O ano de 1492 tornou-se um marco histórico, entre outras coisas, porque deu início a uma série de transformações. Tanto na Europa, de onde vieram os pretensos descobridores, como na América, a terra descoberta. Uma e outra nunca mais seriam as mesmas. Nós, habitantes da América, somos resultantes desse fato histórico.
A América foi descoberta ou conquistada? Essa pergunta é relativamente recente. Do ponto de vista europeu, a América foi descoberta pela expedição comandada por Cristóvão Colombo, em 12 de outubro de 1492, a serviço do rei da Espanha. A partir dessa data os europeus passaram a conhecer uma terra antes desconhecida por eles, portanto, descobriram-na. Mas, do ponto de vista dos povos indígenas que aqui viviam, essa terra, denominada América pelos europeus, foi invadida e conquistada.
Se antes se falava em descoberta e hoje, em conquista, não é, obviamente, porque se ignorava que essa terra já era habitada. Isso decorria do fato de que a história era escrita e contada do ponto de vista europeu, ou seja, dos vencedores. Mais recentemente tenta-se recuperar o ponto de vista dos vencidos, das vítimas da descoberta e da conquista europeia.
Mas esse ponto de vista novo não é fácil de ser estabelecido. Os testemunhos chegaram até nós de maneira indireta, muitas vezes por meio de textos escritos pelos próprios conquistadores, ou por indígenas que já haviam assimilado muito da cultura do conquistador, principalmente a escrita. Assim, as vozes dos vencidos estão na boca dos vencedores.
Além disso, não temos apenas um povo vencido, pois havia, e há, na América uma variedade de povos, com diferenças muito grandes entre si. O termo "índios" é inadequado. Criado pelo europeu, esse termo refere-se a povos muito diferentes um do outro. Mesmo assim, continuamos a usá-lo.
A experiência de cada um desses povos no contato com os europeus invasores também não foi a mesma. A conquista não se fez apenas pela força das armas, ela se deu também pela colonização e pela catequese.
Se as vozes dos vencidos são muitas, as dos vencedores também são variadas e, não raro, discordantes. Um dos textos mais citados para denunciar a violência dos espanhóis contra os povos indígenas foi o escrito pelo padre dominicano espanhol Bartolomé de Las Casas, em 1552. Uns praticavam a violência e a escravização, outros as denunciavam.
"É temerária, injusta e cruel a guerra que aos infiéis, ou seja, àqueles que nunca souberam nada acerca da fé ou da igreja, nem de nenhum outro modo ofenderam esta mesma Igreja, lhes é declarada, com o único objetivo de que submetidos ao império dos cristãos se preparem para receber a fé ou a religião cristã, ou também para retirar os impedimentos para a catequese.
[...] É contra o direito natural esta guerra que lhes causa inúmeros e irreparáveis danos, como mortes, selvagerias, estragos, roubos, servidão e outras calamidades semelhantes, a pessoas que vivem em suas terras e reinos, separadas do império dos cristãos e sem ter, de sua parte, nenhuma culpa;
[...] É também contrária ao direito divino, que proíbe matar nossos semelhantes, principalmente os inocentes, despojá-los de seus bens, tais como seus servos e servas, bois, burros, ou qualquer outra coisa que lhes pertença, caluniá-los, oprimi-los, dar falso testemunho contra sua vida, tomar o que lhes pertence com violência, e outras proibições semelhantes, inclusive os entristece. [...] LAS CASAS, Frei Bartolomé de. Del único modo de atraer a todos los pueblos a la verdadera religión. In: Coletânea de documentos para a História da América. São Paulo: CENP, 1983. p. 35-36.
Todavia, para além da oposição entre conquistadores e conquistados, invasores e invadidos, vencedores e vencidos, senhores e escravos, existiram as trocas culturais [...].
Quando dois ou mais povos entram em contato entre si, seja por meio da guerra, do comércio ou por outra forma qualquer, sempre vai haver uma troca cultural. Ao nos defrontarmos com o novo e o diferente, tentamos incorporá-lo ao nosso esquema de pensamento. Essa incorporação está condicionada pelos nossos conhecimentos e valores anteriores. O desconhecido é incorporado ao conhecido e, ao mesmo tempo, altera esse conhecimento anterior. Mesmo quando há uma rejeição ao novo, essa rejeição já passa a ser uma experiência nova para quem o rejeitou.
