Escribas utilizando a escrita cuneiforme
* Introdução. Aproximadamente na mesma época em que se iniciava a civilização egípcia, outras civilizações começaram a desenvolver-se em uma vasta área chamada Crescente Fértil. Estende-se em arco desde o sudeste do Mediterrâneo até o Golfo Pérsico incluindo, em parte ou totalmente, os atuais Líbano, Israel, Jordânia, Síria, Turquia e Iraque. As terras em que surgiram essas civilizações eram cercadas pelas montanhas da Armênia e do Irã e pelos desertos da Síria e da Arábia. Os gregos chamaram a essa região Mesopotâmia, isto é, terra "entre rios", pois aí correm, em um amplo vale e em percurso paralelo, o Tigre e o Eufrates.
* A importância do Tigre e do Eufrates. Como o Nilo, o Tigre e o Eufrates atravessam regiões áridas, ressequidas pelo sol abrasador do verão, onde a chuva raramente cai. No decorrer dos séculos o limo depositado pelos rios transformou essa região em uma rica planície.
O vale do Tigre e do Eufrates, ao contrário do vale do Nilo, não apresenta as mesmas condições ideais para a agricultura. As inundações dos rios não têm a regularidade das do Nilo: acontecem na primavera, com volume imprevisível de água, devidas ao degelo das neves nas montanhas da Armênia. E no inverno os ventos do sul trazem aguaceiros torrenciais que transformam a planície em imenso lodaçal. Apesar disso, no sul da região, os rios formaram com o passar do tempo diques naturais cobertos de sedimentos e de limo férteis, excelentes para a agricultura.
* As diversas civilizações da Mesopotâmia. A Mesopotâmia não era protegida e isolada pelo deserto como o Egito, mas uma passagem natural entre a Ásia e o Mediterrâneo, constantemente percorrida por caravanas de mercadores. Se no Egito as invasões foram raras e de curta duração, na Mesopotâmia foram frequentes e duradouras. Sua história é uma sucessão de guerras, invasões e dominações de povos nômades, semibárbaros; povos que, atraídos pela rica planície do Tigre e do Eufrates, aí se encontraram e se misturaram, formando um complexo cultural que denominamos civilização mesopotâmica.
Cerca de 3500 a .C. desenvolveu-se na Mesopotâmia, próximo ao Golfo Pérsico, uma brilhante civilização, a dos sumérios, povo provavelmente originário da Ásia central. Foram os sumérios que criaram as primeiras cidades-estado - como Uruk e Lagash - e transmitiram aos outros povos mesopotâmicos processos aperfeiçoados de irrigação, a arquitetura construída com tijolos, as bases da religião, da língua, da escrita, das leis, das artes e do comércio.
No decorrer do III milênio a.C., os acadianos, vindos do deserto da Síria, instalaram-se um pouco ao norte dos sumérios, na região de Acad, e fundaram Babilônia. A supremacia entre as cidades-estado pertenceu inicialmente aos sumérios, passou aos acadianos (segunda metade do III milênio a.C.) e voltou aos sumérios (fim do III milênio a.C.). No começo do II milênio a.C. os sumérios foram definitivamente conquistados pelos acadianos, também chamados babilônios.
Depois de séculos de lutas a Mesopotâmia foi unificada pelo rei da Babilônia, Hamurábi. Suas conquistas estenderam-se até a Assíria e atual Turquia, fundando um vasto império ao qual impôs a mesma administração e as mesmas leis. Para isso redigiu um Código de Leis, o primeiro da História. Babilônia, a capital do império, tornou-se a cidade mais próspera, mais rica da época. Terminou o Primeiro Império Babilônico com a morte de Hamurábi e com invasões sucessivas de povos vindos do norte e do leste.
No decorrer do II milênio a.C. esses invasores foram vencidos pelos assírios, que aos poucos foram conquistando as regiões vizinhas da Babilônia (729 a .C.). O império assírio atingiu sua maior extensão nos séculos VIII e VII a.C., quando grandes reis como Senaquerib e Assurbanípal conquistaram a Assíria, a Fenícia, a Palestina e o Egito.
Sala de um palácio assírio na corte de Nínive, Austen Henry Layard
Povo guerreiro e violento, os assírios eram detestados pela maneira cruel com que governavam. Pouco depois da morte de Assurbanípal, os caldeus e os medos lideraram a revolta dos babilônios contra os assírios. Conquistaram, saquearam e destruíram Nínive, capital do império assírio (612 a .C.).
