Mais ou menos no fim do 13 século
a.C. nova invasão, efetuada pelos dórios (arianos vindos da Ilíria) submergiu a
Grécia (com exceção da Ática), Creta, o Helesponto e a costa da Ásia Menor. Guerreiros
feudais, destruíram tudo à sua passagem. A talassocracia egéia desmoronou, ao
passo que as populações de marinheiros dos territórios invadidos lançaram-se ao
mar: o seu êxodo apareceu em todo o Mediterrâneo oriental como verdadeira invasão
dos povos do mar.
Relevo dos prisioneiros filisteus.
Templo mortuário de Ramsés III, Medinet Habu, Necrópole de
Tebas, Egito.
Foto: Rémih
Sob essas forças conjugadas, o
império dos hititas se decompôs.
O Egito só reagiu quando ele próprio
se viu ameaçado. Rechaçou a invasão na fronteira da Líbia e reconquistou, por
outra parte, a Palestina para reforçar desse lado as defesas externas do país.
Mas a suspensão do comércio
internacional provocou no interior do país grave crise econômica. Privado dos
recursos do imposto, o poder real precisou conceder novos privilégios ao clero.
As populações semidominadas instaladas a leste do Delta, revoltaram-se e foram
expulsas do país (foi nessa ocasião que se situou o êxodo dps israelitas).
A fim de defender-se contra as
incursões, as cidades do Delta cercaram-se de fortificações. O poder real
desagregou-se cada vez mais, em proveito das cidades do Baixo Egito e dos
templos do Alto Egito.
Sob o reinado de Ramsés III
(1198-1166) a frota egípcia, que permanecera intacta, infligiu pesada derrota às
forças navais dos povos do mar, ao passo que o exército terrestre egípcio
derrotava os assaltantes na fronteira síria.
Vencidos, os exércitos dos
invasores se desmembraram. Mas o Egito, que soubera defender as suas
fronteiras, perdeu os restos do seu império.
Relevo dos prisioneiros asiáticos.
Medinet Habu, Necrópole de Tebas, Egito.
Foto:
Rémih
Os filisteus conseguiram
manter-se no litoral da Palestina, ao mesmo tempo que os hebreus ocuparam as
suas montanhas, depois de haverem errado durante quarenta anos no deserto, e
ali se organizaram em doze tribos. A sociedade tribal deles, no espaço de um século,
se transformaria numa sociedade baseada num regime familial, em cujo seio a
personalidade individual começaria a destacar-se nos quadros de uma realeza
unificada.
Na fronteira da Líbia, por outro
lado, a invasão do Egito pelos povos do mar mudou de aspecto. Fez-se pacífica,
tendo o faraó aceito a instalação dos recém-chegados no delta do Nilo, e
recrutando mercenários entre eles, que passariam a defender o Egito contra as
invasões do norte e constituiriam a própria guarda do rei.
Graças ao comércio marítimo com a
Fenícia, que persistiu, os portos do Delta se reanimaram. Mas o Alto Egito
fugiu cada vez mais à autoridade do rei para cair sob a autoridade dos templos,
até o momento em que a monarquia se cindiu em dois Estados: o Alto Egito,
dominial e concentrado numa economia senhorial fechada; e o Baixo Egito,
dominado pelas cidades mercantis e orientado para o mar. Quanto à Núbia. O seu
vice-rei a transformou, em proveito próprio, num principado independente.
O que restava da antiga monarquia
arruinou-se rapidamente. Tebas, a antiga capital, passou por uma crise social
profunda. Como as finanças reais já não permitissem o pagamento dos salários,
grandes greves estouraram; despovoou-se a cidade, a burguesia comercial
transportou-se para Tânis, capital do Baixo Egito. A miséria espalhava a
venalidade, desmoralizava os juízes e impelia a classe obreira para o
banditismo. Como o rei já não dispusesse de nenhum poder real, os chefes mercenários
líbios e aqueus se arrogaram o governo das cidades do Baixo Egito e, logo
depois, faziam figura de príncipes feudais.
