eles, os cimbros e os teutônicos, mercadores de âmbar na costa oriental do Báltico. Os celtas é que lhes ensinaram o governo monárquico, o montar a cavalo e lhes enriqueceram o vocabulário. Em troca, os druidas adotaram o culto solar oriundo da Escandinávia: constroem templos redondos em homenagem ao Sol.

Reconstrução de uma carruagem celta. 
Museu Celta em Hallein. Foto Wolfgang Sauber

No Oriente e no Meio-Dia sobretudo, se produzem os mais largos impulsos. Continuamente os celtas fazem recuar os lígures e nas costas do Atlântico entram em relações com os marinheiros do Mediterrâneo que regressam à Grã-Bretanha. Em pouco se ligaram a essas costas do Oeste. Em seus percursos, cidades se levantaram. Depois distinguiram os Pirineus. Infiltrações de tribos inteiras fundiram-se na direção do Sul.

De século em século, os celtas se aproximavam do Mediterrâneo - progressão lenta como a de sua civilização: têm a Europa por descobrir e ocupar; somente um rude esforço a torna habitável; é necessário que aí tomem pé solidamente; mas essa terra não é ingrata e, após algumas gerações, seu povoamento fará da Europa um enorme reservatório.

Ao lado desses maciços coletivos, o esforço que entre os judeus continua o Rei Salomão está fora de proporção com os meios de que dispõe. Soube reforçar as posições de Israel, enriqueceu como intermediário entre a Índia e os fenícios, fornece a Tiro azeite e trigo e depois de constituir uma cavalaria, mediante a proibição, aos judeus, de cortar os jarrêtes dos cavalos de que se apossavam, organizou o comércio desses animais. Para aumentar seu crédito, procurou ofuscar pelo luxo.

Mas Israel não dispõe nem dos homens nem das possibilidades econômicas para participar verdadeiramente dos intercâmbios do Mediterrâneo.

O Rei Salomão é forçado a aumentar os encargos de seu jovem Estado: multiplica impostos e corvéias. Os ricos pressionam os camponeses, emprestam-lhes e os arruínam para lhes tomar as terras; a pequena propriedade diminui. Salomão, cujo amor às artes custa caro a seu povo, tem de debelar movimentos de revolta. Quando de sua morte, em -935, o antagonismo das tribos se assenhoreia das cóleras populares e o reino de Israel se dissolve: durou sessenta anos, único lampejo de uma unidade nacional em meio às borrascas da anarquia judaica.

Esgotadas, as tribos israelitas se mostram incapazes de fazer obra política e de recriar um Estado judeu. No tumulto de suas intrigas intestinas, veio assaltá-las o perigo assírio: era tarde demais para conjurá-lo.

RIBARD, André. A prodigiosa história da humanidade. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1964. V. 1.  p. 72-4.

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