O pensador, William Orpen
Os conflitos
começaram em 1914, com uma mistura estranha de otimismo e pessimismo.
Antevia-se que a perda de vidas poderia ser grande, mas em compensação o
conflito seria breve. Tal previsão, amplamente disseminada, surgiu em parte
pelo fato de todas as últimas guerras ocorridas na Europa terem sido rápidas. O
último conflito europeu envolvendo duas potências – França e Prússia, iniciado
em 1870 – fora praticamente vencido dentro de poucos meses com a ajuda de
ferrovias, do telégrafo e de armas modernas. A crença de que a contenda
terminaria antes do natal, ou a menos logo depois, foi acentuada pela sensação
de que nem as pessoas nem os sofisticados sistemas bancário e financeiro
agüentariam sustentar uma guerra longa. Previa-se que a crescente escassez de
comida e material bélico estimularia os líderes nacionais a buscar a paz.
Como se
esperava que o resultado fosse determinado pelas primeiras batalhas, os
diversos aliados precisavam estar prontos para auxiliar uns aos outros em curto
prazo. O breve espaço de tempo entre a declaração de guerra e o envio dos
exércitos à fronteira e das esquadras ao mar é considerado por alguns
historiadores como mais uma causa do conflito. Entretanto, na verdade, tal
cronograma foi resultado da crença de que o embate era quase inevitável e de
que seria curto: os retardatários pagariam um alto preço, sendo subjugados
antes que tivessem tempo de se preparar. A guerra começou em 28 de julho de
1914 com um pequeno conflito entre a Áustria e a Sérvia – sendo os sérvios os
supostos culpados. Nos sete dias seguintes, aliados se juntaram aos dois
países. A Alemanha lutou ao lado da Áustria; França, Rússia e Grã-Bretanha
formaram outra aliança. Em uma semana, cinco grandes potências e diversas
outras menores estavam lutando ou prestes a lutar, desde o Mar do Norte até as
planícies da Polônia e as montanhas da Hungria, enquanto as batalhas navais
aconteciam em lugares longínquos, como o Mar da China, a extremidade fria da
América do Sul e os portos das ilhas tropicais do Pacífico.
Países que eram
meros espectadores escolhiam cuidadosamente o momento apropriado para consolidar
sua posição. Deveriam entrar naquela que já era chamada de Grande Guerra ou
manter-se neutro? No primeiro mês depois da eclosão do conflito, o Japão se
posicionou contra a Alemanha, empregando o melhor de sua marinha, mas recusando
o envio de um exército para a Europa. Em novembro de 1914, os turcos se
juntaram ao lado alemão e, no mês de maio seguinte, a Itália – para surpresa de
muitos – aliou-se ao outro lado. Outras nações foram aos poucos aderindo à
guerra, algumas tendo adiado a decisão até 1918. Quanto mais numerosos os
países que se juntavam à luta, mais difícil se tornava a tarefa de reunir todos
eles em uma negociação de paz.
Na primeira
semana, arroubos de nacionalismo estavam em efervescência, excedendo as
expectativas. Em centenas de vilarejos, ocorreram encontros para incitação ao
nacionalismo. No primeiro domingo, os sinos das igrejas badalaram incontáveis
vezes e sacerdotes pregaram sermões patrióticos. A eclosão da guerra foi
louvada por um historiador alemã como um momento “da mais profunda alegria”,
enquanto o jovem poeta inglês Rupert Brooke escreveu:
Agora, demos graças a Deus
Que nos acertou com Sua hora.
Brooke, um
oficial da marinha, seria enterrado em uma ilha mediterrânea no primeiro ano da
guerra.
Esperava-se que
sindicatos e partidos trabalhistas em alguns dos países em combate se
manifestassem contra a guerra. Em vez disso, a maior parte de seus membros mais
jovens se alistou ou aceitou tranquilamente a convocação. O patriotismo se
tornou agressivo. Turistas de Birmingham, abandonados na Alemanha depois que o
confronto começou, e mercadores de Viena, isolados em portos britânicos,
viram-se perdidos. Famílias reais entraram em uma disputa patriótica. A família
real russa, que tinha fortes conexões com a Alemanha, demonstrou vigorosamente
seu nacionalismo ao alterar o nome de sonoridade germânica de sua capital, São
Petersburgo, para o mais eslavo Petrogrado.
