O diabo foi “a principal criação
do cristianismo durante a longa Idade Média”, segundo Jacques Le Goff. No
entanto, originalmente Satã tinha um lugar limitado no Velho Testamento, apesar
de no livro do Gênese sua ação ser decisiva na queda da humanidade. No Novo
Testamento, ele aparece sob diversos nomes: Satã (o adversário), o diabo
(aquele que se põe de través), Belzebu (o rei das moscas). A Idade Média
construiu uma demonologia complexa. Raros são os autores que não discutiram
esse tema, sobretudo sua existência. Mas a maioria concordava em dizer que o
diabo era bom quando foi criado, e o orgulho é que tinha provocado sua queda e
a dos anjos maus. Lúcifer caiu no inferno, seu território, enquanto os anjos
decaídos assustavam o mundo e atormentavam os seres humanos – estavam na origem
de todas as perdições.
Ressurreição da carne, (1499-1502). Capela de San Brizio,
Duomo, Orvieto. Luca Signorelli.
O fascínio exercido pelo diabo e
pelos demônios sobre os teólogos e clérigos que especulavam sobre sua
identidade estava ligado ao poder conferido a ele. O diabo tinha a capacidade
de se deslocar pelos ares, o dom da ubiqüidade, a faculdade de prever o futuro
e sondar o passado. Por fim, era capaz de penetrar no corpo humano por meio da
possessão. As descrições são surpreendentes: o diabo transformava o corpo e a
voz do possuído, o jogava no chão e lhe infligia tormentos atrozes. Além disso,
os demônios íncubos (masculinos) e súcubos (femininos) podiam se apoderar da
matéria humana e fazer as mulheres gerarem monstros. Todos esses prodígios
eram, na verdade, ações de criaturas divinas destinadas a testar a fé humana.
Lado sombrio do cristianismo, muitos eram os culpados. Primeiro, os pagãos,
depois os judeus e os muçulmanos, os heréticos e, na fase final da Idade Média,
as feiticeiras. O próprio pecador, mergulhado na luxúria, na gula ou no roubo,
era classificado de possuído.
BETING, Graziella. Coleção história de A a Z: [volume] 2: Idade
Média. Rio de Janeiro: Duetto, 2009. p. 26-27.
NOTA: O texto "O Diabo, uma criação do cristianismo" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
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