Seguiu-se o Segundo Império Babilônico, e o seu rei, Nabucodonosor, restabeleceu Babilônia como capital. Mas também o segundo império babilônico foi destruído, alguns anos mais tarde, conquistado por Ciro, rei dos persas (539 a .C.).
Nabucodonosor e Sémiramis, René-Antoine Houasse
[Nabucodonosor
ordenando a construção dos jardins suspensos da Babilônia para agradar sua
consorte Amyitis]
* Organização política, econômica e social dos mesopotâmios
Organização política. As cidades-estado pertenciam a um deus, representado pelo rei. Os reis mesopotâmicos não eram considerados seres divinos como os faraós, mas apenas os intermediários entre os súditos e os deuses. A autoridade do rei estendia-se a todas as cidades-estado; assistido por sacerdotes, funcionários, ministros, legislava em nome das divindades, assegurava as práticas religiosas, zelava pela defesa de seus domínios, protegia e regulamentava a economia.
Economia. As principais atividades econômicas dos mesopotâmios foram a agricultura e o comércio. Desenvolveram também a tecelagem e fabricavam maravilhosas armas, jóias, objetos artísticos em metal. Nos campos cultivavam cereais, algodão e árvores frutíferas. Instituíram leis de estímulo à agricultura, obrigando os proprietários a cultivarem suas terras e a cuidarem dos diques e canais. Para as transações comerciais, usavam como dinheiro barras de ouro e de prata com valor fixo; criaram certas técnicas como faturas, recibos, cartas de crédito, contratos escritos, empréstimos com juros e associações de comerciantes.
Agrupados em caravanas, os comerciantes levavam seus produtos e sua manufatura a todos os países vizinhos e às regiões mais distantes, como a Índia e o Egito. Dessas terras traziam as matérias-primas escassas na Mesopotâmia, como o marfim da Índia, o cobre de Chipre e a madeira do Líbano.
Sociedade. A sociedade na Mesopotâmia era de estrutura menos rígida do que no Egito. Excetuando os sacerdotes e os altos funcionários que cercavam o rei, a população repartia-se entre homens livres e escravos, aos quais se possibilitava o resgate da liberdade. À classe de homens livres pertenciam os artesãos, os guerreiros, os agricultores e os comerciantes, com amplas possibilidades de melhorarem na vida e mesmo enriquecerem pelo empenho e pelo esforço próprios.
* Religião e cultura na Mesopotâmia
Religião. Como no Egito, também na Mesopotâmia a religião desempenhou um papel muito importante. Politeísta e inicialmente antropomórfica, era uma religião triste e pessimista, que não oferecia compensações após a morte, acreditando-se que os deuses eram capazes de promover tanto o bem quanto o mal.
Os mesopotâmios adoravam divindades que - segundo sua crença - comandavam as forças da natureza (sol, lua, chuva, vento, raio), os elementos (água, ar, terra, fogo), os astros. Emprestavam a esses deuses aparência e sentimentos humanos, só se diferenciando dos homens por serem mais fortes, todo-poderosos e imortais. Cada deus era senhor de uma cidade e, como no Egito, quando a cidade alcançava predomínio político sobre as outras, seu deus também se tornava mais influente. No tempo de Hamurábi, o deus Marduc de Babilônia foi adorado por todo o império.
A divindade feminina mais importante foi Ishtar, deusa da natureza e da fecundidade; Shamash era o deus do sol e da justiça; Enlil, do ar, da chuva e do vento; Sin, o deus da lua; Enki, da terra.
Na época em que dominaram os babilônios, ao lado dos deuses havia também demônios temidos por todos, porque torturavam continuamente os homens. Isso originou a crença na feitiçaria: para fugir à intervenção dos demônios os babilônios recorriam ao uso de amuletos, isto é, de objetos com poderes mágicos que os salvassem das influências desses seres.
Com os caldeus a religião assumiu uma forma astral, isto é, os deuses fora identificados com certos planetas; assim, Marduc com Júpiter e Ishtar com Vênus.
Ao contrário da religião egípcia, a religião mesopotâmica não oferecia nenhuma promessa de sobrevivência da alma depois da morte. Por isso não havia grande preocupação com os mortos, geralmente enterrados no chão de suas casas.
Os templos eram algo parecido com torres, quase sempre de sete andares ou plataformas, cada andar menor do que o precedente; dava-se a essa construção o nome de zigurat.
Ciência. Com a constante observação do céu, na esperança de aí descobrir a vontade dos deuses, ou poder prever o destino dos homens segundo a posição dos astros, desenvolvendo assim a astrologia, adquiriram bons conhecimentos de astronomia. Aprenderam a distinguir os planetas das estrelas e a prever eclipses.
