Quando chegaram à Grécia, por volta de 2000, os aqueus ignoravam tudo a respeito do mar e, para designá-lo, tiveram que utilizar uma palavra pré-helênica: thalassa. Mas não demoram a percorrer as mesmas rotas que os marinheiros cretenses, e são estabelecidas relações diretas entre Egito e Micenas, que recebe objetos com os nomes de Amenófis III (1447-1380). É por volta dessa época que se instala em Creta uma dinastia aquéia. Desde então, a ilha bem-aventurada corre perigo: pouco depois de 1400, Cnossos é completamente destruída, ao mesmo tempo que Gurnia, Zacro, Palaicastro... A Creta minóica morreu: casas e túmulos, raros e pobres, são aqueus; a arte declina lentamente; muitos cretenses provavelmente emigraram com suas tradições para Chipre e para a Ásia, outros para o Egito, e acredita-se perceber sua influência na renovação da arte que marcou o reinado de Amenófis IV. No entanto, os próprios vencedores foram os verdadeiros herdeiros da civilização minóica e, durante mais de dois séculos, prolongaram-lhe a glória.
Porta dos Leões (detalhe), Micenas
Nesse período, a Argólida, mais adiantada, exerce uma espécie de hegemonia sobre toda a Grécia. Os palácios fortificados dos Pelópidas em Micenas e dos filhos de Dânato em Tirinto e Argos rivalizam em brilho e poder. As muralhas de Micenas, aumentadas, encerram a antiga necrópole real num baluarte semicircular; a porta monumental é ornada com o célebre baixo-relevo em que duas leoas ladeiam uma coluna mais larga no alto que na base, motivo corrente da arte minóica, aqui tratada com vigor e simplicidade. Sobre o primeiro palácio eleva-se um segundo, adornado de afrescos, com revestimentos de estuque vermelho e lajes de gipsita, imitação provinciana do de Cnossos. Em Tirinto, três séries de muralhas e fortificações, entre 1500 e 1200, fazem dessa colina estreita a mais formidável fortaleza da Grécia. Os blocos ciclópicos formam ainda hoje baluartes, galerias abobadadas, poternas e escadas fortificadas de uma força impressionante.
Os túmulos com cúpulas, inspirados nos tholoi de Messara, em Creta, a princípio simples câmaras escavadas na rocha, tornam-se edifícios grandiosos, revestidos interiormente de alicerces de pedra e dominados por uma abóboda com galerias salientes. O tesouro de Atreu, que hoje se acredita datar do século XIV ou XIII, é o mais perfeito modelo desse tipo de túmulo, com sua cúpula de 13 metros de altura, a massa poderosa do lintel - bloco espesso de 3 metros de altura e 8,50 de comprimento - e a elegância das meias-colunas de brecha verde, cinzeladas e emolduradas, que ladeiam a porta.
Para além da Argólida, a civilização micênica estende-se por toda a Hélade. Feudos e principados desenvolvem-se, independentes, mas com um profundo sentimento de sua unidade étnica; esses múltiplos pequenos Estados, constituídos entre 1400 e 1200, são os que a história conhecerá mais tarde: trata-se já, irremediavelmente fragmentado, do mapa da Grécia clássica. Em Messênia, o palácio de Nestor em Pilo é o mais vasto da época. Na Lacônia, Esparta sucede Vafio e Amíclas. Na Ática, os túmulos recebem jóias e vasos de todo o período micênico. Em Tebas, sobre a Cadméia, eleva-se um palácio ornado de afrescos; a riqueza e o esplendor de Orcômeno, atestados pelo tesouro de Mínias, eram comparáveis aos de Tebas no Egito; a Etólia e a Acarmânia possuem túmulos com cúpulas e a própria Macedônia constrói casas de pedra e recebe produtos micênicos.
