Amor cortês na Idade Média
Texto 1
Desde o fim da Idade Média [...] até o século XVIII, cada indivíduo, homem e mulher, adotava sucessivamente dois tipos de sexualidade, uma antes [...] do casamento, e a outra [...] em seguida. [...] Em quase todas as civilizações - com exceção da civilização do Ocidente contemporâneo - existiam dois amores bastante distintos, o amor-paixão fora do casamento, e o amor conjugal. [...]
No entanto, no século XVIII, ocorreu nas classes superiores ocidentais (e não somente na França) um fenômeno considerável [...]: a revolução da afetividade no quadro da família. A família adquiriu o monopólio do sentimento do amor. A sociedade já exigia no casamento o amor outrora reservado aos amantes: o romantic love. (ARIÈS, Philippe. A contracepção no passado. In: Amor e sexualidade no Ocidente: edição especial da revista L'Histoire/Seuil. Porto Alegre: L&PM, 1992. p. 105-106.)
Texto 2
Evocar o sentimento do amor na sociedade tradicional é, à primeira vista, penetrar em um mundo completamente distinto. Entre os camponeses do século XIX, não se descrevem emoções [...], não falam a linguagem do coração; o que está presente é apenas a estratégia da explicação.
O sentimento pouco se expressa na linguagem, produz-se pelo gesto. Por ocasião de uma festa, de uma feira ou assembléia aldeã, de uma vigília ou à saída de uma missa, eles se olham, se gostam. O enamorado é incapaz de confessar seu interesse exceto por uma série de gestos em que cada qual conhece o significado, e que mostram o fraco de um pelo outro, como: apertar a mão até estalar, torcer os punhos, fortes tapas nas costas, para não falar nas saraivadas de pedras.
Se os jovens são aceitos pelas famílias, poderão "fazer o amor", ou seja, cortejar-se. A partir de então, a "frequentação", rigorosamente ritualizada, torna-se objeto da vigilância do grupo social. Frequentemente este cortejar desenvolve-se em silêncio [...]. (CORBIN, Alain. A relação íntima ou os prazeres da troca. In: PERROT, Michelle (org.). História da vida privada, 4: da Revolução Francesa à Primeira Guerra. São Paulo: Companhia das Letras, 1991. p. 525-526.)
Texto 3
No Brasil colonial, entre as classes subalternas, o exercício da livre escolha do cônjuge, movido por interesses que não eram as alianças político-econômicas, deixavam aflorar, de maneira mais espontânea, os sentimentos. Nos concubinatos tão disseminados, nas mancebias e amasiamentos encontravam-se gestos amorosos e expressões de afeto bastante discretos. No casamento, o amor deveria ser casto e continente, enquanto fora dos laços matrimoniais o amor era paixão. O amor não estava obrigatoriamente ausente dos casamentos, sobretudo dos "arranjados", e presente fora deles.
Entre as elites, o risco do casamento por amor era o de que esta instituição perdesse a sua função, desestabilizando a transmissão do patrimônio, garantida por alianças entre famílias e, na Colônia, certamente, interferindo no domínio da elite branca e metropolitana sobre os pobres e gentes de cor.
Neste período, o tipo de amor que se colocava como ideal era o amor conjugal. Uma sutil separação fazia-se entre o "bem querer amistoso" e "as más paixões". Segundo o frei Antônio de Pádua "o amor [conjugal] extingue todas as paixões malignas que são quem perturba o nosso descanso". (DEL PRIORE, Mary. Ao sul do corpo: condição feminina, maternidade e mentalidades no Brasil Colônia. Rio de Janeiro: José Olympio; Brasília: Edunb, 1993. p. 127-128.)
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