Marcha pelos Direitos Civis, Washington
O problema negro - a escravidão - não foi o cerne da Guerra de Secessão. Lincoln, apesar de ter horror à escravidão, era reticente quanto à igualdade de direitos entre brancos e negros, chegando a dizer que: "Se pudesse salvar a União, sem libertar nenhum escravo, o faria."
Os negros, libertados durante a guerra civil, ficaram sem propriedade porque não houve reforma agrária nos EUA, e nem a União cumpriu o que havia prometido: 40 acres de terra e uma mula para cada família.
Quando o exército nortista abandonou o Sul, os negros que haviam obtido o direito de voto, sem nenhuma propriedade, ficaram sem respaldo e se espalharam pelos Estados Unidos à procura de trabalho, migrando para Norte e Oeste, onde havia escassez de mão-de-obra.
O sucessor de Lincoln, Andrew Johnson, procurou restabelecer no Sul governos estaduais semelhantes aos que ali existiam antes da guerra. Os líderes confederados foram anistiados e quase nada mudou politicamente nos estados do Sul. É necessário dizer que, logo após a vitória, a ocupação militar do Sul implicou a alforria de todos os escravos e a proibição do direito de votar a todos os ex-líderes confederados. Os governos sulistas passaram a ser dependentes dos votos negros e dominados por brancos favoráveis à União. A partir de 1877, o governo federal foi retirando a sua força militar do Sul, e as comunidades brancas foram recuperando seu poder. Nesse mesmo ano, os sistemas político, social e econômico do Sul eram semelhantes aos de antes da guerra, com uma única diferença: o negro era agora um trabalhador sem terra e não mais um escravo. No dizer de McKitrick "no esforço geral para reconstruir a estrutura desmantelada pela guerra civil e pela restauração, até as pequenas conquistas do negro - para não falarmos nos direitos sociais mínimos que ele adquirira [...]. - lhe foram sistematicamente retiradas". Os estados sulistas começaram a impor sistemas de segregação social e de abolição dos direitos civis dos negros. Mais ou menos no início do século XX, o processo de segregação do negro estava completado.
Os negros, quando queriam lutar por seus direitos civis, eram ameaçados pelas organizações terroristas que agiam implacavelmente no Sul, como a Ku-Klux-Klan.
Nos princípios do século XX, a mecanização da agricultura expulsou grandes massas de trabalhadores rurais negros para as cidades do Norte. Nessas cidades, ficavam segregados nos chamados guetos negros e ocupavam os serviços rejeitados pelos brancos. Os negros eram discriminados nos seus locais de trabalho, nos jardins públicos etc. Mas assim mesmo a vida nas cidades do Norte era melhor do que do Sul, onde eram surrados e ate linchados.
A situação dos negros nos guetos do Norte foi magistralmente descrita por Hughes, um poeta negro, nos seguintes versos:
"Que fazer?
Aqui ao lado do inferno
Está o Harlem
Que recorda as eternas mentiras
As eternas patadas no traseiro
O eterno sed pacientes
Que nos disseram tão amiúde
Por certo que o recordamos
Porém quando o garoto do bazar da esquina
Nos diz que o açúcar voltou a subir dois centavos
E o pão um centavo
E que há novas taxas para o cigarro...
Então recordamos o emprego que jamais tivemos
Que jamais podemos ter
E que agora não temos
Porque somos gente de cor
Então ficamos aí
Ao lado do inferno
No Harlem
E olhamos de costas o mundo
E nos perguntamos o que vamos fazer
Com todas estas recordações aí
Diante de nós."
Com a Primeira Guerra Mundial, que mobilizou toda a economia e força de trabalho americanas, o negro teve a sua primeira oportunidade de ascensão "à condição de operário e de cidadão". Não como eleitor, mas como soldado.
Finda a guerra, o negro perdeu todas as posições conquistadas.
Durante a grande crise econômica de 1929, devido ao desemprego em massa, os brancos passaram a ocupar os postos subalternos que antes recusavam. Os negros foram maciçamente desempregados e o número de negros desocupados era proporcionalmente maior ao de brancos.
A Segunda Guerra Mundial deu ao negro uma nova chance mais igualitária na luta e no trabalho. O negro comportou-se bravamente na guerra. Era a única forma de recuperar a dignidade que lhe haviam tirado. A Divisão Búfalo do exército americano, composta somente de negros, foi uma das melhores da Segunda Guerra Mundial.
Nos anos do pós-guerra recrudesceu a violência contra o negro altivo, que havia participado da guerra e trabalhado na grande indústria. A partir daí, os negros americanos se organizaram melhor do que nunca, para a conquista da igualdade social e dos direitos civis. Os negros e muitos brancos também haviam tomado consciência da injustiça que significa a segregação racial.
O novo negro, que lutava em grandes manifestações pelos seus direitos civis em 1960, tinha como motivação a independência das ex-colônias africanas, onde os negros derrotaram os ex-colonizadores brancos. O negro americano, com isso, sentiu-se forte para lutar contra a segregação. Segundo Darcy Ribeiro, "o negro americano passou a constituir a vanguarda do movimento revolucionário mais ativo dos Estados Unidos de nossos dias. Toma, desde então, em suas mãos, a luta pelos seus próprios direitos..."
Durante a década de 70 houve uma série de insurreições negras contra a segregação racial. Mas não só de insurreições passou a ser feita a luta dos negros. Utilizaram-se também de passeatas e boicotes às empresas que promoviam a segregação racial.
Devido à luta dos negros pelos direitos civis, o governo federal americano em 1966 elaborou e colocou em prática a Lei dos Direitos Civis, proibindo a segregação racial. Mas, na verdade, os direitos civis dos negros ainda não estão assegurados. No Sul a lei praticamente não é cumprida, e no Norte a comunidade negra é marginalizada econômica e socialmente.
CÁCERES, Florival. História da América. São Paulo: Moderna, 1986. p. 113-115.
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