O 3 de Maio de 1808, Goya
Mais de meio século depois da assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, suas propostas ainda são válidas? Conheça duas opiniões sobre o tema.
Texto 1 - A Declaração tem lacunas. Ela não trata – por não existir na época, ao menos com a evidência e a terminologia de agora – da questão ecológica. Não afirma, por isso, o direito de viver num mundo equilibrado, auto-sustentável, respeitoso em relação a todas as formas de vida. (...) A Declaração não destaca com a ênfase necessária o direito das mulheres, vítimas de secular e específica opressão. (...) A Declaração não previu que o desenvolvimento capitalista chegasse à sua atual etapa de globalização. (...) Não imaginou o neoliberalismo deste fim de século, com sua despolitização da vida, com seu consumismo, com a entronização da economia de mercado como uma “fatalidade” natural, irreversível, fora da qual não há possibilidades. Daí deriva outro problema: a introdução acelerada e sem critério das novas tecnologias, liquidando postos de trabalho e até gerando uma nova categoria, a dos “inimpregáveis”. São aqueles que, com precária escolaridade, ficarão cada vez mais à margem da dinâmica produtiva, sem oportunidades de trabalho. (...) Um projeto democrático de novos direitos precisa reverter uma lógica econômica que condena milhões, especialmente jovens, à inutilidade. (...) No tempo da padronização cultural, dos modelos “universais” de consumo, do “compro, logo existo”, é fundamental assegurar também o direito à diversidade, o direito à diferença. A Declaração, redigida antes da massificação da televisão como veículo de informação, limita-se ao direito à fruição dos bens culturais. Hoje impõe-se garantir o direito à diversidade das culturas ameaçadas pela imposição da ideologia do pensamento único, que coloca o cliente no lugar da pessoa, o consumidor no lugar do criador. (Extraído de: ALENCAR, Chico. Direitos mais humanos. 1988.)
Texto 2 - Para que lado inclinará a balança quando começar o terceiro milênio? Entre os Direitos do Homem, de um lado, e do outro a intolerância, os massacres, as torturas e a exclusão, qual terá mais peso?
A “purificação étnica” consiste em recusar um vizinho pelo simples fato de este ser diferente, pela sua religião, origem, hábitos. É também achar que se pode matar essa pessoa. Isto mistura a Antiguidade das tribos, o racismo e o totalitarismo do século XX.
Quando certos muçulmanos impõem a outros a sua maneira de compreenderem a religião e o Corão e assassinam os que não pensem da mesma forma, eles regressam ao tempo das Cruzadas, à Guerra Santa contra os infiéis. Mas esquecem-se do seu próprio passado, da época em que os muçulmanos foram mais tolerantes do que os cristãos no tempo da Inquisição.
Contudo, no horizonte do século XXI, a reconciliação das épocas ocorre por vezes. E eis dois sinais disso, para acabarmos com uma nota de esperança: o fim do Apartheid na África do Sul e a formação da União Europeia. (Extraído de: CITRON, Suzanne. A História dos homens. 1996.)
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