Aos trabalhadores
“Os infinitos heróis
desconhecidos valem tanto quanto os maiores heróis da História”.
(Walt Whitman)
Forças de conservação x forças de transformação: do medievo às terras tupiniquins
Na
História das sociedades vamos encontrar forças
de conservação e forças de
transformação. Por forças de conservação podemos entender todos os grupos
políticos e instituições que desejam manter o ‘status quo’ vigente. São,
portanto, os detentores dos poderes político-econômico-ideológico.
Já
as forças de transformação são todos os grupos político-sociais excluídos do
sistema vigente. São aqueles que trabalham, pagam pesados tributos e são
discriminados.
No
mundo do medievo europeu temos uma sociedade estamental. Os nobres – clero
(oração) e nobreza (guerra) detinham os poderes político-econômico e
ideológico, respectivamente. Na base da pirâmide encontramos os servos
(trabalho). Ora, eram os servos – trabalhadores rurais – que pagavam pesados tributos
e dízimos para as classes dirigentes. Portanto, temos uma sociedade tripartite.
O poder ideológico era justificado pelo predomínio da Igreja Católica. Segundo
os eclesiásticos do período medieval, Deus havia feito a sociedade assim.
Entretanto, não podemos deixar de registrar que durante o período final da
Idade Média, muitos camponeses se revoltaram diante das péssimas condições de
trabalho em que se encontravam. Essas revoltas camponesas foram duramente
sufocadas pelos cavaleiros. Um outro fato – não menos relevante – a ser
considerado, é que na sociedade estamental do medievo também havia outros
grupos que não se encaixavam na visão tripartite da Igreja. Estes eram todos os
habitantes dos burgos, os comerciantes, os banqueiros, os judeus, os ciganos, os
saltimbancos, os menestréis, os homossexuais, as prostitutas, os leprosos...
Eram discriminados tanto pela nobreza guerreira como pelo clero. Infelizmente
esses grupos não nos deixaram registros de sua trajetória histórica e o pouco
que sabemos é através das crônicas feitas pelos detentores do poder. Portanto,
a visão que temos deles é uma visão preconceituosa e estigmatizada. Alguns desses
grupos só se tornarão forças de transformação a partir da segunda metade do
século XVIII.
As
revoluções industrial e francesa moldaram um novo tipo de sociedade. A
industrialização na Europa estabelece duas classes sociais bem definidas. De um
lado, temos a burguesia dona dos meios de produção e do capital. Do outro, o
nascimento do proletariado, que vende sua força de trabalho. A sociedade do
Antigo Regime começa a sofrer seus primeiros abalos. A antiga nobreza – que
vivia em seus luxuosos castelos, em suntuosas festas regadas aos melhores
vinhos, com suas taças de cristal finíssimas, suas roupas extravagantemente
luxuosas e servidos por centenas de serviçais – perderá, paulatinamente, seus
privilégios. Essa sociedade excluía os ricos burgueses e todos os trabalhadores
do campo e das cidades. Essas novas forças – burguesia e trabalhadores -,
começaram a discutir as novas ideias apregoadas pelos filósofos iluministas nos
cafés e divulgados através de panfletos e livros. Esses grupos passam a questionar a sociedade
de privilégios, isto é, o Antigo Regime. Portanto, são forças de transformação.
Embalados
ideologicamente pelos ideais iluministas de liberdade, igualdade e
fraternidade, juntamente com a grave crise sócio-econômica em que se encontrava
a França em fins do século XVIII, sans-cullottes,
donas de casa, crianças e jovens, homens e mulheres do povo, burgueses tomam de
assalto a fortaleza-prisão conhecida como Bastilha, símbolo da opressão do
Antigo Regime. Era o início da Revolução Francesa, que durante uma década,
abalaria as antigas estruturas feudais da França. São estas forças de
transformação que mudarão os rumos da História não só da França, mas fazem
tremer também as casas reais Europa Ocidental e com repercussões do outro lado
do Atlântico. Este é um exemplo clássico de revolução burguesa.
No
decorrer do século XIX surgem novos contextos históricos que levarão burgueses
e proletários a se distanciarem e tornarem-se antagônicos. A burguesia
pós-1789, agora ocupando os antigos postos da nobreza e do clero, tornam-se tão
reacionários e conservadores quanto aos que eles combatiam. Aos camponeses e
operários sobram apenas migalhas. E a Europa se industrializava a passos
largos. Mais indústrias, mais operários. Crianças e mulheres trabalhavam e
ganhavam menos do que os homens. A situação de miséria era evidente. O clima de
insatisfação pairava no ar. Novas ideologias surgiram. Eram os anarquistas, os
socialistas utópicos e os socialistas científicos. Novas revoluções. Barricadas. Outras
repressões. Novas decepções.
E
entramos no século XX com velhos problemas. Na Rússia, país
recém-industrializado - mas com uma monarquia autocrática e uma nobreza
parasitária - não ocorreu a modernização da sociedade. Enquanto os nobres
viviam cercados de luxo e conforto, milhões de russos passavam fome, frio e
pagavam altíssimos tributos. Tudo isso veio abaixo com a revolução socialista
de 1917. Soldados, camponeses e operários, sob a liderança dos bolcheviques,
tomaram o poder e instalaram a primeira república socialista da História. Novas
esperanças. Vitória das forças de transformação.
Aqui, em terras tupiniquins, ainda não tivemos uma revolução de caráter burguês, quem dirá, socialista. As críticas aos governos do PT como sendo de governos socialistas não passa de mero palavrório. Uma sociedade socialista já teria eliminado mazelas seculares. Não só as de ordem sócio-econômico. Mas, também, as de ordem ética. Ainda estamos longe de sermos um país igualitário, onde haja a distribuição de renda para todos e iguais oportunidades de trabalho, saúde e educação de qualidade, transporte público eficiente, sustentabilidade... Nossa burguesia é pobre intelectualmente (e podre!). Como dizia Cazuza: “a burguesia fede”. Fede a dinheiro, a corrupção, a ódio, preconceitos... Pura estupidez. O Iluminismo dos revolucionários franceses de 1789 ainda não aportou por aqui. E o sonho de uma sociedade justa, humana, fraterna e solidária é uma utopia a ser trilhada por todos aqueles que desejam um país para todos.
Orides Maurer Jr. é historiador e autor do blog ϟ●• História
e Sociedade •●ϟ
Aqui, em terras tupiniquins, ainda não tivemos uma revolução de caráter burguês, quem dirá, socialista. As críticas aos governos do PT como sendo de governos socialistas não passa de mero palavrório. Uma sociedade socialista já teria eliminado mazelas seculares. Não só as de ordem sócio-econômico. Mas, também, as de ordem ética. Ainda estamos longe de sermos um país igualitário, onde haja a distribuição de renda para todos e iguais oportunidades de trabalho, saúde e educação de qualidade, transporte público eficiente, sustentabilidade... Nossa burguesia é pobre intelectualmente (e podre!). Como dizia Cazuza: “a burguesia fede”. Fede a dinheiro, a corrupção, a ódio, preconceitos... Pura estupidez. O Iluminismo dos revolucionários franceses de 1789 ainda não aportou por aqui. E o sonho de uma sociedade justa, humana, fraterna e solidária é uma utopia a ser trilhada por todos aqueles que desejam um país para todos.
MAURER JUNIOR, Orides. Ecos do
tempo: uma viagem pela história. Joinville: Letradágua, 2015. p. 49-51.
© 2015 by Orides Maurer Jr.
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