"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

A vida em Roma na República e no Império

Pintura romana em Pompeia mostrando cena de banquete em família. Artistas desconhecidos. Ca. 79 a.C.


Texto 1 - Os escritores romanos deixaram para as futuras gerações uma visão detalhada da vida cotidiana e de sua diversão, de suas angústias, de seus prazeres e de suas dores. Podemos praticamente sentir o gosto das refeições das pessoas comuns: o pão integral, o queijo fresco prensado a mão, os figos verdes de segunda safra e, é claro, o pequeno peixe de grande popularidade, o arenque. [...]

Natureza-morta: peixes, aves e legumes. Mosaico romano, século II. Villa em Tor Marancia, perto das catacumbas de Domitila. Artista desconhecido. 
Foto: Jastrow

 [...]

Períodos civilizados se entrelaçavam com períodos de violência. Até com escravos, podia haver civilidade e compaixão. No início do segundo século d.C., o filho de um escravo morreu e os donos de escravos encomendaram a escultura da cabeça do menino morto em bloco de mármore, acrescentando a simples mensagem em latim:

Ao mais querido dos guerreiros,
Um menino escravo,
Que viveu dois anos, dez meses e oito dias.

A criança tem um olhar inocente, orelhas longas e elegantes, boca pequena, cabelo aparado penteado até a metade da testa e - logo acima da orelha direita - um amuleto da sorte egípcio. A insígnia não denotava que a criança vivesse no Egito, que na época era uma colônia romana. O império de Roma era cosmopolita e as ideias, religiões e modas fluíam com facilidade: a cabeça dessa criança pode ser vista ainda hoje num museu de Los Angeles. (BLAINEY, Geoffrey. Uma breve história do mundo. São Paulo: Fundamento Educacional, 2004. p. 69-70)

Um escravo traz ao seu mestre os tabletes para escrever. Detalhe do sarcófago do advogado Romano "Valério Petronianus" (313-320 d.C.). Artista desconhecido. 
Foto: Giovanni Dall'Orto.

Texto 2 - A casa antiga era simples, muitas delas de uma só peça; as roupas, modestas e funcionais; a alimentação, sóbria; os pais e parentes educavam os filhos sempre subordinando todas as ações aos apelos de proteção aos diferentes deuses.

A conquista de terras distantes trouxe riquezas e costumes novos. As legiões impunham pelas armas costumes romanos pelo mundo mediterrâneo e nem sempre percebiam o quanto de influências estranhas levavam ao voltar para casa.

"Adotam-se com gosto os vários tipos de sandálias e botas originárias de lugares distantes, e o couro de qualidade marroquina, da Fenícia, é o mais cotado. Bem calçada, a bela quer estar bem penteada. Como o loiro natural é raro em Roma, as damas importam a grande custo os sabonetes celtas ou germânicos que serve às gaulesas, e aos gauleses, para dar a seus cabelos essas tonalidades loiras ou ruivas que tanto surpreenderam os conquistadores. Se a tintura, à base de sebo de carneiro e de cinzas, porventura não funcionar em cabelos escuros demais, resta usar a peruca. Germanas e gaulesas fornecerão a matéria-prima. Uma falsa loira de tez escura não inspira confiança. Então, ela besunta o rosto com uma máscara, fabricada em Rodes, à base de alvaiade, um subproduto do chumbo utilizado até a época moderna. E os perfumes? As romanas são loucas por eles, embora Cícero gostasse de dizer que uma mulher cheira bem quando não cheira a nada. Preferem as essências de rosas, flores cultivadas na região de Nápoles, mas há também essência de íris, produzida na Grécia, de açafrão, da Cilícia ou de Rodes, flores da vinha cipriota, da manjerona grega". (BERNET, Anne. Uma superpotência em ação. In: Revista História Viva. São Paulo: Duetto, ano 1, n. 2, dez. 2003. p. 66-67)

Afresco romano em Pompeia. O afresco retrata o padeiro Terêncio Neo com sua esposa. Os dois personagens, de origem humilde, subiram na escada social: mostra Terêncio Neo com um rolo de papiro na mão, enquanto sua esposa segura uma tabuleta encerada. Artista desconhecido.

A Roma que sucedeu à destruição de Cartago, que submeteu a Espanha, a Macedônia, a Grécia e outras terras, é outra completamente.

Arrogância, prepotência, luxo, corrupção e exploração de escravos caracterizam a vida romana. [...] nos impressionamos com a grandiosidade das construções e a pompa dos chefes vitoriosos. [...]

