"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

Fogo, a ferramenta libertadora

“Ao controlar o fogo, o Homem estava controlando uma poderosa força física [...] e se fez Homem.” 
Gordon Childe


Na aurora dos tempos, os homens mantinham aceso o fogo que era provocado, ocasionalmente, pelas forças da natureza (atividade vulcânica, floresta em chamas, erupção de gás natural). Com o passar do tempo, os homens aprenderam a produzi-lo pelo atrito de lascas de sílex ou pedaços de madeira. O domínio do fogo libertou o homem da dependência da natureza. Ao produzir fogo, o homem tornava-se um criador.

Fonte de luz e calor, o fogo iluminou e aqueceu as cavernas e abrigos - foi a conquista da escuridão e do frio. O fogo possibilitou o cozimento dos alimentos - novos sabores, ajudou a moldar o rosto e a forma dos dentes. Permitiu a moldagem de lanças de madeira, o cozimento de argila e a fundição de metais. Afastou os animais selvagens. 

Ao redor das fogueiras desenvolveu-se a linguagem. Todos partilhavam dos benefícios dessa tecnologia revolucionária. Surgiram portadores de fogo – especialistas na arte de produzir o fogo, a ferramenta libertadora.

Nas diversas culturas ao redor do mundo há mitos relatando a descoberta e o domínio do fogo, como esse relato maia recontado por Eduardo Galeano:


“As noites eram de gelo e os deuses tinham levado o fogo embora. O frio cortava a carne e as palavras dos homens. Eles suplicavam, tiritando, com a voz quebrada; e os deuses se faziam de surdos.

Uma vez lhes devolveram o fogo. Os homens dançaram de alegria e alçaram cânticos de gratidão. Mas de repente os deuses enviaram chuva e granizo e apagaram as fogueiras.

Os deuses falaram e exigiram: para merecer o fogo, os homens deveriam abrir peitos com um punhal de pedra e entregar corações.

Os índios quichés ofereceram o sangue de seus prisioneiros e se salvaram do frio.

Os cakchiqueles não aceitaram o preço. Os cakchiqueles, primos dos quichés e também dos maias, deslizaram com pés de pluma através da fumaça e roubaram o fogo e o esconderam nas covas de suas montanhas.” GALEANO, Eduardo. Memória do fogo: Os nascimentos. Porto Alegre: L&PM, 2013. p. 21-2;


MAURER JUNIOR, Orides. Ecos do tempo: uma viagem pela história. Joinville: Letradágua, 2015. p. 21-22.

Orides Maurer Jr. é historiador e autor do blog ϟ●• História e Sociedade •●ϟ

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