Minorias
étnicas que esperavam ficar neutras acabavam imersas em uma onda pública de
patriotismo. A Irlanda, no limite de uma guerra civil e dividida em relação à
Grã-Bretanha, reafirmou lealdade temporariamente e enviou regimentos de
recrutas para o exército britânico. Na Rússia, líderes das minorias oprimidas
juraram fidelidade à pátria. Poloneses e estonianos, letões e lituanos
prometeram lutar lado a lado com a Rússia. Um porta-voz judeu expressou
objetivamente o que os outros diziam em linguagem grandiloqüente: “Estamos
acostumados a viver – e vivemos – em condições particularmente opressivas. No
entanto, sempre nos sentimos cidadãos da Rússia e filhos fiéis da terra
pátria.”
A unidade
nacional desabrochou na França dividida. A imprensa francesa, tal como a da
maior parte dos países livres, aceitou a censura da verdade pelo bem da unidade
nacional e da necessidade de repelir as investidas dos alemães. Na França, a
realidade não era nada agradável. O exército tinha pouca munição para suas
grandes armas de fogo. O atendimento médico aos feridos era lento. Soldados
franceses, sangrando ou envoltos em ataduras, eram levados em macas para vagões
de trem utilizados anteriormente no transporte de gado bovino e cavalos. Os
alemães avançaram tão velozmente pela Bélgica e pelo norte da França que a
tomada de Paris parecia bastante provável. Entretanto, no campo de batalha do
norte da França, os soldados franceses, auxiliados por tropas britânicas,
resistiram firmemente. Paris estava a salvo.
Os feridos em Dover, John Lavery
Os exércitos
rivais então se atacavam no front ocidental (francês) sem que nenhuma das
partes obtivesse uma vitória decisiva. O avanço rápido da Alemanha nas
primeiras semanas de luta foi ficando cada vez mais lento até parar. As hostes
oponentes cavavam trincheiras e faziam delas seus escudos. Terreno – algumas
centenas de metros ou até menos – era adquirido a um custo enorme de mortes e
feridos, pois o exército contrário era capaz de descarregar maciçamente seu
poder de fogo sobre as tropas que avançavam. Os feridos eram logo substituídos
e parecia que os exércitos conseguiriam manter suas trincheiras quase
indefinidamente. Essa foi uma das razões para o prolongamento da guerra muito
além do esperado.
Soldados mortos, László Mednyánszky
As tropas, já
numerosas quando o conflito começou, tornaram-se ainda maiores. Em 1914, a maior parte das
nações europeias obrigava quase todos os seus homens jovens e de meia idade a
passar por um treinamento militar. Em guerras anteriores, havia sido impossível
enviar exércitos muito grandes para o campo de batalha, pois a tarefa de
cultivar e comprar a comida e depois transportá-la para os acampamentos estava
além da capacidade da maior parte das nações. Em 1914, no entanto, economias
mais produtivas possibilitavam que grande quantidade de homens fosse destinada
ao exército e que boa parte das mulheres fosse transferida de outros tipos de
trabalho para as fábricas de munições. Enquanto nas guerras napoleônicas um
país podia dispor de no máximo 12% de seu “produto nacional”, naquele momento
as principais nações podiam chegar a gastar quase 50% dele na guerra. As
modificações dos cem anos anteriores, que melhoraram o aproveitamento de
energia e mão de obra, permitiram que, nos meses iniciais do conflito, enormes
quantidades de pessoas desempenhassem as tarefas de produzir e manejar armas.
O número de mortos e feridos nos primeiros quatro meses de guerra foi muito mais alto do que o esperado. Dia após dia, milhares de parentes de soldados consternavam-se ao receber as notificações de morte, levadas por um mensageiro dos telégrafos, um carteiro, um pastor ou um padre. As famílias cujos filhos ainda lutavam no front sentiam-se ameaçadas. Soldados cujas vidas haviam sido poupadas em 1914 corriam ainda mais riscos em 1915, pois o fogo das artilharias e o matraquear das metralhadoras haviam se tornado ainda mais mortais.
Elswick, 1917:
Messrs Armstrong, Whitworth & Company.
John
Lavery
O número de mortos e feridos nos primeiros quatro meses de guerra foi muito mais alto do que o esperado. Dia após dia, milhares de parentes de soldados consternavam-se ao receber as notificações de morte, levadas por um mensageiro dos telégrafos, um carteiro, um pastor ou um padre. As famílias cujos filhos ainda lutavam no front sentiam-se ameaçadas. Soldados cujas vidas haviam sido poupadas em 1914 corriam ainda mais riscos em 1915, pois o fogo das artilharias e o matraquear das metralhadoras haviam se tornado ainda mais mortais.
BLAINEY,
Geoffrey. Uma breve história do século XX.
São Paulo: Fundamento Educacional, 2011. p. 51-55.
NOTA: O texto "A 1ª Guerra Mundial: Cronograma [Parte II]" não representa, necessariamente, o
pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a
construção do conhecimento histórico.
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