"Depois das guerras de conquista, a sociedade romana passou a ter verdadeiros fascínio pela cultura grega. Foram feitas traduções de obras de Homero para o latim, e o teatro tornou-se um dos maiores divertimentos dos romanos, sendo muito apreciadas as obras de Plauto. A história romana recebeu um tratamento mais sistemático com o grego Políbio. Na pintura, os murais receberam forte influência grega.

A partir da instauração do império de Otávio Augusto, a cultura foi abandonando suas características helenísticas e adquirindo um caráter mais romanizado. Nesse período, houve um verdadeiro surto de construções arquitetônicas e de embelezamento urbano, que tomou conta de quase todas as províncias. [...]


Os romanos apreciavam as lutas entre gladiadores e também as corridas de bigas (carros de guerra puxados por dois cavalos) e os combates com feras [...].


Os banhos públicos romanos eram ponto de encontro onde se tratava de tudo: política, negócios e amor". (PEDRO, Antonio et alli. História da civilização ocidental. São Paulo: FTD, 2005. p. 81.)



Batalha entre habitantes de Pompeia e Nucéria no anfiteatro de Pompeia. Afresco romano de Pompeia.. Artista desconhecido. Foto: WolfgangRieger

A expansão no Mediterrâneo cobriu Roma de glórias e riquezas, mas foi feita com a devastação da classe média. Afastando os mais ricos dos mais pobres, e com a ampliação do número de escravos trazidos das guerras, é fácil imaginar a vida do povo. Isso explica em parte a corrupção, as guerras civis por ambições, a indisciplina pela compra de favores, as violências. Era o ambiente para a implantação de governos autoritários, fossem para proteger seus interesses e dos grupos de apoio, fossem para tirar o povo do caos de que se aproximava.

O Império, mesmo sob uma tentativa de preservação da República, ampliou o poder central a ponto de invadir até o campo religioso. Da apoteose foi fácil chegar à divindade.

Em suma, Roma, na sua história antiga, parece muito com pessoas que vemos em todas as épocas – durante o período de formação, a simplicidade da vida e a pureza dos ideais fazem delas grandes esperanças de seu grupo. Na proporção em que se desenvolvem, contudo, os ideais vão sendo soterrados pelos prazeres fáceis de alcançar com a riqueza acumulada, até que nada mais resta daquela pessoa jovem...

[...]


Crianças brincando. Mármore, século II d.C. Artista desconhecido. Foto: Marie-Lan Nguyen

"[...] A grande maioria da população casava-se de maneira mais simples e informal: decidiam viver juntos e, após um ano, eram considerados casados. [...] A sociedade romana era patriarcal: todo o poder estava com o pai de família, e a esposa era considerada formalmente como sua propriedade. Na prática, a mulher romana tinha diversas prerrogativas, algumas citadas por Caio: podia viver com um homem, constituir família e não passar à família do homem, não se casando oficialmente.


O casamento “pela farinha”, de caráter religioso e político, era o matrimônio da reduzida aristocracia romana: apenas esse tipo de união garantia a nobreza da linhagem de sangue. A cerimônia de compra simbólica representa um terceiro tipo de casamento. Menos informal e menos popular do que o reconhecimento do vínculo conjugal por uso ou posse, não possuía a complexidade da união “pela farinha”, sendo o casamento próprio dos plebeus enriquecidos. Dessa forma, podemos encarar os três tipos de casamento como representativos de três grandes grupos sociais: pobres, ricos e nobres. [...] (FUNARI, Pedro Paulo Abreu. Roma: vida pública e vida privada. São Paulo: Atual, 1994)


Trabalhadores colocando as roupas para secar. Afresco romano na loja do tintureiro Veranius Hypsaeus,  Pompeia. Artista desconhecido


BERNET, Anne. Uma superpotência em ação. In: Revista História Viva. São Paulo: Duetto, ano 1, n. 2, dez. 2003. p. 66-67.
BLAINEY, Geoffrey. Uma breve história do mundo. São Paulo: Fundamento Educacional, 2004.
FUNARI, Pedro Paulo Abreu. Roma: vida pública e vida privada. São Paulo: Atual, 1994.
GASMAN, Lydinéa e FONSECA, James Braga Vieira da. História Geral 1 – Antiga e Medieval. Rio de Janeiro: MEC/FENAME, 1971. p. 101-103.
PEDRO, Antonio et all. História da civilização ocidental. São Paulo: FTD, 2005.

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