1. A civilização micênica. Enquanto a Grécia recebeu as lições dos cretenses, a arte do continente rivalizou com a da ilha; mas, após a queda de Cnossos, manifestam-se mudanças profundas, por vezes lamentáveis. Os guerreiros aqueus preferem os poderosos castelos-fortalezas, símbolos de sua dominação brutal, aos palácios ensolarados de Creta; adornam-nos com afrescos, mas as mulheres pesadamente enfeitadas que desfilam nas paredes de Tirinto são bem diferentes da "Parisiense". As cenas de caça e de guerra substituem as paisagens floridas, e os cachorros salpicados de rosa e azul perseguindo um javali, com suas formas rígidas e convencionais, estão muito longe do realismo cretense. Nos vasos, os motivos marinhos ou florais reduzem-se a monótonas combinações de curvas. Deve-se assinalar, entretanto, o aparecimento de quadrúpedes, pássaros e até figuras humanas, como os guerreiros barbudos de um célebre vaso de Micenas; mas o desenho, sempre sumário, não tarda a tornar-se rígido e estilizado, sobretudo no período submicênico (1200-1100). Lugar à parte merecem a glíptica e a ourivesaria: para os senhores opulentos de Micenas "rica em ouro", os artistas continuam a cinzelar luxuosas jóias de ouro e prata, de requintado lavor e a fabricação de armas permanece digna dos punhais damasquinados e das espadas de Creta.
No conjunto, porém, a arte micênica torna-se popular e industrial. As oficinas multiplicam-se nas cidades e em torno dos palácios, uma rede de estradas muito frequentadas cobre a Grécia, as relações marítimas desenvolvem-se e, a partir daquele momento, trabalha por atacado, com processos mais sumários, para uma clientela numerosa, mas de exigências artísticas restritas.
Outras mudanças, mais profundas, acentuam o caráter guerreiro e patriarcal da civilização aquéia: a mulher quase já não sai do harém; um deus masculino e quase sempre marinheiro, como Apolo com o delfim, ou Poseidon, destrona a Deusa-Mãe; as lendas heróicas agrupam-se em torno dos sítios aqueus. No entanto, as confrarias religiosas (thiases), originárias de Creta, perpetuarão, nos mistérios da Grécia clássica, muitos elementos do culto feminino dos cretenses. Por fim, a prática de sacrifícios humanos em honra dos mortos, o desaparecimento completo do emprego da escrita entre o povo, e talvez entre a aristocracia aquéia, acabam por revelar que a "doçura de viver" minóica desapareceu.
2. Os micênicos no Mediterrâneo. Após a conquista da Grécia e das ilhas vizinhas, os aqueus, comprimidos no solo pobre da Hélade, buscam a fortuna longe de seu território, e toda a orla do Mediterrâneo passa a conhecer os "homens de bronze". Estes já não se contentam em comprar e vender, com os cretenses; tentam, sobretudo nas ilhas e na Ásia, estabelecer agrupamentos ao mesmo tempo comerciais e políticos, as achaies. Ocupam inicialmente Rodes, onde fundam várias cidades, e depois Chipre, já quase colonizada pelos minóicos, para onde seu dialeto aqueu, conservado no cipriota da época clássica. No Egito e na Síria, desenvolvem-se as trocas comerciais: os vasos micênicos penetram até a Núbia e circulam na terra de Canaã; toda a costa síria, já profundamente influenciada por Creta, cobre-se de feitorias, e Ugarit transforma-se numa verdadeira colônia micênica. Mas é de preferência nas costas da Anatólia, em Lesbos, na Lícia e na Panfília que se instalam as achaies, que renovam a tradição das piratarias do Egeu, estabelecendo relações frutíferas com os povos do interior, sobretudo os hititas (um cilindro hitita chega a Tirinto e uma esfinge a Haghia Tríada). As tabuinhas de Boghaz-Keui, recentemente decifradas, mostram-nos os reis hititas Mursil II e Tudalia III (séculos XIV e XIII) acertando as questões dos Akhkhyara com seus vizinhos da Cilícia e da Cária. Tais documentos parecem considerar esse Estado aqueu como sendo tão importante quanto o Egito e mostram o rei Atarássias, contemporâneo de Tudalia IV (1255-1220), à frente de uma poderosa coalizão e de uma frota de cem navios. Trata-se provavelmente do conjunto dos estabelecimentos aqueus nas costas da Anatólia. Já se tentou aproximar esse Atarássias de Atreu, pai de Agamenon, e nesse caso se trataria da Argólida, mas isso é mais difícil de admitir.
