Mural da ex-estação de trem de Concepción. Esta parte do mural retrata cenas da cruel Guerra do Arauco entre os índios araucanos (mapuches) e os conquistadores espanhóis.
"(...) Chegou pela primeira vez em Campeche, o barco dos Dzules, brancos (...) E, com eles, vem o tempo em que os homens maias ingressaram no Cristianismo (...) Começou a entrar água na cabeça dos homens."
Sem caírmos nos radicalismos da Leyenda Negra, que atribui aos espanhóis as maiores atrocidades na América, não se pode negar que o comportamento do conquistador foi sempre violento: matou milhares de indígenas, saqueou suas riquezas, explorou sua força de trabalho, desestruturou o mundo nativo mediante uma conquista que não foi unicamente militar, mas também racial, religiosoa econômica, cultural e política.
"Quantas cidades arrasadas, quantas nações exterminadas, quantos milhões de povos passados a fio de espada, e a mais rica e bela parte do mundo transtornada pela negociação de pérola e de pimenta." (Trecho dos Ensaios de Michel Montaigne, escritor francês do século XVI)
A violência, contudo, foi exclusiva do espanhol? Ou será que portugueses, ingleses, holandeses, franceses e outras sociedades conquistadoras agiram de maneira diferente, seja na América dos séculos XVI e XVII, seja na África e Ásia Oriental nos séculos XIX e XX?
A reação indígena não foi idêntica nas comunidades que entraram em contato com o espanhol.
Em alguns casos o indígena mostrou-se amistoso e chegou a se aliar ou a se submeter sem muita resistência ao conquistador. "A vitória de Cortez sobre Montezuma (...) só pode ser compreendida se lembrarmos a aliança do conquistador com Xicontécatl, chefe dos Tlaxtaltecas, inimigos tradicionais dos mexicanos (...) Na conquista do Peru, Pizarro, por sua vez, será muito ajudado pela aliança que fará com o cacique Quilimasa." (ROMANO, Rugiero. Os Mecanismos da Conquista Colonial: Os Conquistadores. Perspectiva: São Paulo, 1973. p. 16.)
Mesmo entorpecido pelo fatalismo cosmogônico de suas crenças que concebiam a vida como uma continua destruição ou pelo retorno inevitável de deuses ao mundo que haviam criado, o indígena lutou como pôde contra o conquistador. Mesmo aterrorizado pelos efeitos de novidades incompreensíveis ao seu contexto mental (como o cavalo, as armas de fogo, as armaduras de aço etc.), o indígena utilizou todos os recursos de suas técnicas guerreiras e de armamentos primitivos, cuja inferioridade mais se evidenciava quando confrontados com o equipamento bélico do invasor.
É certo, porém, que inúmeros grupos indígenas despertaram o pavor do espanhol diante do efeito mortífero de flechas envenenadas, arremessadas por exímios arqueiros ou projetadas pelas temíveis zarabatanas. No Caribe, em Tucumán (Argentina) e no País dos Mojos (Amazônia) muitos conquistadores tombaram atingidos mortalmente por flechas envenenadas.
Nos Pampas, para neutralizar os cavalos que transportavam os guerreiros brancos, os indígenas inventaram a boleadeira que até hoje é usada pelos gaúchos: arremessadas nas pernas do animal, nelas se enroscavam e provocavam a queda do cavalo e do seu cavaleiro, prontamente atacados pelos nativos.
Em muitas regiões recorreram os indígenas ao emprego de cabaças contendo pimenta ou folhas verdes queimadas; a fumaça desprendida provocava ardência nos olhos e momentaneamente reduzia a visão, o que era aproveitado pelo índio para se engajar em combate corpo-a-corpo com o espanhol.
Se na maioria das vezes os nativos acabaram derrotados, nem sempre o branco saiu vencedor. Os araucanos do Chile, os peles-vermelhas dos atuais EUA, os guaicurus do Chaco, os charruas do Uruguai e outros grupos mais não hesitaram em abandonar seus anteriores padrões culturais e aprender a utilizar o cavalo para melhor resistir e atacar o conquistador. Os charruas, por exemplo, eram excelentes canoeiros e pescadores antes de adotarem os padrões de vida baseados no nomadismo predatório eqüestre. Os araucanos, que tiveram em Lautaro um dos seus principais dirigentes, tornaram-se excelentes cavaleiros e, mediante ataques fulminantes e guerras de guerrilha, destruíram sistematicamente os estabelecimentos criados pelos espanhóis no Chile meridional: sua tenaz resistência obrigou os invasores a assinar o Tratado de Quillin, reconhecendo a soberania araucana sobre as terras ao sul do Rio Bio-Bio (1641). AQUINO, Rubim Santos Leão de et al. História das sociedades americanas. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1990. p. 67, 69-70.
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