Quando, em 1100, uma revolta
estourou em Tânis, o rei Ramsés XI precisou refugiar-se em Tebas, sob a proteção
do sumo-sacerdote de Amon Hérithor, que desempenhou, a partir de então, o papel
de prefeito do palácio e, pouco tempo depois, assumiu o título de rei (1085).
O Egito mergulhou num novo
feudalismo.
Na mesma época, porém, os hebreus
se uniam numa confederação sob o mando de um chefe eleito, o sumo-sacerdote
Samuel (1075-1045), para lutarem todos juntos contra os cananeus e os
filisteus. Apoiada a princípio no culto, a realeza destacou-se dele com Saul
(1044-1029); tomou um caráter militar e hereditário com David (1029-974). Jerusalém,
conquistada aos cananeus, tornou-se residência real. Nascera um novo Estado monárquico.
Os etruscos e os sículos, que,
como os filisteus, tinham buscado refúgio na costa mediterrânea da Ásia Menor,
aí não conseguiram fixar-se. Os primeiros emigraram para a Itália, onde criaram
cidades, e implantaram a civilização egéia, ao passo que os sículos se
estabeleceram finalmente na Sicília.
Do reino hitita, completamente
desagregado, restavam tão-somente uns pequenos Estados feudais no norte da Síria.
Dois dentre eles, a Frigia e a Mísia, se acabariam unindo mais tarde para
formar o reino da Lídia.
Por outro lado, a invasão do vale
do Tigre e do Eufrates pelas tribos araméias, outrora instaladas entre a Síria
e a Mesopotâmia e empurradas para essa região pelas invasões dos povos do mar,
provocara uma crise profunda em toda a Mesopotâmia, desorganizando as estradas
do comércio de caravanas. A monarquia babilônica, por sua vez, já lhe sofrera
os contra-golpes. Ela caiu sucessivamente nas mãos dos pequenos reis de Susa,
descidos dos planaltos do Elão (1170), em seguida nas mãos dos príncipes semi-bárbaros
vindos de Sumer (1038), suplantados por seu turno pelos elamitas (996).
Respeitados pelos invasores, os
templos dos arredores de Babilônia se transformaram, como aconteceu no Alto
Egito, em principados senhoriais. Aqueles obtiveram, como estes, privilégios de
imunidade. No delta do Tigre e do Eufrates, as cidades, arruinadas pelo
assoreamento, já não eram mais do que cidades sacerdotais, nas quais os
sumos-sacerdotes exerciam uma autoridade de verdadeiros príncipes. O país se
dividiu em pequenos principados.
Somente Babilônia conservou a sua
numerosa população burguesa e as suas instituições urbanas. Mas debalde, com
Nabucodonosor I (1146-1123), tentou reconquistar a grande artéria comercial do
alto Eufrates. Sem embargo disso, permaneceu, durante três séculos, uma ilhota
de direito individualista no meio de um país entregue às desordens dos príncipes
bárbaros, cuja autoridade aceitou para preservar a sua atividade econômica. Continuou
sendo, apesar de tudo, o local das trocas entre os produtos trazidos da Ásia
pelos caminhos das caravanas e os que lhe chegavam dos portos mediterrâneos,
alimentados pela navegação fenícia.
Quanto à Assíria, depois de haver
levado os seus exércitos até a costa síria sob Teglatefalasar I (1116-1090), não
ousou enfrentar as poderosas cidades fenícias e voltou a encerrar-se no
interior dos seus limites nacionais, nos quais se manteve na defensiva até o 9º
século a.C.
Em toda a parte, os grandes
Estados monárquicos haviam dado lugar a Estados feudais; em toda a parte, a
vida econômica internacional se concentrara nas cidades; ilhotas de direito
individualista no meio da economia fechada dos domínios senhoriais, que viviam na
insegurança das guerras feudais constantes.
PIRENNE, Jacques-Henri. Panorama da História Universal. São
Paulo: Difel, 1973. p. 31-34.
NOTA: O texto "A invasão dos povos do mar e a ruína dos grandes Estados" não representa, necessariamente, o
pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a
construção do conhecimento histórico.
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