Se não se pode afirmar que os cretenses frequentaram os mercados do Mediterrâneo ocidental, numerosos indícios de uma influência egéia parecem provar que os micênicos não temiam essas expedições longínquas. A primeira escala para o Ocidente foi sem dúvida Corcira; dali se atingia o fundo do Adriático, onde se trocavam o âmbar do norte e o estanho da Boêmia por lingotes de cobre cipriota, encontrados na Dalmácia. Diante de Corcira, Tarento recebe, a partir de 1700, vasos com base; o dialeto messapiano apresenta analogias com o eteo-cretense, e encontram-se nessa região o machado duplo e os chifres de consagração. Já se assinalou que Malta e a Sicília muito deveram às influências egéias; houve, inclusive, uma Minoa perto de Agrigento. Os micênicos passam em seguida às ilhas Eólias, onde compram o riólito, depois à Sardenha, onde depositam lingotes de cobre marcados com sinetes egeus, e enfim às Baleares, onde introduzem sem dúvida o culto do touro, com o machado duplo e os chifres de consagração; mas as belas cabeças de bronze conhecidas sob o nome de vacas de Costig, frequentemente comparadas aos rythons minóicos, são talvez de época mais recente. Existem traços egeus na Provença (um punhal cipriota em Auriol) e, nas costas ibéricas, os motivos conservados por muito tempo pela cerâmica indígena, as jóias e os objetos de estilo egípcio que os micênicos imitavam para a exportação conduzem-nos provavelmente ao reino de Tartesso.
Aliás, é possível que grande parte dessas trocas, dessas importações e exportações, tenha sido feita por intermédio das marinhas indígenas, em particular no Adriático e para além da Sicília. Isso justifica perfeitamente a influência egéia nessas regiões e explica ao mesmo tempo por que os gregos do primeiro milênio esqueceram essas rotas e esses tráficos distantes, a ponto de povoar o Mediterrâneo ocidental de lendas terrificantes e de fazer de Tartesso um país fabuloso, até o dia em que o samnita Kolaios o redescobriu por acaso, por volta de 630.
GABRIEL-LEROUX, J. As primeiras civilizações do Mediterrâneo. São Paulo: Martins Fontes, 1989. p. 53-58.
Se não se pode afirmar que os cretenses frequentaram os mercados do Mediterrâneo ocidental, numerosos indícios de uma influência egéia parecem provar que os micênicos não temiam essas expedições longínquas. A primeira escala para o Ocidente foi sem dúvida Corcira; dali se atingia o fundo do Adriático, onde se trocavam o âmbar do norte e o estanho da Boêmia por lingotes de cobre cipriota, encontrados na Dalmácia. Diante de Corcira, Tarento recebe, a partir de 1700, vasos com base; o dialeto messapiano apresenta analogias com o eteo-cretense, e encontram-se nessa região o machado duplo e os chifres de consagração. Já se assinalou que Malta e a Sicília muito deveram às influências egéias; houve, inclusive, uma Minoa perto de Agrigento. Os micênicos passam em seguida às ilhas Eólias, onde compram o riólito, depois à Sardenha, onde depositam lingotes de cobre marcados com sinetes egeus, e enfim às Baleares, onde introduzem sem dúvida o culto do touro, com o machado duplo e os chifres de consagração; mas as belas cabeças de bronze conhecidas sob o nome de vacas de Costig, frequentemente comparadas aos rythons minóicos, são talvez de época mais recente. Existem traços egeus na Provença (um punhal cipriota em Auriol) e, nas costas ibéricas, os motivos conservados por muito tempo pela cerâmica indígena, as jóias e os objetos de estilo egípcio que os micênicos imitavam para a exportação conduzem-nos provavelmente ao reino de Tartesso.
Aliás, é possível que grande parte dessas trocas, dessas importações e exportações, tenha sido feita por intermédio das marinhas indígenas, em particular no Adriático e para além da Sicília. Isso justifica perfeitamente a influência egéia nessas regiões e explica ao mesmo tempo por que os gregos do primeiro milênio esqueceram essas rotas e esses tráficos distantes, a ponto de povoar o Mediterrâneo ocidental de lendas terrificantes e de fazer de Tartesso um país fabuloso, até o dia em que o samnita Kolaios o redescobriu por acaso, por volta de 630.
GABRIEL-LEROUX, J. As primeiras civilizações do Mediterrâneo. São Paulo: Martins Fontes, 1989. p. 53-58.
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