Homens e mulheres incas realizando trabalhos agrícolas
Texto 1. As estratégias alimentares na Pré-história. As causas profundas desta mudança [da passagem do mesolítico para o neolítico] ainda são objeto de debate. [...] Mas o especialista Jacques Cauvin demonstrou que, no Oriente Próximo, a 'revolução neolítica' foi imediatamente precedida de uma fase de especialização na caça, observação que contradiz a hipótese de uma escassez de recursos. [...] J. Cauvin defende, portanto, a ideia de que a revolução neolítica não foi uma resposta às dificuldades econômicas, mas a expressão de uma mudança social e ideológica que acarretou modificações na relação profunda entre o homem e o meio. J. P. Digard, numa obra que renova o próprio conceito de domesticação dos animais, chega a conclusões análogas: o desejo de poder seria uma das razões profundas para o domínio sobre as espécies selvagens. [...]
A partir do paleolítico, os desenvolvimentos técnicos e econômicos permitem múltiplos e variados modos de conservação e de preparação dos alimentos. Desde esse período, também as escolhas alimentares se diversificam e orientam as estratégias econômicas, ao mesmo tempo em que são influenciadas por elas. [...] A partir do neolítico, graças a fósseis mais abundantes e mais bem conservados, isso se confirma. A alimentação pré-histórica não responde exclusivamente às necessidades nutricionais. Se foi assim na aurora da humanidade, tornou-se progressivamente expressão de opções culturais, reflexo de uma ideologia e quem sabe até, mais tarde, de relações de poder. [...]
Como resposta às necessidades individuais, a alimentação torna-se progressivamente elemento essencial de estruturação dos grupos, de expressão de uma identidade própria e origem de um pensamento simbólico. Catherine Perlès. As estratégias alimentares nos tempos pré-históricos. In: Jean-Louis Flandrin., Massimo Montanari (dir.). História da alimentação. São Paulo: Estação Liberdade, 1998. p. 49, 51, 54.
Texto 2. A participação da mulher no Peru pré-hispânico. No Estado inca, como em outras partes do mundo, a situação da mulher variava segundo o nível social ao qual pertencia. As mulheres das classes altas e dirigentes gozavam de privilégios que as diferenciavam das mulheres dos hatun runa [os "grandes homens", responsáveis pelo pagamento de impostos] ou dos homens comuns.
Estas últimas tinham papel ativo nos trabalhos agrícolas. Guaman Poma (1936) ilustra a faina camponesa dos meses de junho a agosto e mostra os homens arando a terra e as mulheres agachadas esfarelando o terreno ou depositando as sementes ou tubérculos na terra, tarefa considerada puramente feminina por ser a terra do mesmo gênero.
Mario de Tapia e Ana de la Torre (1993) percederam que 60% das tarefas familiares no campo eram realizadas pelas camponesas, incluindo a semeadura, o cultivo, a colheita, a seleção e a conservação das sementes, além do cuidado dos animais.
Na tradição andina, a divisão do trabalho está bem definida entre os gêneros e não se pode transgredir os costumes. Enquanto a semente está na propriedade, o homem é responsável por sua colheita e transporte; uma vez em casa, a mulher assume a tarefa que lhe corresponde. Maria Rostworowski. La mujer en el Perú prehispánico. Lima: IEP (documento de trabajo 72, serie Etnohistoria, 2), 1995, p. 17, 18.
Texto 3. A distribuição dos alimentos. Mais do que uma necessidade nutritiva para manter a comunidade viva, os alimentos são focos de interação familiar e comunitária, já que há muitas dimensões culturais em que o alimento é central; no processo de obtenção e distribuição, nas trocas, no pagamento de impostos, assim como nas proibições de consumo. [...] As mulheres são responsáveis pela preparação e por servir os alimentos. Em muitos casos, o poder da mulher envolve também a distribuição dos alimentos. O envolvimento feminino na produção e armazenamento é mais variável, especialmente quanto ao controle dos meios de produção e da quantidade produzida [...].
[...]
A sociedade andina é claramente dividida por gêneros, mas é também reciprocamente dependente. [...] Há uma divisão sexual do trabalho na comunidade familiar, mas ela é flexível. O cumprimento de tarefas por diferentes pessoas leva à atribuição de diferentes valores a cada tarefa. [Cada uma das] tarefas claramente divididas por gêneros reflete níveis de poder diferentes. Christine A. Hastorf. Gender, Space, and Food in Prehistory. In: Robert W. Preucel, Ian Hodder. Contemporany archaeology in theory: a reader. Oxford: Blackwell, 1996. p. 461, 462, 465.
Nenhum comentário:
Postar um comentário