Vista de Tampico, Tamaulipas. Litografia de Frédéric Mialhe
No tempo das lutas pela
independência na América espanhola, a palavra “liberdade” tinha diferentes
significados. Para as elites coloniais que liam os textos iluministas,
liberdade tinha principalmente uma dimensão política e econômica. Esse grupo
desejava autonomia para ampliar os seus negócios e atuar no comércio
internacional sem a intervenção da metrópole.
Para os escravos, liberdade
significava o fim da condição de cativo. Já para os índios, a palavra estava
associada à supressão dos tributos coloniais e ao fim do trabalho compulsório,
que havia dissolvido as comunidades originais ou alterado drasticamente seu
funcionamento.
As lutas pela emancipação na
América espanhola não conseguiram conciliar as diferentes visões de liberdade.
Os movimentos de independência contaram com a participação de índios e negros,
mas foram liderados pelos brancos, que já exerciam funções na administração
colonial ou atuavam no comércio interno ou externo. Por isso, os novos Estados
nacionais foram organizados para defender os interesses desses grupos
dominantes.
As independência não significaram
o fim do trabalho escravo na América hispânica. Muitos defensores da
independência política das colônias espanholas eram senhores de escravos, o que
explica a lentidão em abolir a escravidão em grande parte do território. A
maioria dos novos países adotou políticas gradativas para extinguir o trabalho
escravo antes de abolir definitivamente a escravidão.
A Venezuela proibiu a escravidão
em 1816 e a Colômbia em 1818. Contudo, nesses países os ex-escravos do sexo
masculino, com idade entre 14 e 60 anos, foram obrigados a prestar o serviço
militar. Aqueles que recusassem ficavam sujeitos à servidão. A abolição definitiva
nos dois países só ocorreu na década de 1850, assim como no Equador, na
Argentina e no Peru.
Após a independência, alguns
tributos coloniais cobrados das comunidades indígenas foram abolidos
formalmente, mas em alguns territórios essas medidas não foram respeitadas.
No processo de inserção dos novos
Estados nacionais na economia internacional, os índios tornaram-se mão de obra
barata para a agricultura e a mineração, atividades voltadas para a exportação.
As terras indígenas foram vistas como uma barreira à expansão agrícola; por
isso, muitas foram expropriadas e incorporadas pelos grandes proprietários
rurais.
Os direitos de cidadania tampouco
foram estendidos aos índios. Em muitos países hispano-americanos, os índios
foram excluídos da participação política e sua condição piorou após a
independência. Os movimentos de resistência indígena nos séculos XIX e XX quase
sempre foram derrotados ou obtiveram vitórias restritas.
Atualmente, segundo o Programa
das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), existem entre 40 e 50 milhões
de indígenas na América Latina, vivendo principalmente na Bolívia, no Peru, no
México e na Guatemala. A grande maioria é pobre, com baixos índices de
escolarização.
Apesar de as atuais políticas
democráticas reconhecerem a multiplicidade étnica das sociedades
latino-americanas e leis defenderem os direitos dos povos indígenas, ainda há
muito a ser feito para que esses direitos sejam efetivamente respeitados e
garantidos.
BRAICK, Patrícia Ramos. Estudar história: das origens do homem à era
digital. São Paulo: Moderna, 2011. p. 157-158.
NOTA: O texto "A situação de índios e negros na América hispânica pós-independência" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
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