Cena de caça em um punhal. Túmulo em Micenas, século XVI a.C.
Bronze é uma liga de cobre e estanho, feita pelo aquecimento de metais combinados. É mais duro que o cobre, mas tem um ponto de fusão mais baixo, e é mais fácil de moldar. O cobre é obtido de minérios como a calcopirita (uma combinação de cobre, ferro e enxofre), mas é ocasionalmente encontrado em estado puro - por exemplo, em meteoritos. Muitas sociedades da Idade da Pedra estavam familiarizadas com ele, e o metal era muito procurado para a confecção de ornamentos e joias. Mas sua raridade e maleabilidade eram desvantajosas quando se tratava de fazer ferramentas e armas. No terceiro milênio a.C., as pessoas descobriram como produzir cobre aquecendo minérios de cobre além do ponto de fusão do metal. Aprenderam também a combinar cobre com estanho para aumentar a dureza. A liga resultante - o bronze - revolucionou a manufatura de ferramentas. E levou a uma revolução ainda maior na confecção de armas.
Ponta de dardo de bronze gravada, Lagash, 3º milênio a.C.
O bronze foi produzido pela primeira vez por volta de 3000 a.C., mas por centenas de anos permaneceu escasso, pois era difícil obter estanho. Não foi senão com a descoberta de ricas reservas de estanho, como as da Espanha e da Anatólia, que o bronze pôde ser utilizado em larga escala. Quando isso ocorreu, as armas de bronze transformaram as práticas de guerra. Uma lança de bronze era mais forte que uma pedra. Era feita de uma única peça, ao passo que uma lança de pedra tinha a força somente de sua haste e das amarras que a prendiam à haste. O mesmo pode ser dito da adaga de bronze. A espada de bronze não tinha equivalente na Idade da Pedra. A arma que mais se aproximava de sua eficiência era a clava de pedra.
Capacete de bronze
Armas e ferramentas de bronze não só eram mais eficazes como também mais fáceis de fazer. Ferramentas de pedra produzidas a mão, demandavam tempo e exigiam habilidade considerável. Objetos de metal podiam ser produzidos em massa. Um único modelo feito a mão podia ser usado para fazer centenas de moldes, cujas fornadas podiam ser enchidas com uma concha de metal. Quando o metal esfriava, o trabalho envolvido em desbastar as aparas do molde bruto levava uma fração do tempo envolvido na produção de uma ferramenta ou uma arma de pedra.
Essa mudança na tecnologia da paz e da guerra teve lugar no cenário das transformações da sociedade humana. Uma das consequências de guerras recorrentes foi a redução no número de cidades-Estado, à medida que as derrotadas eram absorvidas pelas fronteiras de suas rivais vitoriosas. Algumas das vitoriosas, por sua vez, eram conquistadas posteriormente, abrindo caminho para Estados ainda maiores. Em 2334 a.C., os exércitos de Sargon da Acádia, na Mesopotâmia setentrional, conquistaram o reino da Suméria, que somava apenas 16 anos de existência mas já possuía mais de um milhão de pessoas. Ao fazê-lo, ele criou o primeiro império do mundo. Mas não estava destinado a durar muito. Os mil anos seguintes na Mesopotâmia testemunharam um processo de ascensão e queda de impérios sucessivos, conforme os povos nas regiões circundantes se deslocavam, e cada um, respectivamente, cobiçava a abundância e as amenidades do rico território.
Essa longa competição entre impérios rivais originou uma melhoria continua na tecnologia de guerra. A eficácia das armas de bronze, e sua facilidade de manufatura, constitui apenas parte da história. O que de fato mudou a guerra foi o uso de armas e armaduras de bronze combinado com outra invenção que surgira na mesma região: o cavalo de batalha.
Cavalos haviam sido domesticados por volta de 4000 a.C. por nômades do leste da Europa e da Ásia Central, mas por muito tempo permaneceram apenas como fonte de alimento. Eles forneciam carne e leite, mas seus donos mais antigos os consideravam montaria tanto quanto teriam pensado em montar uma vaca. Não foi senão por volta de 2000 a.C. que os cavalos foram montados com um propósito sério, e o lugar onde a prática se originou parece ter sido o norte do atual Irã. Assim que a habilidade foi dominada, sua utilidade para o combate logo se tornou aparente, e a tradicional prática de procriação para obter docilidade foi invertida, na medida em que a ênfase recaiu sobre a força e a velocidade. Por volta de 1500 a.C., tropas montadas eram um componente padrão dos exércitos por todo o Crescente Fértil, e a cavalaria nômade instilava o terror nas comunidades de fazendeiros do leste da Europa ao oeste da China. Desse modo, tiveram início recorrentes incursões a cavalo aos territórios povoados da Europa e da Ásia, que continuariam pelos 3 mil anos seguintes. Nesses conflitos, os nômades errantes do leste da Europa e da Ásia Central contavam com uma arma secreta imbatível: grama. Era algo que os cavaleiros das estepes tinham em abundância, e isso facilitou aos povos nômades manter grandes bandos de cavalos e, mais do que tudo, criá-los visando aprimorar a velocidade e o vigor físico. Uma vida sobre a sela também significava que todo homem e rapaz eram potenciais cavaleiros, capazes de ser mobilizados de um momento para outro.
