"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

terça-feira, 2 de abril de 2013

Conquista da América II: A rapidez da conquista

A espada, a cruz e a fome iam dizimando
a família selvagem.
(Pablo Neruda, poeta chileno)

A Conquista foi iniciada desde a segunda viagem de Colombo (1493) e, por volta de 1550, estava praticamente concluída em suas linhas gerais.

Essa rapidez explica-se, em parte, pelo fato de a América ter-se revelado uma barreira entre a Espanha e a Ásia Oriental, onde os europeus buscavam especiarias, produtos de luxo e riquezas minerais. No afã de ultrapassar esse obstáculo, os espanhóis descobriram, exploraram e conquistaram ilhas e terras litorâneas continentais, onde se apoderaram de riquezas diversas, penetraram pelas bacias fluviais, seja em busca de uma passagem transcontinental até o Pacífico, seja para atingir ricas regiões dos planaltos do interior.

Impulsionados ou não pela sede de ouro e outras riquezas minerais - não podemos esquecer que a Conquista se enquadra na época do Mercantilismo e que a busca de metais preciosos fora uma das razões da expansão espanhola -, os conquistadores rapidamente dominaram as Antilhas e terras continentais.

[...]

Essas riquezas por vezes eram ilusórias porque se baseavam em lendas europeias transferidas para a América ou então criadas em um Novo Mundo que começava a se conquistar. Das Antilhas partiram para a Flórida e Bacia do Mississipi muitos conquistadores em busca da fonte da juventude; do México outros avançaram por terras dos atuais EUA procurando Cíbola (a região das Sete Cidades de Ouro). "Na América do Sul os mitos se multiplicam. Anos e anos se sucedem enquanto homens e mais homens perseguem o Eldorado. Por vezes é um homem, ou uma cidade (Manoa), ou uma lagoa (Parime), ou uma região (Omágua). Para livrar-se do intruso, o indígena não vê inconveniência em mentir e esticar o braço apontando falsas direções. Espanhóis [...] e estrangeiros [...] se desgastaram procurando o príncipe dourado [...] A bela lenda das amazonas foi importada, como outras, do Mundo Clássico e talvez os livros de cavalaria reviveram o mito [...] Na realidade, o mito resultou das casas incaicas onde se guardavam as Virgens do Sol [...] Como um reflexo da riqueza incaica surgiram as ilusões da Terra Rica, do César Branco, da Serra da Prata, do País dos Mojos, do País dos Caracaraís e do Grande Paititi [...]" (MORALES PADRÓN, F. Manual de Historia Universal. Tomos V e VI. Historia General de América. Madri: Espasa-Calpe, 1962. p. 312-313)

Não há dúvida de que a rapidez também decorreu da superioridade do equipamento bélico dos espanhóis, que era infinitamente superior ao dos indígenas. Esta superioridade se evidencia em três pontos essenciais:

* pelas armas de fogo (mosquetes, arcabuzes, pistolas e canhões), cuja utilização proporcionava tríplice vantagem: permitia combater à distância, provocava a morte ou a inutilização por ferimento do adversário, e acarretava o terror psicológico do indígena, que acreditava serem eles instrumentos usados por deuses ou seus representantes;
* pelo uso de armamentos defensivos (armaduras, couraças, capacetes e escudos) e ofensivo (lanças, espadas, punhais etc) feitos de aço; isso tornava o espanhol praticamente invulnerável diante do indígena, que combatia quase desnudo, e contribuía bastante para neutralizar a desvantagem numérica das hostes espanholas diante dos numerosos exércitos nativos;
* pelo emprego do cavalo, que dava ao branco uma extraordinária mobilidade e despertava o terror entre os ameríndios porque o animal era desconhecido na América. Acreditando, a princípio, que cavaleiro e cavalo formavam um único ser, o pânico do nativo explodia, paralisando-o, quando, ao desmontar, o cavaleiro se movia independentemente do cavalo.


A chegada de Cortés e a recepção de Montezuma. Artista desconhecido.


Os conquistadores foram também beneficiados pelas lendas e superstições religiosas dos indígenas, as quais por vezes chegaram até a divinização dos espanhóis. "Com efeito, a chegada dos brancos foi precedida, tanto no México como no Peru, por toda uma série de sinais e de profecias que asseguravam a chegada iminente de deuses... ou de calamidades." (ROMANO, R. Os Mecanismos da Conquista Colonial: Os Conquistadores. São Paulo: Perspectiva, 1973. p. 17.) A destruição de templos e palácios, no México e no Peru, devido a raios e incêndios, foi encarada como sinal do descontentamento dos deuses e como prenúncio de novos tempos.

"Mas ainda mais. Todo o Mundo Americano, na base de sua esfera religiosa, conheceu o mito de deuses civilizadores que, após haver estendido seus benefícios aos homens, desapareceram prometendo voltar. Isto nos ajuda a compreender como e por que a chegada dos homens brancos é percebida pelos índios através da rede do mito." (ROMANO, R. op. cit. p. 18.) A própria cruz conduzida por muitos conquistadores reforçou ainda mais essas crenças: era o símbolo de Quetzalcoatl entre os astecas e de Bochica no Planalto de Bogotá.

"Mas resta assinalar que a falência das religiões indígenas ajudou a penetração da cruz. Essa falência foi facilitada, também, pelo fato de que a autoridade religiosa e autoridade política estavam frequentemente confundidas em uma mesma pessoa física, acarretando a queda do poder leigo, o desmoronamento do poder religioso e dos valores que representava. Assim, o poderoso cimento que a religião deveria ter representado [...] se dissolvia e deixava penetrar de maneira formal e superficial a nova religião. Penetração fácil: os batismos se sucederam e se multiplicaram. (ROMANO, R. op. cit. p. 18.)

"[...] Chegou pela primeira vez em Campeche, o barco dos Dzules, brancos [...] E, com eles, vem o tempo em que os homens maias ingressaram no Cristianismo [...] Começou a entrar água na cabeça dos homens." (Livro de Chilam Balam de Chumayel. ROMANO, R. op. cit. p. 69.)

AQUINO, Rubim Santos Leão de et alli. História das Sociedades Americanas. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1980. p. 65-67.

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