"Em maio de 68, éramos um pouco o motor da história e, em vez de sofrermos sua ação, nós a fazíamos. Isto não é tão comum assim."
Jean Pierre Dut'euil, militante francês
Flagrante do Festival de Woodstock, Nova York, agosto de 1969 - Consagração do rock como música-símbolo de um novo tempo.
Os anos 60 colocariam o mundo 'de pernas para o ar'. Sobretudo nos EUA e Europa a juventude reinterpretaria a história e viveria a utopia de transformar o mundo e tomar o poder em suas próprias mãos. Os meios de comunicação fariam emergir o homem planetário e transformariam a Terra em uma enorme 'aldeia global' preparada para o grande 'rito do consumo universal'.
No contexto das grandes mudanças da década a arte irá se libertar de antigos tabus. Violando-a, misturando gêneros e matérias, quebrando a harmonia e a sequência temporal, eliminando a distância entre a obra e o espectador e incorporando os subprodutos da civilização tecnológica às suas formas, a arte representará um dos campos mais significativos da contracultura dos anos 60, palavra inventada pela imprensa norte-americana para denominar o conjunto de manifestações culturais novas que se opunham à cultura vigente, oficializada, das sociedades ocidentais.
Caracterizada pela postura crítica radical a todo convencionalismo e de questionamento aos valores da sociedade de consumo, a contracultura se manifestará como 'anticultura' ou 'cultural marginal', produzindo estilos de vida alternativos.
Ridicularizando a sociedade de consumo e repudiando o mundo da violência, os artistas de vanguarda usarão cores, ruídos, formas, gestos e ritmos para agredir e escandalizar as gerações acomodadas, à medida que também vão contestando e destruindo padrões e valores burgueses.
Essa antiarte, porém, não tardaria a ser absorvida pelo próprio sistema que ela agredia. Devidamente 'domesticada' por ele, era colocada sob a forma de discos, pôsteres, roupas, espetáculos etc., à disposição dos 519 milhões de jovens entre 15 e 24 anos, dos quais uma boa parcela se mostrava suficientemente rebelde para desejar consumi-los.
[...] Herdeiros da guerra fria, de Berlim dividida, da guerra do Vietnã, corrida armamentista e espacial, os 'jovens rebeldes', chamados de hippies, repudiaram os ideais burgueses e toda forma de violência, discriminação, repressão, intelectualismo exagerado, consumismo e massificação.
Woodstock foi também um momento importante na luta dos jovens contra a Guerra do Vietnã e pela paz mundial.
Decepcionados com o presente e descrentes do futuro, negavam o sistema através da música, da droga, como LSD, e da reclusão em comunidades afastadas, onde o amor, o sexo e o corpo eram mais liberados e o contato com a natureza era maior e cuidadosamente preservado. Acreditando no "poder do amor e da flor", buscaram a paz, o prazer, a liberdade e o lúdico, voltando-se para a dança e o misticismo oriental.
Identificavam-se externamente por roupas não-convencionais, cabelos compridos e em desalinho, pés descalços, jeans, botas indianas, linguagem e símbolos específicos e um sentimento de grupo transbordante de emoção.
Essas 'ovelhas negras' das famílias de classe média alta, que em passeatas contra a violência e a discriminação distribuíam flores e sorrisos, escandalizavam mais os conservadores com sua 'aparência desordeira e vida promíscua' do que as 'rosas de Hiroshima' ou o próprio genocídio praticado no Vietnã.
Em 1966 o uso do LSD foi proibido por lei e a repressão andou solta sobretudo em San Francisco (EUA), considerada a capital dos hippies. No dia 14 de janeiro de 1967, em uma manifestação pacífica com 300 mil jovens da América e da Europa, o movimento foi considerado morto e enterrado junto com flores, livros e vários de seus símbolos. Havia lançado, porém, as sementes da contestação ao sistema, que floresceriam sob outras formas nas décadas seguintes. Foram os hippies, por exemplo, os precursores dos movimentos ecológicos, pacifistas e dos estilos de vida alternativos que conhecemos hoje.
ALVES, Júlia Falivene. A invasão cultural norte-americana. São Paulo: Moderna, 1988. p. 99-102.
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