A combinação de cavalo e metal tornou possível o carro de batalha. Essa invenção foi um avanço comparável à introdução do tanque de guerra no século XX. Assim que os construtores de carros passaram a contar com um material duro e fácil de trabalhar como o bronze, as vantagens do metal sobre a madeira na construção de veículos militares tornaram-se óbvias. Entre 2000 a.C. e 1500 a.C., muitos povos do sudoeste da Ásia desenvolveram algum tipo de carro de batalha. Mas a versão leve dois-homens-duas-rodas criada pelos nômades das estepes foi uma arma de guerra muito mais eficaz do que os desajeitados carros de quatro rodas usados pelos povos das planícies. Esse carro leve e os arqueiros a cavalo, capazes de disparar flechas cavalgando em alta velocidade, criaram um novo tipo de guerra. Exércitos agora podiam deslocar-se por grandes distâncias, e ataques podiam ser lançados contra cidades desprovidas de defesa por forças que nem sequer imaginavam encontrar pelas redondezas.
Essas mudanças na tecnologia de guerra foram acompanhadas por outras igualmente drásticas nos assuntos da vida cotidiana. A rede de comércio agora se estendia por milhares de quilômetros. O transporte fluvial fora transformado com a invenção da vela. [...] Em nenhum lugar isso teve mais importância do que no Egito, um país erguido às margens de um rio. Os egípcios já usavam botes feitos de tábuas, que lhes possibilitaram transportar pesadas cargas a jusante. Mas depois que inventaram a vela, por volta de 3500 a.C., puderam explorar os ventos do norte para viajar a montante com a mesma facilidade com que desciam o rio. [...]
A invenção da vela não só transformou o transporte fluvial: também tornou possível a travessia de oceanos. Em vez de remar ao longo da costa, os marinheiros tornaram-se aptos a enfrentar o desafio do mar adentro. Os primeiros veleiros egípcios contavam com velas longas e estreitas presas a dois mastros. À medida que se aventuravam pelo Mediterrâneo, desenvolveram a vela grande e quadrada, que mais tarde se tornaria o padrão de navegação marítima por toda parte. Essas naus oceânicas [...] ampliaram enormemente o alcance do comércio egípcio e inauguraram uma era de supremacia naval do Egito que durou quase 2 mil anos. Eles traziam cobre de Chipre, estanho da Ásia Menor e, o mais importante, em um país sem florestas, madeira do Líbano.
O desenvolvimento da navegação de alto-mar foi um fator crucial na aceleração da mudança que caracterizou a transição da Idade da Pedra para a Idade do Bronze. O transporte marítimo era muito mais fácil que o terrestre. Isso gerou imensa vantagem para qualquer sociedade com acesso a águas navegáveis; vantagem que perduraria até a invenção da locomotiva a vapor, no século XIX. Em nenhum lugar essa vantagem foi mais importante do que para as sociedades que cresciam em torno do Mediterrâneo. [...] À medida que povoamentos e portos se instalaram às suas margens, ele assumiu cada vez mais o caráter de um grande lago interior, ao redor do qual se estabeleceram diversos Estados [...].
O Egito, com sua localização privilegiada para se beneficiar do comércio oceânico tanto no Mediterrâneo quanto no golfo Pérsico, foi a mais brilhante e poderosa dessas civilizações marítimas. Mas, durante o segundo milênio a.C., outras surgiram em cena. Uma delas, a minóica, estabeleceu-se na ilha rochosa de Creta. Ali, no que à primeira vista era uma paisagem inóspita, uma estirpe de resistentes agricultores cultivava trigo, plantava oliveiras e videiras e criava ovelhas. Por quinhentos anos, eles conduziram um comércio de exportação de lã, vinho e azeite com outros países e com suas próprias colônias em torno do Egeu. os vestígios de seus palácios dão testemunho da prosperidade resultante. Nas ruínas de um deles, um tabuleiro de jogo foi encontrado, incrustado de marfim e lindas pedras de lápis-lazúli de sua única fonte disponível na época, as minas acima de Faizabad, no Afeganistão. Era um achado que condensava tanto o luxo usufruído pelas classes dominantes nas civilizações da Idade do Bronze como as redes mercantis em que esse luxo estava baseado.