Aprenderam também, baseados nesses estudos, a plantar de acordo com as fases da lua. Dividiram o ano em doze meses lunares, os meses em semanas, a semana em sete dias (cada um consagrado a um astro), o dia em vinte e quatro horas, a hora em sessenta minutos e o minuto em sessenta segundos.
Os complicados cálculos de astronomia só foram possíveis graças aos conhecimentos avançados de matemática. Os mesopotâmios haviam descoberto os processos da multiplicação e da divisão, a extração das raízes quadrada e cúbica, tendo sido também os inventores da álgebra. Sua numeração e o sistema de pesos e medidas baseava-se no número 60, e não no 10 por nós usado. A divisão do tempo (minutos e segundos) e a do círculo (em 360 graus) é uma herança da Mesopotâmia.
Em medicina acreditou-se inicialmente que a doença era provocada pela entrada de um demônio no corpo humano. Para expulsá-lo davam-se ao doente bebidas feitas de certas ervas. Pouco a pouco perceberam que algumas bebidas eram mais eficazes do que outras. Diferenciando, selecionando, estudando as ervas, os mesopotâmios chegaram também a distinguir as diversas doenças e a aprender a tratá-las com plantas medicinais adequadas.
Leis. Os sumérios foram os primeiros a criar um sistema de leis (por volta do III milênio a.C.), que serviu de base ao Código de Hamurábi e aos sistemas de leis dos assírios, caldeus e hebreus. Tudo que dissesse respeito às relações dos homens entre si estava nas leis mesopotâmicas, como o trabalho nos campos, o comércio, a organização da família.
Escrita, literatura e arte. Na Mesopotâmia desenvolveu-se um tipo de escrita, a cuneiforme, com sinais em forma de cunha gravados em tabuletas de argila.
Na literatura, a criação mais notável foi a Epopéia de Gilgamesh, herói lendário à procura da planta da imortalidade. Outra obra importante foi o poema Jó Babilônico, que conta os sofrimentos de um homem justo perseguido pelos deuses.
Da arquitetura mesopotâmica quase nada nos restou. A maioria das cidades agrupava-se ao sul da Mesopotâmia, região em que era rara a pedra de construção. Por isso, os monumentos eram geralmente construídos com tijolos secados ao sol, por falta de madeira para cozê-los nos fornos. A ação do tempo encarregou-se de transformar e reduzir essas construções de argila em montes de terra, chamados tells. Foi só com os assírios que se começou a usar a pedra.
Os templos e os palácios eram decorados, às vezes, com afrescos, outras com esculturas em baixo-relevo, representando cenas do cotidiano ou cenas de caça e guerra; com estátuas ornamentais que retratavam reis e altos personagens. Os extensos muros dos palácios e templos eram decorados exteriormente com tijolos esmaltados em cores vivas, representando em geral uma sucessão de animais.
A arte mesopotâmica foi muito importante, sobretudo por certas criações que nos transmitiu: a cúpula, a abóboda, o arco, os trabalhos em cerâmica, marfim e metais preciosos. E, num sentido mais amplo, a civilização mesopotâmica exerceu influência marcante sobre outros povos posteriores, legando-lhes rudimentos de astronomia, um calendário e uma já bem avançada matemática. HOLLANDA, Sérgio Buarque de (org.) História da Civilização. São Paulo: Nacional, 1980. p. 21-27.
Músico tocando lira. Estandarte de Ur
* A vida cotidiana na Mesopotâmia. Escravos e pessoas de condições mais humildes levavam o mesmo tipo de vida. A alimentação era muito simples: pão de cevada, um punhado de tâmaras e um pouco de cerveja leve. Isso era a base do cardápio diário. Às vezes comiam legumes, lentilha, feijão e pepino ou, ainda, algum peixe pescado nos rios ou nos canais. A carne era um alimento raro.
Na habitação, a mesma simplicidade. Às vezes a casa era um simples cubo de tijolos crus, revestidos de barro. O telhado era plano e feito de troncos de palmeiras e argila comprimida. Esse tipo de telhado tinha a desvantagem de deixar passar a água nas chuvas mais torrenciais, mas em tempos normais era usado como terraço.
As casas não tinham janelas e à noite eram iluminadas por lampiões de óleo de gergelim. Os insetos eram abundantes nas moradias.
Os ricos se alimentavam melhor e moravam em casas mais confortáveis que os pobres. Mesmo assim, quando as epidemias se abatiam sobre as cidades, a mortalidade era a mesma em todos os grupos sociais. PILETTI, Nelson e PILETTI, Claudino. História e vida integrada. São Paulo: Ática, 2007. p.57.
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