"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

quinta-feira, 13 de junho de 2013

A relação dos jovens e das crianças com o mundo do trabalho na sociedade europeia moderna

No século XIV, na França, algumas jovens, como Catarina de Siena (que veio a ser conhecida como Santa Catarina), filha de um tintureiro e vigésima quarta de uma família de 25 filhos, recusaram-se a casar e foram obrigadas a trabalhar como cozinheiras para as famílias.

Nessa época, era comum as meninas colaborarem nas atividades domésticas, fazendo o pão, cozinhando, lavando e arrumando a casa, costurando e bordando. Isso acontecia nos diferentes segmentos sociais, mas era comum nas famílias mais pobres, como entre os camponeses. Ao mesmo tempo, toda a vida dos jovens e das crianças era controlada pelo pai. Ele determinava até em que lugar deveria ser colocada a cama para os jovens dormirem. O pai decidia também qual era o ofício que os meninos deveriam seguir.

No século XVIII, na França, as crianças, em sua maioria, ainda eram tratadas como adultos. Desde pequenas, eram colocadas como aprendizes de algum ofício ou tinham de ajudar os pais nas tarefas cotidianas. Dessa forma, elas viviam a experiência e o ritmo do mundo do trabalho, com seus rigores e suas imposições. Além disso, nas comunidades em que viviam, muitas crianças levavam recados e prestavam pequenos serviços. Assim, elas participavam tanto da vida pública - da comunidade - como da vida privada - da família.

Por volta do século XIX, em muitas famílias francesas as crianças eram treinadas para as imposições e a disciplina do trabalho industrial, ajudando o pai e a mãe nas atividades de tecelagem que eram realizadas pela família. Na França, durante esse século, a indústria artesanal de tecelagem ainda reunia a maior parte do trabalho operário. Nessa família-oficina, em que o lugar de morada se confundia com o local de trabalho, a ordem do nascimento determinava o futuro dos filhos. Menino ou menina, o primogênito herdaria a empresa familiar. Os outros poderiam, eventualmente, estudar. Se fosse menina e se tornasse chefe da empresa familiar, corria o risco de ficar solteira por toda vida.

Trabalho infantil: meninas em uma fábrica de tecelagem sob a supervisão de um homem


A única herança que as famílias operárias podiam deixar para os seus filhos era o emprego. Assim, em muitas fábricas que surgiram na França durante o século XIX, os pais procuravam empregar seus filhos e ensinar a eles os macetes e os segredos do ofício. Nas indústrias metalúrgicas, as crianças atuavam primeiramente como serventes; depois, por volta dos doze anos, trabalhavam como ajudantes ao lado dos afinadores de metal.

Já no século XX, uma das transformações que se consolidaram no mundo do trabalho foi a sua passagem da esfera privada - do espaço doméstico - para a esfera pública - o espaço da fábrica. Assim, as regras, como aquelas relativas ao funcionamento e aos direitos e deveres, tornaram-se, gradativamente, constitutivas dos acordos coletivos.

No começo do século XX, havia uma grande diferença entre trabalhar na própria casa ou na casa dos outros. O ideal para uma jovem era ficar na casa dos pais sem trabalhar. Se precisasse, o melhor era que permanecesse trabalhando na casa dos próprios pais, por exemplo, costurando por encomenda. Era somente nas camadas mais baixas da escala social que as jovens iam trabalhar fora de casa, na fábrica, na oficina ou na casa de alguém, como doméstica.

Ainda nessa época, trabalhar em casa também correspondia a outras duas situações distintas: trabalhar em casa para outra pessoa, como os trabalhadores em domicílio, ou trabalhar por conta própria, como os trabalhadores independentes.

Entre muitas famílias de camponeses, comerciantes e artesãos, a família era uma unidade de produção, uma verdadeira célula econômica. Todos os seus membros eram mobilizados para trabalhar na lavoura, no artesanato ou no comércio, participando da produção. Assim, no campo, os meninos ajudavam os velhos a levarem as "vacas para pastar", as meninas trabalhavam no estábulo e nos galinheiros. Toda a família ajudava a tocar o sítio ou a loja. Esse tipo de família desempenhava um papel determinante na educação das crianças e dos jovens.

Com o desenvolvimento e a expansão do trabalho externo (fora de casa) e assalariado, a família foi perdendo essa função econômica, o que diminuiu também parte da responsabilidade de educar os filhos, que foi assumida pela escola.

SCHMIDT, Dora. Historiar - fazendo, contando e narrando a História. São Paulo: Scipione, 2002. v. 6. p. 25-27. 

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