Em 1628 a.C., os povoamentos costeiros minóicos foram inundados por um tsunami, e seus campos soterrados pelas cinzas de uma erupção vulcânica da ilha de Thera (Santorini), 160 quilômetros ao norte. A civilização sobreviveu, a despeito da fome e da desordem social, mas em 1450 a.C. finalmente sucumbiu a um ataque de invasores vindos de Micenas, no continente grego, durante o qual a maioria de seus palácios e vilas foram arrasados.
A queda da civilização minóica coincidiu com o surgimento de uma nova cultura marítima no Mediterrâneo oriental - a dos fenícios. Eles falavam uma língua aparentada com o hebraico e viviam em áreas litorâneas onde hoje estão situados os atuais Síria e Líbano. Essa região é abençoada com alguns dos melhores portos naturais do mundo. Em 1500 a.C., já existia um agitado comércio transoceânico com o Egito e a Mesopotâmia. Três produtos em particular formavam sua base: madeira de pinheiro e cedro; tecidos tingidos com o famoso púrpura de Tiro, também conhecido como púrpura "real" ou "imperial", obtido do molusco Murex; e marfim de elefantes africanos, que era destinado à Mesopotâmia e a toda parte.
No início, os fenícios haviam se sujeitado à soberania do Egito, mas este império estava se desmanchando diante dos ataques tanto do norte quanto do sul. Por volta de 1000 a.C., com o enfraquecimento da influência egípcia na região, as principais cidades fenícias - Tiro, Sídon, Biblos, Berytus (Beirute) e Ugarite - evoluíram para cidades-Estado independentes. Elas abrigavam milhares de artífices, que produziam artigos de grande procura, como obras de metal, tecidos finos e bordados. À medida que o mercado marítimo prosperava, os fenícios estabeleceram postos de comércio por toda a extensão e amplitude do Mediterrâneo. Um desses, Cartago, na Tunísia moderna, se tornaria mais tarde a maior cidade fenícia.
Um retrato vívido das atividades comerciais dos fenícios nessa época é fornecido pelo relato de um mercador egípcio chamado Weinamun, que foi enviado a Biblos pelo faraó governante em 1075 a.C. para obter madeira de navio. Ele foi despachado furiosamente por Zeker Ba'l, soberano de Biblos, irritado com a sugestão de que deveria entregar a madeira como um tributo, de acordo com o que se esperava que seus ancestrais fizessem. Quando Weinamum voltou com cinco jarras de prata, quatro jarras de ouro, quinhentas peles de boi, grande quantidade de cordas e tecidos e trinta cestos de peixe, Zeker Ba'l amoleceu, e trezentos homens e 3 mil bois foram convocados para derrubar enormes cedros e transportá-los até o porto.
O império comercial dos fenícios deixou um supremo legado na forma do alfabeto, o mais econômico sistema de escrita de todos. [...] Foi o uso desse alfabeto norte-semítico pelos fenícios, por volta de 1100 a.C., que levou a uma versão posteriormente adotada pelos gregos e, por intermédio deles, por todos os povos da Europa. O alfabeto fenício tinha apenas consoantes e compreendia 22 letras. Foram os gregos que acrescentaram cinco sinais para representar as vogais e deram para os europeus, e as pessoas que falavam línguas de origem europeia, os alfabetos em uso atualmente.
A invenção do alfabeto foi um marco. As escritas cuneiforme, hieroglífica e pictográfica chinesa foram cruciais para o desenvolvimento de suas respectivas civilizações. Mas todos esses antigos sistemas de escrita envolviam um longo aprendizado, que só podia estar ao alcance de uma pequena elite ociosa. A escrita alfabética ofereceu a perspectiva de aprendizado para um número de pessoas muito maior, e o papel que ela desempenharia mais tarde, possibilitando a impressão de livros baratos com o tipo móvel, a situa firmemente nesse supertime de invenções que incluem os veículos com rodas, a máquina a vapor e o computador.
O grande volume de material escrito que herdamos das civilizações da Idade do Bronze no Mediterrâneo e no Crescente Fértil desempenhou um marco na escrita da História. [...]
AYDON, Cyril. A história do homem: uma introdução a 150 mil anos de história humana. Rio de Janeiro: Record, 2011. p. 71-78.
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