Pernas de pau, Francisco de Goya,
Na primeira metade do século XVIII, apesar de a sociedade do Antigo Regime permanecer organizada em estamentos, não havia no plano cultural uma uniformidade que correspondesse àquela estratificação aparentemente rígida. O ponto central da questão estava na difícil definição do que deveria mudar e do que deveria ser mantido. O grande conflito cultural dentro de todos os grupos sociais, e entre estes, era portanto entre tradição e transformação.
A tempestade de neve, Francisco de Goya
A cultura clerical sentia o problema nos desacordos entre o clero que frequentava os seminários (criados pela Reforma Católica do século XVI) e o clero que não recebera aquela formação. Teoricamente constituindo um só estamento, com uma mesma cultura, o clero na prática apresentava realidades bem distintas. E isso se refletia nas outras camadas sociais através da educação transmitida pelo clero. Uma escola mantida pela Igreja em uma grande cidade era bastante diferente daquela dirigida pelos párocos rurais.
O médico, Francisco de Goya
Entre os nobres, a situação era semelhante. A alta nobreza, apesar de favorecida pelo Estado, permanecia arraigada culturalmente a seu passado de poder, não vendo com bons olhos as mudanças culturais que acompanhavam a centralização política. Os nobres das províncias, menos favorecidos em todos os aspectos, oscilavam entre seus velhos ideais (e nisso se identificavam com os nobres ligados à corte) e as propostas inovadoras vindas da burguesia urbana.
Merenda campestre, Francisco de Goya
No Terceiro Estado, as populações rurais, sempre mais conservadoras, viviam basicamente como nos séculos feudais. As populações urbanas apresentavam grande diversidade, mas de forma geral maior dinamismo. Os pequenos artesãos e comerciantes, recém-vindos do campo, mantinham ainda muito do folclore e dos hábitos de suas regiões de origem. Aqueles que habitavam há mais tempo as cidades já haviam absorvido dados culturais de diferentes procedências.
O portão de Calais, William Hogarth
As propostas de transformações partiam, pois, das cidades. Em meio às suas diversas atividades, ganhava destaque uma certa parcela da burguesia. Cheia de combatividade intelectual, ela tinha os olhos fixos mais no futuro do que no passado. Ela expressava artística e literariamente as reivindicações de um segmento social que cobrava maior participação nas decisões da sociedade. Ela valorizava os instrumentos racionais como meio de atuação social do homem. Assim, o desenvolvimento intelectual laico, citadino, burguês e racional, que despontara com o Renascimento, ganhava mais consistência e criava condições para que o século XVIII fosse o Século das Luzes.
FRANCO JR., Hilário; FILHO, Ruy de Oliveira Andrade. Atlas História Geral. São Paulo: Scipione, 1994. p. 48.
Nenhum comentário:
Postar um comentário