PEDRO, Antonio; SOUZA LIMA, Lizânias de. História sempre presente. São Paulo: FTD, 2010. p. 121-122.
Se antes se falava em descoberta e hoje, em conquista, não é, obviamente, porque se ignorava que essa terra já era habitada. Isso decorria do fato de que a história era escrita e contada do ponto de vista europeu, ou seja, dos vencedores. Mais recentemente tenta-se recuperar o ponto de vista dos vencidos, das vítimas da descoberta e da conquista europeia.
Mas esse ponto de vista novo não é fácil de ser estabelecido. Os testemunhos chegaram até nós de maneira indireta, muitas vezes por meio de textos escritos pelos próprios conquistadores, ou por indígenas que já haviam assimilado muito da cultura do conquistador, principalmente a escrita. Assim, as vozes dos vencidos estão na boca dos vencedores.
Além disso, não temos apenas um povo vencido, pois havia, e há, na América uma variedade de povos, com diferenças muito grandes entre si. O termo "índios" é inadequado. Criado pelo europeu, esse termo refere-se a povos muito diferentes um do outro. Mesmo assim, continuamos a usá-lo.
A experiência de cada um desses povos no contato com os europeus invasores também não foi a mesma. A conquista não se fez apenas pela força das armas, ela se deu também pela colonização e pela catequese.
Imagem do Códice Florentino em que indígenas são acometidos pela rubéola
Se as vozes dos vencidos são muitas, as dos vencedores também são variadas e, não raro, discordantes. Um dos textos mais citados para denunciar a violência dos espanhóis contra os povos indígenas foi o escrito pelo padre dominicano espanhol Bartolomé de Las Casas, em 1552. Uns praticavam a violência e a escravização, outros as denunciavam.
"É temerária, injusta e cruel a guerra que aos infiéis, ou seja, àqueles que nunca souberam nada acerca da fé ou da igreja, nem de nenhum outro modo ofenderam esta mesma Igreja, lhes é declarada, com o único objetivo de que submetidos ao império dos cristãos se preparem para receber a fé ou a religião cristã, ou também para retirar os impedimentos para a catequese.
[...] É contra o direito natural esta guerra que lhes causa inúmeros e irreparáveis danos, como mortes, selvagerias, estragos, roubos, servidão e outras calamidades semelhantes, a pessoas que vivem em suas terras e reinos, separadas do império dos cristãos e sem ter, de sua parte, nenhuma culpa;
[...] É também contrária ao direito divino, que proíbe matar nossos semelhantes, principalmente os inocentes, despojá-los de seus bens, tais como seus servos e servas, bois, burros, ou qualquer outra coisa que lhes pertença, caluniá-los, oprimi-los, dar falso testemunho contra sua vida, tomar o que lhes pertence com violência, e outras proibições semelhantes, inclusive os entristece. [...] LAS CASAS, Frei Bartolomé de. Del único modo de atraer a todos los pueblos a la verdadera religión. In: Coletânea de documentos para a História da América. São Paulo: CENP, 1983. p. 35-36.
Todavia, para além da oposição entre conquistadores e conquistados, invasores e invadidos, vencedores e vencidos, senhores e escravos, existiram as trocas culturais [...].
Quando dois ou mais povos entram em contato entre si, seja por meio da guerra, do comércio ou por outra forma qualquer, sempre vai haver uma troca cultural. Ao nos defrontarmos com o novo e o diferente, tentamos incorporá-lo ao nosso esquema de pensamento. Essa incorporação está condicionada pelos nossos conhecimentos e valores anteriores. O desconhecido é incorporado ao conhecido e, ao mesmo tempo, altera esse conhecimento anterior. Mesmo quando há uma rejeição ao novo, essa rejeição já passa a ser uma experiência nova para quem o rejeitou.
PEDRO, Antonio; SOUZA LIMA, Lizânias de. História sempre presente. São Paulo: FTD, 2010. p. 121-122.
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