A descoberta do prazer feminino é antiga. Os cavaleiros da
Idade Média temem o leito e a mulher insaciável que não estão certos de poder
satisfazer, segundo Georges Duby. O Renascimento favorece esse reconhecimento
do desejo. Os médicos detectam um líquido feminino, que seria sinal de gozo e
que ajuda a reprodução. A corte dos Valois era propícia às experiências de
todos os tipos e mesmo às palavras para dizê-los.
O desejo das mulheres se expressa em certos textos da Idade
Média e mais ainda do Renascimento, como as poesias eróticas de Pernette du
Guillet. As mulheres galantes, cuja vida é evocada por Brantôme, sabem gozar do
sexo. Segundo Pierre Camporesi, Catherine Sforza vangloriava-se de tomar
posições favoráveis ao orgasmo, palavra não utilizada, embora não se ignorasse
a coisa, que é preciso buscar no eufemismo e nas expressões da linguagem
poética.
O século XVII da Contrarreforma e do jansenismo é cheio de
pudores. A libertinagem do século XVIII é sobretudo masculina, como o erotismo
do século XIX. [...]
Fala-se ainda menos da homossexualidade feminina, em razão
dos tabus que a dissimulam. A tal ponto que Marie-Jo Bonnet, uma de suas
primeiras historiadoras, quase renunciou à tarefa de estudá-la, tendo
encontrado tão somente raros testemunhos literários (como Lélia de George Sand,
que causou escândalo ao ser publicado), recorrendo mais tarde à imagem para
decifrá-la. As meninas, entretanto, não ignoram a excitação do coração e do
corpo, sobretudo nos pensionatos ingleses, mais livres, que foram estudados por
Caroll Smith-Rosenberg.
O beijo, Henri de Toulose-Lautrec
Tudo muda por volta de 1900. "Naquele tempo, Safo
ressucitou em Paris", escreve Arsêne Houssaye. As "Amazonas de
Paris" - Natalie Clifford Barney, Renée Vivien, Colette e muitas outras -
reencontram os caminhos de Lesbos e animam, na rive gauche, círculos literários
livres e refinados. É o tempo das "raparigas em flor", que atormentam
o narrador proustiano.
A guerra separa e fere os casais. Ela autoriza inúmeras
descobertas sexuais, não raro dramáticas. Radclyfe Hall evoca esses sofrimentos
identitários em The Well
of Loneliness (1928). Os "Anos Loucos" marcam, nas grandes capitais
europeias, a explosão de uma homossexualidade muito mais alegre e liberada, na
qual as lésbicas estão muito presentes. Virgínia Woolf, Violette Trefusis e
seus amigos do grupo de Bloomsburry, Gertrude Stein, Romaine Brooks, Adrienne
Monnier e Sylvia Beach são as personalidades mais conhecidas. Sabemos que elas
se amavam, que tinham prazer em estar juntas, que aliavam gozo e criação. Não
muito mais que isso.
Na cama, Henri de Toulose-Lautrec
A expressão de um erotismo feminino, ou mesmo de uma
pornografia, é, em suma, um fenômeno recente, que atingiu o romance (Virginie
Despentes, Catherine Millet) e principalmente o cinema (Catherine Breillat).
Rosa ou negro, rosa e negro, o continente da sexualidade
feminina continua uma terra desconhecida, um universo por explorar.
PERROT, Michelle. Minha história das mulheres. São Paulo:
Contexto, 2013. p. 67-8.