"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O Diabo, uma criação do cristianismo

O diabo foi “a principal criação do cristianismo durante a longa Idade Média”, segundo Jacques Le Goff. No entanto, originalmente Satã tinha um lugar limitado no Velho Testamento, apesar de no livro do Gênese sua ação ser decisiva na queda da humanidade. No Novo Testamento, ele aparece sob diversos nomes: Satã (o adversário), o diabo (aquele que se põe de través), Belzebu (o rei das moscas). A Idade Média construiu uma demonologia complexa. Raros são os autores que não discutiram esse tema, sobretudo sua existência. Mas a maioria concordava em dizer que o diabo era bom quando foi criado, e o orgulho é que tinha provocado sua queda e a dos anjos maus. Lúcifer caiu no inferno, seu território, enquanto os anjos decaídos assustavam o mundo e atormentavam os seres humanos – estavam na origem de todas as perdições.


Ressurreição da carne, (1499-1502). Capela de San Brizio, Duomo, Orvieto. Luca Signorelli.

O fascínio exercido pelo diabo e pelos demônios sobre os teólogos e clérigos que especulavam sobre sua identidade estava ligado ao poder conferido a ele. O diabo tinha a capacidade de se deslocar pelos ares, o dom da ubiqüidade, a faculdade de prever o futuro e sondar o passado. Por fim, era capaz de penetrar no corpo humano por meio da possessão. As descrições são surpreendentes: o diabo transformava o corpo e a voz do possuído, o jogava no chão e lhe infligia tormentos atrozes. Além disso, os demônios íncubos (masculinos) e súcubos (femininos) podiam se apoderar da matéria humana e fazer as mulheres gerarem monstros. Todos esses prodígios eram, na verdade, ações de criaturas divinas destinadas a testar a fé humana. Lado sombrio do cristianismo, muitos eram os culpados. Primeiro, os pagãos, depois os judeus e os muçulmanos, os heréticos e, na fase final da Idade Média, as feiticeiras. O próprio pecador, mergulhado na luxúria, na gula ou no roubo, era classificado de possuído.


BETING, Graziella. Coleção história de A a Z: [volume] 2: Idade Média. Rio de Janeiro: Duetto, 2009. p. 26-27.

NOTA: O texto "O Diabo, uma criação do cristianismo" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.

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