Joseph, Lawrence-Alma Tadema
Os faraós sempre apresentaram o
Egito como uma terra inexpugnável, numa espécie de mistificação que tinha a ver
com o poderio militar e com a autoridade religiosa de que eles gozavam. À
integridade do território, eles procuravam garantir castigando exemplarmente
aqueles que tentavam violá-la. Mas, a realidade era bem diferente. O Egito foi
sempre um país poroso, cuja prosperidade atraía seus vizinhos famélicos. No
Alto Egito, os planaltos desérticos eram cortados em todas as direções por
pequenos cursos d’água que conduziam ao vale do Nilo.
No Baixo Egito, os líbios haviam
se acostumado a se espalhar pelo delta. A leste, as zonas pantanosas eram
assombradas por populações marginais, e o “caminho de Hórus” ligava o Egito à
Palestina. Paradoxalmente, foi o lado do Mediterrâneo que permaneceu o menos
atraente para os visitantes.
Em tais condições, houve
permanentemente uma presença no seio da civilização do Vale do Nilo, sob
diferentes formas e em constante interinfluência.
Se as invasões provocaram
traumas, o Egito se acomodou mais ou menos às infiltrações, às imigrações involuntárias
ou provocadas, simplesmente porque o país sofria de uma falta crônica de mão-de-obra.
Ao contrário do Egito contemporâneo,
de demografia explosiva, sua população era pouco numerosa – e os faraós
insistiam em ser construtores infatigáveis. Eles com freqüência eram obrigados
a recrutar estrangeiros já instalados no Egito, ou trazidos à força para o país.
O episódio bíblico das doze tribos de hebreus encaminhadas para a construção de
uma cidade repousa portanto sobre a realidade.
Os estrangeiros não estavam
destinados apenas para a fabricação de tijolos, ou para serem chicoteados na
construção dos grandes monumentos faraônicos. Eles podiam, por sua competência,
atingir as mais altas funções. Assim, um semita foi vizir sob Amenófis III. Um
outro supervisionou a construção do templo funerário de Ramsés II. A história
de José tem portanto um pano de fundo autêntico. Os egípcios toleravam os
particularismos das comunidades estrangeiras. Pelo menos até um certo limite.
Se os judeus de Elefantina viram-se às voltas com a hostilidade dos habitantes,
não foi por causa de uma pulsão racista, mas sim porque eles pretendiam
sacrificar um cordeiro em uma cidade cuja divindade mais importante era um... carneiro!
Pascal Vernus. Estrangeiros
construíram o Egito. In: Revista História
Viva. Grandes temas, nº 46. p. 67.
NOTA: O texto "Presença estrangeira no Antigo Egito" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
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