Misteriosa, a sexualidade feminina atemoriza. Desconhecida,
ignorada, sua representação oscila entre dois polos contrários: a avidez e a
frigidez. No limite da histeria.
Avidez: o sexo das mulheres é um poço sem fundo, onde o
homem se esgota, perde suas forças e sua vida beira a impotência. É por isso
que para o soldado, o atleta, que precisam de todas as suas forças para vencer,
há a necessidade de se afastarem das mulheres. Segundo Kierkegaard, "a
mulher inspira o homem enquanto ele não a possui". Essa posse o aniquila.
Esse medo da sexualidade da mulher que não se pode jamais satisfazer é a origem
do fiasco, temor constante de Stendhal.
Frigidez: a ideia segundo a qual as mulheres não sentem
prazer, não desejam o ato sexual, uma canseira para elas, é bastante difundida.
Balzac, em La
Physiologie du mariage, texto alusivo e preciso ao mesmo
tempo, mostra mulheres que alegam estar com enxaqueca para furtar-se ao dever
conjugal, o qual, no entanto, é prescrito por seus confessores.
Daí surge, para os homens, a necessidade, a justificativa de
procurar o prazer em outro lugar: amantes, prostitutas, mulheres sedutoras das
casas de má fama, em plena expansão no século XIX, são encarregadas de remediar
essa "miséria sexual".
Os homens sonham, cobiçam, imaginam o sexo das mulheres. É a
fonte do erotismo, da pornografia, do sadomasoquismo. E provavelmente da
excisão das meninas, prática largamente difundida ainda hoje na África
muçulmana, e mesmo na Europa, em consequência das migrações. O prazer feminino
é tolerável?
As mulheres cuja sexualidade não tem freios são perigosas.
Maléficas, assemelham-se a feiticeiras, dotadas de "vulvas
insaciáveis". Mesmo quando ficam velhas, fora da idade permitida para o
amor, as feiticeiras têm a reputação de cavalgar os homens, de tomá-los por
trás, o que, na cristandade, é contrário à posição dita natural: em suma, têm a
reputação de fazer amor como não se deve fazer. Diana figura a sexualidade
liberada. A feiticeira alimenta a escuridão das noites de sabá.
A histérica é a mulher doente de seu sexo, sujeita a furores
uterinos que a tornam quase louca, objeto da clínica dos psiquiatras. Charcot,
nas segundas-feiras do hospital de Salpêtrière, perscruta seus movimentos
convulsivos, que explodem, por vezes, em manifestações coletivas de internatos
ou de fábricas no século XIX. Novas feiticeiras, as convulsionárias
assemelham-se às possuídas de Loudun que Urbain Grandier tentava exorcizar. Mas
é o seu útero, e não o diabo que é incriminado. A histeria abre o caminho para
o caminho para as "doenças das mulheres" e para a psiquiatrização e
psicanálise dessas doenças.
No século XIX, a histérica sofre uma metamorfose,
produzindo-se um duplo movimento, identificado por Nicole Edelman: 1) a
histeria "remonta" do útero ao cérebro; ela atinge os nervos,
doentes. A mulher torna-se "nervosa"; 2) com isso, nota-se uma
extensão ao outro sexo. A histeria atinge os homens. "Estou
histérico", escreve Flaubert a Sand. Charcot confirma. A guerra acentuará
o diagnóstico da bissexualidade da histeria.
A toalete matutina, Christoffer Wilhelm Eckersberg
A sexualidade consentida, e mesmo exigida, é conjugal. Mas
não sabemos muita coisa sobre ela. Altar da sexualidade, o leito conjugal
escapa aos olhares. Até a Igreja recomenda discrição aos confessores, apesar de
sua reprovação ao pecado de Onan. Não há, entretanto, outro meio de evitar a
concepção, e o coito interrompido, numa França que restringe seus nascimentos
desde o século XVII, é bastante praticado. "Engana-se a natureza até mesmo
nas aldeias", escreve Moheau em Recherches et considérations sur la
population de la France
(1778). Cada vez mais preocupadas em limitar a dimensão de sua família e
prevenir a gravidez não desejada, as mulheres apreciavam os maridos
"atentos" e elas próprias sabiam se furtar. Não era sempre que
repudiavam as carícias conjugais, longe disso, e queixavam-se da negligência e
mesmo da impotência de seus companheiros.
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo:
Contexto, 2013. p. 65-7.
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