Catarina com o seu marido, o czar Pedro III e o filho, o
futuro czar Paulo I, em 1760, Anna Rosina Lisiewska
A noiva chegara à Rússia, era jovem, sua saúde fora
recuperada e as dificuldades envolvendo sua conversão à religião ortodoxa
tinham sido superadas. Agora que ela e Pedro estavam noivos, o que impedia um
casamento imediato? Um obstáculo difícil de ser vencido até mesmo por uma
imperatriz, era a cautelosa opinião dos médicos quanto a Pedro. Aos 16 anos, o
grão-duque mais parecia ter 14, e os doutores ainda não conseguiam detectar
nele qualquer sinal convincente de puberdade. Achavam que levaria pelo menos um
ano até que ele pudesse gerar um filho. Ainda que ocorresse uma gravidez,
restariam nove meses até o nascimento da criança. Para Elizabeth, esse tempo -
21 meses - parecia uma eternidade. E como o casamento precisava ser adiado, a
imperatriz precisava adiar também a partida de Joana.
Aceitando com relutância esses desapontamentos, Elizabeth
decidiu tomar outras medidas em peregrinação a Kiev, a mais antiga e sagrada
cidade da Rússia, onde a cristandade fora introduzida pelo grão-príncipe
Vladimir no ano 800 d.C. A viagem de Moscou a Kiev, de quase 900 quilômetros ,
foi sugerida a Elizabeth por seu amante ucraniano, Razumovsky, e inclua Pedro,
Catarina e Joana, com suas respectivas comitivas, além de 230 cortesãos e
centenas de servos. A caminho, as fileiras de carruagens e carroças com
bagagens sacolejavam dia após dia nas estradas infindáveis, infligindo
cansaço, tédio, fome e sede aos passageiros. Os cavalos eram trocados
frequentemente. A cada posto de muda, oitocentos animais descansados aguardavam
a chegada da caravana imperial.
Enquanto os eminentes da corte russa viajavam em carruagens
forradas com almofadas de veludo, uma pessoa seguia a maior parte do trajeto a
pé. Elizabeth levava muito a sério a penitência e a peregrinação. Caminhando
pelas estradas russas quentes e sem sombras, suando com o calor e murmurando
orações, Elizabeth parava para rezar em cada igreja de cada aldeia e em cada
santuário do caminho. Enquanto isso, Razumovsky, prático e modesto, tanto nas
perspectivas terrenas como nas celestiais, preferia acompanhá-la em sua
confortável carruagem.
Catarina e Joana começaram a viagem numa carruagem com duas
damas de companhia. Pedro seguia em outra carruagem, com Brümmer e dois
tutores. Um dia, cansado de seus "pedagogos", como Catarina os
chamava, Pedro resolveu se reunir às duas princesas germânicas, cuja companhia
ele julgou ser mais animada. Saindo de sua carruagem, ele "entrou na nossa
e se recusou a sair", trazendo com ele um dos alegres jovens de sua
comitiva. Não demorou para que Joana, irritada com a presença dos jovens,
quisesse fazer outra arrumação. Joana tinha uma carroça equipada com pranchões
e almofadas de modo a acomodar dez pessoas. Para seu aborrecimento, Pedro e
Catarina insistiram em encher essa carroça com outros jovens. "Só deixamos
ficar conosco os mais engraçados e divertidos da nossa comitiva", Catarina
disse. "De manhã à noite, só fazíamos rir, brincar e ter alegria."
Brümmer, os tutores e as damas de companhia de Joana ficaram insultados com
essa troca, que ignorava a precedência da corte. "Enquanto nos divertimos,
eles ficaram numa carruagem, todos os quatro, mal humorados, repreendendo,
condenando, fazendo comentários azedos à nossa custa. Em nossa carruagem,
sabíamos disso, e ríamos deles."
Para Catarina, Pedro e seus amigos a viagem não foi uma
peregrinação religiosa, mas uma excursão, uma grande brincadeira. Não havia
pressa. Elizabeth só caminhava poucas horas por dia. Ao fim de três semanas, a
comitiva principal chegou à grande mansão de Alexis Razumovsky em Koseletz,
onde esperaram mais três semanas até que a imperatriz aparecesse. Quando
finalmente ela chegou, em 15 de agosto, o aspecto religioso da peregrinação foi
suspenso temporariamente. Durante duas semanas, os "peregrinos" se
reuniam numa sucessão de bailes, concertos e, de manhã à noite, em jogos de
cartas tão febricitantes que às vezes 40 ou 50 mil rublos se amontoavam nas
mesas.
Enquanto estavam em Koseletz, houve um incidente que gerou
uma rusga permanente entre Joana e Pedro. Começou quando o grão-duque entrou
numa sala em que Joana
estava escrevendo. Num banquinho ao lado dela, estava sua caixa de joias, onde
guardava as pequenas coisas que lhe eram caras, inclusive suas cartas. Pedro,
de brincadeira, para fazer catarina rir, fingiu remexer na caixa e pegar as
cartas. Joana lhe disse severamente que não tocasse naquilo. O grão-duque,
ainda se exibindo, saiu correndo pela sala, mas, ao fazer piruetas para se
afastar de Joana, seu casaco se prendeu na tampa aberta, jogando a caixa e todo
o conteúdo no chão. Joana, pensando que ele tinha feito isso intencionalmente,
teve um acesso de fúria. Pedro ainda tentou se desculpar, mas, quando ela se
recusou a acreditar que havia sido por acidente, ele também se zangou. Os dois
começaram a gritar um com o outro, e Pedro, apelando para Catarina, pediu que
atestasse a inocência dele.
Catarina ficou no meio da briga.
MASSIE, Robert K. Catarina, a grande: retrato de uma mulher.
Rio de Janeiro: Rocco, 2012. p. 82-84.
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