"Clio, musa da História", Pierre Mignard
A função da história, desde seu início, foi a de fornecer à sociedade uma explicação sobre ela mesma. A história se coloca hoje em dia cada vez mais próxima às outras áreas do conhecimento que estudam o homem (a sociologia, a antropologia, a economia, a geografia, a psicologia, a demografia, etc.), procurando explicar a dimensão que o homem teve e tem em sociedade. [...]
A história procura especificamente ver as transformações pelas quais passaram as sociedades humanas. A transformação é a essência da história [...]. Nada permanece igual, e é através do tempo que se percebem as mudanças.
Estudar as mudanças significou durante muito tempo uma preocupação com momentos que são vistos como de crise e de ruptura... Hoje se sabe que mesmo mudanças que parecem súbitas, como os movimentos revolucionários, não somente foram lentamente preparados - de forma voluntária e involuntária, por diferentes circunstâncias - mas não conseguiram mudar totalmente as estruturas das sociedades onde se realizaram; são exemplos significativos tanto a Revolução Francesa como a Revolução Russa de 1917. Percebe-se, ligado a isso, uma preocupação cada vez maior dos historiadores não só com mudanças mas também com as permanências.
O tempo é a dimensão de análise da história. O tempo histórico através do qual se analisam os acontecimentos não corresponde ao tempo cronológico que vivemos e que é definido pelos relógios e calendários. No tempo histórico podemos perceber mudanças que parecem rápidas, como os acontecimentos cotidianos: por exemplo num golpe de Estado, cujo desenrolar acompanhamos pelos jornais. Vemos também transformações lentas, como no campo dos valores morais: o machismo, por exemplo, é um valor que impera na maior parte das sociedades que a história estuda, a ponto de se poder dizer que a história que está escrita mostra um processo praticamente só conduzido pelos homens. [...]
Quase sempre que a história da humanidade nos é apresentada, é a evolução da sociedade europeia ocidental que é tomada como modelo de desenvolvimento. Essa posição eurocêntrica é errada: do ponto de vista da história, a evolução da sociedade europeia ocidental, com seu alto grau atual de desenvolvimento tecnológico, não deve ser um padrão de comparação para se estudar a história de qualquer outra parte do sistema capitalista, como, por exemplo, a América Latina. Não se deve, por meio desse tipo de comparação, julgar se uma sociedade está "atrasada" ou "adiantada" em seu desenvolvimento histórico.
[...] Temos, ao mesmo tempo, hoje em dia, sociedades com formas de vida primitivas, consideradas ainda no chamado período pré-histórico (por exemplo, como certas tribos na Nova Zelândia), e sociedades com um grau de desenvolvimento que permite explorações interplanetárias (como fazem os americanos e os russos). Não se percebe, ainda como exemplo, uma linha constante e progressiva da passagem, a partir da Antiguidade, do trabalho escravo ao trabalho assalariado: a escravidão quase que desaparece na Europa Ocidental, durante a Idade Média, para reaparecer na Idade Moderna, imposta pelos europeus nas Américas, como forma de relação de trabalho dominante. [...]
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As alterações são decorrentes da ação dos próprios homens, sujeitos e agentes da história. [...] São os homens constituídos em sociedade que, embora nem sempre deliberada e conscientemente, atuaram e atuam para que as coisas se passem de uma ou de outra maneira, para que tomem um rumo ou outro.
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Não se deve buscar uma razão para um desenrolar da história da humanidade. O sentido dos diferentes acontecimentos históricos e dos processos específicos de transformações sociais devem ser procurados nos próprios acontecimentos [...].
Saber o que o homem fez em sociedade desde que está na Terra mostra muito sobre o próprio homem, ajuda a entendê-lo e a entender as sociedades [...]. Explicar as transformações sociais esclarecendo seus comos e porquês leva a perceber que a situação de hoje é diferente da de ontem. [...]
[...] A humanidade não é um todo homogêneo, e a história não a analisa assim. Na realidade, dificilmente o historiador pode tratar, ao mesmo tempo, de toda a humanidade. Ao escrever a história, em geral ele se ocupa especificamente de uma determinada realidade concreta, situada no tempo e no espaço. Estudam-se uma tribo, um povo, um império, uma nação, uma civilização, como, por exemplo, o povo judeu, antes do nascimento de Cristo, a formação do Império Macedônico, a civilização greco-romana, o surgimento da França, etc.
O homem é um ser finito, temporal e histórico. Ele tem consciência de sua historicidade, isto é, de seu caráter eminentemente histórico. O homem vive em um determinado período de tempo, em um espaço físico concreto; nesse tempo e nesse lugar ele age sempre, em relação à natureza, aos outros homens, etc. É esse o seu caráter histórico. Tudo o que se relaciona com o homem tem sua história; para descobri-la, o historiador vai perguntando: o quê? quando? onde? como? por quê? para quê?...
[...] Fazer uma história do presente não é, escrever sobre ele, mas sobre indagações e problemas contemporâneos ao historiador. É preciso conhecer o presente e, em história, nós o fazemos sobretudo através do passado, remoto ou bem próximo.
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Para muitos, o conhecimento do passado serve para manter as tradições, por vezes no sentido de tentar impedir as permanentes mudanças; para outros, o sentido da história é propiciar o desenvolvimento de forças transformadoras das sociedades. [...]
BORGES, Vavy Pacheco. O que é história. São Paulo: Brasiliense, 1998. p. 49-58.
Muito bom o texto, me ajudou bastante a entender um pouco mais sobre a história.
ResponderExcluirMuito obrigado.
ExcluirBom, uma leitura atualizada.
ResponderExcluirObrigado.
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