No dia 1º de novembro de 1755, um
grande terremoto abalou a capital portuguesa. Era Dia de Todos os Santos,
feriado religioso, e muitas pessoas encontravam-se nas igrejas no momento do
tremor. As informações sobre o número de vítimas variam muito. Dados do governo
português falam entre 10 mil e 30 mil mortos, mas, segundo relatos de
estrangeiros que estavam em Lisboa no dia da tragédia, o número de mortos se
aproximou dos 100 mil, numa população que, na época, estava próxima de 250 mil.
O terremoto de Lisboa, gravura de Georg Caspar Pfauntz
Estudos recentes afirmam que a
intensidade do abalo se aproximou de 9 graus na escala Richter, sendo um dos
terremotos mais destruidores da história da humanidade. O primeiro tremor
ocorreu por volta das 9h45 e durou entre seis e sete minutos. Seguiram-se dois
novos tremores e, cerca de uma hora após o primeiro tremor, um tsunami de cerca de 20 metros arrasou a parte
da cidade mais próxima à foz do Rio Tejo. Para agravar a situação, inúmeros
incêndios aconteceram na cidade, provocados principalmente pela grande
quantidade de velas acesas por causa do feriado religioso.
Muitos religiosos, sobretudo
padres jesuítas, consideraram o terremoto um castigo divino pela falta de fé do
povo português. Pombal, como era próprio do pensamento iluminista, combateu
essa ideia, tratando o caso de maneira racional, elaborando relatórios
científicos para analisar o cismo. Os estudos gerados na época acabaram dando
origem à sismologia, ciência moderna que estuda os terremotos.
O terremoto lisboeta causou
impacto, também, no pensamento de muitos filósofos da época. Inúmeros livros e
artigos foram escritos na Alemanha, Holanda, Inglaterra, Itália, Espanha e
França e geraram dúvidas sobre a existência de um Deus bondoso e fiel.
Voltaire, um dos principais
pensadores iluministas, escreveu, em seu livro Cândido ou O otimismo,
uma grande crítica ao pensamento
otimista predominante em alguns textos filosóficos da época. O personagem
principal da história, o jovem Cândido, desembarca em Lisboa acompanhado de seu
amigo e mentor, o filósofo Pangloss, que tudo via com otimismo, exatamente no
dia da tragédia. A linguagem bastante irônica utilizada por Voltaire leva os
argumentos de Pangloss a parecerem absurdos aos olhos do leitor.
[...] a seguir, uma passagem da
obra, no momento em que os personagens caminham pela cidade no dia posterior ao
terremoto.
“No dia seguinte, tendo
encontrado provisões de boca enquanto se esqueiravam através dos escombros,
refizeram-se um tanto. Trabalharam, depois, como os outros, atendendo a pessoas
escapadas à morte. Alguns cidadãos, socorridos por eles, serviram-lhes um
jantar tão bom quanto possível em meio a tal desastre; é verdade que foi triste
a refeição, regado em lágrimas o pão dos comensais, mas Pangloss consolou-os,
assegurando-lhes que as coisas não poderiam ser de outra maneira:
- Pois tudo isto [...] é o que há
de melhor; porque, havendo um vulcão em Lisboa, era impossível que estivesse
noutra parte; pois não teria cabimento que as coisas não se encontrassem
exatamente onde se encontram; pois tudo assim está bem.” (VOLTAIRE. Cândido ou O otimismo. São Paulo:
Publifolhoa; Rio de Janeiro: Ediouro, 1998. p. 22.)
BRAICK, Patrícia Ramos. Estudar história: das origens do homem à era
digital. São Paulo: Moderna, 2011. p. 72-73.
NOTA: O texto "O terremoto de Lisboa" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
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