"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Um balanço da Grande Guerra (1914-1918)

As listas de vítimas eram quase infinitas. Os sérvios foram os que mais sofreram. Um em cada quatro homens sérvios entre 15 e 49 anos de idade morreu. Nos anos que se seguiram, a falta de noivos foi terrível para as mulheres. Turquia, França, Romênia e Alemanha foram os próximos a sofrer gravemente, perdendo de 13% a 15% de seus homens pertencentes à mesma faixa etária vulnerável. Das outras nações que participaram da guerra, o Império Austro-Húngaro perdeu 9% de seus homens, a Itália perdeu 7% e a Grã-Bretanha perdeu quase 6%. O índice de mortes na Rússia foi de 5%, próximo da Nova Zelândia e ao da Austrália. O Canadá, onde a maior parte dos franco-canadenses se recusou a alistar-se, e os Estados Unidos, que entraram na guerra tardiamente, ficaram ainda mais abaixo nessa lista. Ninguém jamais conseguiu estimar a quantidade de talentos perdidos – poetas, engenheiros, padres, líderes sindicais, professores, pintores, arquitetos, pilotos, cirurgiões e estadistas da geração futura.


Hospital militar de emergência durante a pandemia de gripe espanhola, que matou cerca de 675 mil pessoas apenas nos Estados Unidos. Acampamento Fuston, Kansas, 1918.

A guerra enfraqueceu a Europa. O gigante econômico e político do mundo teve diversas de suas artérias cortadas. Mesmo os vencedores perderam financeiramente. A Grã-Bretanha, que concedera a maior parte dos empréstimos em 1914, entregou boa parte de sua supremacia financeira aos Estados Unidos, até então em débito com países europeus. A Europa se mutilou empunhando o machado.

Os Estados Unidos foram o grande beneficiário financeiro: suas indústrias cresceram enquanto os competidores europeus estavam absorvidos pelas batalhas. O Japão também se beneficiou: pela primeira vez em muitos séculos, um país do Leste Asiático foi saudado como líder mundial. Na conferência de paz de Paris, o Japão tomou assento entre os cinco grandes. Seus ganhos territoriais foram pequenos. O país também lutou para inserir uma cláusula na Convenção da Liga das Nações que prometesse tratamento justo a todos os cidadãos estrangeiros que vivessem em qualquer das nações participantes.

Aceito no grupo dos países mais poderosos, o Japão se mostrou curioso a respeito deles, permitindo então pela primeira vez que um herdeiro do trono viajasse para o estrangeiro. Em março de 1921, com alguma agitação, o povo japonês se despediu do príncipe Hirohito, que embarcou em um navio rumo à Europa.

Compensadora para o Japão, a guerra foi um rude golpe na longa era de otimismo material e espiritual do Ocidente, bem como em sua crença no progresso humano, defendida tão apaixonadamente em muitos círculos no século XIX. Mas, de alguma forma, o conflito aumentou a fé no progresso, pois a jovem Rússia socialista se tornou uma fonte de esperança para centenas de milhões de pessoas em diversos países. Ali estava um dos experimentos mais inusitados da história da humanidade.

Na África, na América do Sul e na Ásia, muitos jovens radicais se maravilhavam com a Rússia do pós-guerra. Nehru, um jovem indiano que mais tarde se tornou primeiro-ministro, sentiu-se inspirado pela nova União Soviética: “Não tive dúvidas de que a revolução soviética havia feito a sociedade humana dar um grande salto e acendido uma intensa chama que não se enfraqueceria.”


BLAINEY, Geoffrey. Uma breve história do século XX. São Paulo: Fundamento Educacional, 2011. p. 75-77.


NOTA: O texto "Um balanço da Grande Guerra (1914-1918)" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.

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