A miséria, o desenraizamento de
jovens camponesas perdidas nas cidades, a rejeição das moças seduzidas e depois
abandonadas, todos esses motivos empurraram para a prostituição mulheres que não
escolheram vender o próprio corpo. Houve uma prostituição rural e uma
prostituição urbana.
No final da Idade Média, as
crises econômicas e as desordens trazidas pelas guerras aumentaram o número
dessas mulheres, prostitutas profissionais ou ocasionais. O primeiro aspecto,
mais particular e sem dúvida fundador de uma atitude assumida relativamente à
prostituição, pode ser encontrado na postura da Igreja. É verdade que as “mocinhas”
ditas “amorosas” ou “devassas” eram grandes pecadoras. Mas elas podiam ser
salvas caso se arrependessem e mudassem de vida. Uma hipótese era conseguirem
se casar; a partir do século XII, a Igreja decretou que desposar uma moça
pecadora fazia parte dos anais de obras meritórias. Essas “mocinhas” [ou
raparigas] também podiam passar o resto da vida sob a rude disciplina de uma
instituição religiosa, pois desde o século XII monastérios de todo tipo, com freqüência
ditos de ordem de Maria Madalena, acolhiam mulheres arrependidas.
Casa de banhos no período medieval
O segundo aspecto diz respeito às
formas de organização dessas atividades. Em certos lugares, as “casas de moças”,
“antros de devassidão” e outros “bordéis” mantidos e controlados pelas próprias
cidades, eram instituições que contribuíam para o bom funcionamento de toda a
sociedade. A prostituição oficial era vista como um dos meios de controlar os
excessos e transbordamentos dos celibatários: clérigos, rapazes para quem o
acesso ao casamento e às responsabilidades familiares e profissionais estava
por ora fechado. Essa clientela masculina considerava poder fazer essas exigências
e admitia satisfazê-las dessa forma.
Em outras cidades, a prostituição
era tolerada, as matronas proxenetas e suas meninas tinham o direito de viver
em algumas ruas a elas atribuídas, onde podiam exercer seu negócio, sob condição
de respeitarem os limites impostos pelas regras urbanas – em particular, o uso
de roupas que as distinguissem das demais mulheres e a proibição de usar o
mesmo tipo de cintos e joias que as burguesas ou as senhoras da nobreza. Isso
permite deduzir que uma parte dessas mulheres podia ter uma autêntica carreira,
passível de culminar em um casamento, integrando-as à normalidade social e em
uma forma de respeitabilidade e de honra. Também se depreende que os lucros
auferidos com essa atividade, em particular os aluguéis e rendas cobrados pelas
casas que as abrigavam, eram anotados nos registros censitários e livros contábeis
de um capítulo eclesiástico ou abadia. Aliás, os canonistas do século XIII
admitiam que os dividendos desse trabalho não eram imorais, sob certas condições
(dentre as quais, o fato de as mulheres exercerem essa atividade não por
prazer, mas por necessidade).
Muitas vezes, os documentos
judiciais associavam a prostituição ao roubo e à vigarice, com as mulheres
agindo com a ajuda de seus protetores para enganar os clientes. Constava ainda
que o estupro de uma prostituta era crime, que era possível o casamento de uma
mulher que já tinha se prostituído, que a justiça considerava a hipótese de um
marido vender a esposa quando esta, forçada ao pecado, podia obter a separação
legal. O desenvolvimento da prostituição nas cidades, no final da Idade Média,
produziu uma desvalorização do trabalho feminino: as vendedoras, as
trabalhadoras do setor têxtil, em especial, eram acusadas de maus costumes e
seus ofícios eram vistos como uma fachada, que escondia outra atividade –
desonesta. (Simone Roux, professora honorária da Universidade Paris VII
Vincennes-Saint-Denis)
In: BETING, Graziella. Coleção história de A a Z: [volume] 2: Idade
Média. Rio de Janeiro: Duetto, 2009. p. 15-16.
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