Ruínas de Palenque: civilização maia
Durante muito tempo, e por inspiração dos filósofos racionalistas do século XVIII, a palavra civilização significou um conjunto de instituições capazes de instaurar a ordem, a paz e a felicidade, favorecendo o progresso intelectual e moral da humanidade.
Dessa forma [...] haveria um corte nítido entre pré-civilizados e civilizados. Estes, europeus e alguns de seus descendentes diretos, e os outros, todos aqueles que por terem cultura e padrões de comportamento muito distinto do nosso constituíriam uma espécie de homens inferiores, criando ou sociedades primitivas ou simplesmente se situando à margem da lei.
Essa concepção eurocêntrica de mundo [...] encontra seu contraponto numa outra, no extremo oposto, que opta por atribuir a qualquer pequeno grupo de indivíduos capazes de amassar o barro e construir palhoças o conceito de civilização.
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Civilização [...] não é um elogio e pré-civilizados não pode ser tomado como ofensa. [...]
Uma civilização, via de regra, implica uma organização política formal com normas estabelecidas para governantes (mesmo que autoritários e injustos) e governados; implica projetos amplos que demandem trabalho conjunto e administração centralizada (como canais de irrigação, grandes templos, pirâmides, portos etc.); implica a criação de um corpo de sustentação política (como a burocracia de funcionários públicos ligados ao poder central, militares etc.); implica a incorporação das crenças por uma religião vinculada ao poder central, direta ou indiretamente (os sacerdotes egípcios, o templo de Jerusalém etc.); implica uma produção artística que tenha sobrevivido ao tempo e ainda nos encante (o passado não existe em si. Se dele não temos notícia é como se não tivesse existido); implica a criação ou incorporação de um sistema de escrita (esse item não é eliminatório): os incas não tinham propriamente uma escrita, nem por isso deixavam de ser civilizados); implica finalmente, mas não por último, a criação de cidades.
De fato, sem cidades não há civilização.
As grandes descobertas e invenções do Neolítico seriam apenas comodidades se não provocassem, por meio e por causa da urbanização, uma significativa mudança socioeconômica.
A roda, a metalurgia, o animal de tração, o barco a vela tiveram seu caráter transformador por se integrarem a uma nova organização social propiciada pela urbanização.
Nas numerosas aldeias espalhadas pelo Crescente Fértil não havia necessidade de levar os inventos e as descobertas até a sua utilização máxima. Já no sul da Mesopotâmia e do Egito tudo foi usado para que o homem pudesse enfrentar e dominar a natureza.
Isso significa grande número de pessoas atuando de forma organizada pela incorporação de conhecimentos sociais e sob uma liderança que vai se estabelecendo e adquirindo legitimidade.
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A cidade não apenas decorre de um determinado grau de desenvolvimento das técnicas e do conhecimento humano, em geral. Ela também impele a espécie humana a crescer.
PINSKY, Jaime. As primeiras civilizações. São Paulo: Contexto, 2010. p. 60-63.
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