"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Família e sexualidade na Europa Medieval: os dois papéis da Igreja

Casal dançando e celebrando o amor. Não combinava com o saber produzido pelos homens da Igreja sobre o casamento e a sexualidade.

Com a queda do Império Romano, a Igreja foi a única instituição desse Estado que sobreviveu. Gradativamente ela conseguiu converter os bárbaros à fé cristã e assumir o papel de guia espiritual da sociedade medieval que se constituía sobre os escombros do império.

A Igreja medieval se propunha a desempenhar dois papéis, que nem sempre se harmonizavam. O primeiro, como representante de Deus na terra, era o de apontar o caminho da salvação, do retorno à casa do Pai. Para isso prescrevia uma série de princípios morais, difíceis de serem seguidos na vida cotidiana, uma vez que essa é marcada pelas necessidades materiais e pelas relações de poder.

O segundo papel, como instituição poderosa, rica e com um vasto quadro de funcionários permanentes (o clero) era o de regular a vida social e política, contribuindo para a sua permanência e reprodução. O primeiro papel levava a Igreja a se contrapor à sociedade laica, e o segundo a se confundir com ela, visto que era uma instituição privilegiada na repartição da riqueza e do poder.

Os dois papéis obrigavam a Igreja a se preocupar com o casamento. Era o matrimônio que regulamentava a divisão das mulheres pelos homens e disciplinava, em volta delas, a competição masculina, Era ele que oficializava, socializava e colocava ordem na procriação e na sexualidade.

Ao regulamentar essas forças vitais do ser humano, o casamento tocava no domínio do misterioso e do sagrado. Por outro lado, designando quem eram os pais, o casamento estabelecia os herdeiros e os parentes. Por essa razão o papel da instituição matrimonial variava conforme a posição social e econômica dos herdeiros. Ela não era a mesma para todos os grupos sociais.

O casamento era, portanto, o alicerce do edifício social, um ponto de junção entre o material e o espiritual.

Para manter a ordem social, era preciso que a vida material, incluindo a economia e a política, estivesse ajustada à espiritual, mas houve momentos em que isso deixou de acontecer. Essa contradição levou à mudança.


PEDRO, Antonio; LIMA, Lizânias de Souza. História por eixos temáticos. São Paulo: FTD, 2002. p. 222-224.

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