Anúncios publicados em jornais brasileiros do século XIX.
Não estranhe os anúncios! Eles eram tão comuns nos jornais da época como os anúncios de apartamentos nos jornais de hoje.
Os senhores continuavam a ser os donos da vida e da morte dos seus escravos.
Havia senhores que não utilizavam diretamente o trabalho de seus escravos. Pensando sempre em ganhar dinheiro, eles lhes ensinavam algum ofício, valorizando a "mercadoria", para depois vendê-los ou alugá-los pelos melhores preços. Eram os negros de aluguel.
Outros senhores mandavam os escravos procurar serviço por conta própria, mas com a obrigação de dividir com eles a renda que obtinham. Estes eram os negros de ganho.
Os negros de aluguel e os negros de ganho eram vistos sempre trabalhando nas cidades. Geralmente, entoando seus cantos de trabalho:
Ê, cuê...
Ganhandô...
Ganha dinheiro
Pra seu sinhô.
Ai do negro que não ganhasse para o senhor alguma pataca no final do dia! Já sabia que, no mínimo, uma repreensão o esperava.
No campo, os escravos rendiam até sem enxada nas mãos. Uma banda de música, por exemplo, além de ser sinal de prestígio para o fazendeiro, podia aumentar a renda senhorial.
- A sinhá tem comprado negro, deverá! Já comprou vinte e quatro. Negro novo, só! Disse que é pra fazê terno de zabumba, pra tocá em toda festa ganhando dinheiro pra ela.
Quem contava era a negra Rita. Ela falava da fazendeira Raimunda de Jesus, que já não vivia da terra. Saía com suas bandas de Feira de Santana e ganhava dinheiro participando das festas religiosas de Salvador, na Bahia.
Na época do Império, os negros continuavam sendo considerados - pelos brancos de mentalidade senhorial, bem entendido - como simples mercadorias. Eles eram comprados, alugados, emprestados e até como garantia de empréstimo de dinheiro eles foram usados.
Já os índios voltavam a ser valorizados. Não como mercadoria, mas como "heróis" dos poemas e romances de escritores brasileiros. Isto também aconteceu por volta da metade do século, entre 1840 e 1860.
Mais uma vez, a Europa era o modelo. Lá os escritores românticos estavam valorizando a Idade Média como um tempo heróico, de cavaleiros andantes e homens de grande pureza. Nossos escritores, que andavam em busca de um herói para o Brasil, escolheram o índio. Assim, pelo século XIX, eles o transformaram no símbolo de um "passado harmonioso", no "herói" da nação brasileira que estava se formando.
Sou bravo, sou forte
Sou filho do Norte.
Meu canto de morte
Guerreiros, ouvi.
versejava Gonçalves Dias no poema I-Juca-Pirama.
Ubirajara fará a nação Tocantins tão poderosa como a nação Araguaia. Ambas serão irmãs na glória e formarão uma só, que há de ser a grande nação de Ubirajara, senhora dos rios, montes e florestas.
Iracema, a virgem dos lábios de mel, tinha os cabelos mais negros que a asa da graúna e mais longos que seu talho de palmeira. O favo da jati não era doce como seu sorriso, nem a baunilha recendia no bosque como seu hálito perfumado. [...] Era mais rápida que a ema selvagem.
Ubirajara e Iracema eram índios decididos e belos. E foram títulos de romances famosos do escritor José de Alencar.
O índio virou moda. Nos painéis das casas nobres e nas estátuas dos jardins, lá estava ele. Os jornais tinham nomes nativos como O Tamoio e O Caramuru, enquanto figuras da sociedade rejeitavam seus nomes portugueses e passavam a se chamar Araripe, Buriti, Jurema, Jutaí...
O índio tornava-se - sem ter pedido - herói nacional! Mas só na literatura, pois suas terras continuavam a ser tomadas pelos brancos. E nenhuma lei havia que os protegesse. Pelo contrário: a Lei de Terras, aprovada em 1850, considerava particulares as terras dos índios. Para continuar nelas, eles teriam que... registrá-las em cartórios! Pode?!
Os escritores falavam da "pureza dos mais brasileiros dos brasileiros", mas pouco faziam para defendê-los. Estavam mais preocupados em ter sucesso junto aos estudantes e ao público feminino, que se alfabetizava e precisava ocupar o tempo vazio... Alguns escritores estavam também de olho nos empregos públicos e nas boas graças do imperador, tido como grande defensor da cultura.
O negro - "besta de carga" e "estrangeiro" - não mereceu uma só linha dos indianistas. Só uns poucos, como o jovem poeta Castro Alves, o defendiam:
Homens simples, fortes, bravos...
Hoje míseros escravos
Sem ar, sem luz, sem razão.
ALENCAR, Chico et alli. Brasil vivo: uma nova história da nossa gente - 1. Petrópolis: Vozes, 1991. p. 126-127.
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