"Vênus de Wilendorf": estatueta de pedra do Paleolítico em que a mulher, provavelmente pela primeira vez, aparece como tema.
A princípio, possivelmente o cultivo da terra foi uma atividade praticada pelas mulheres, assim como a coleta de frutos e raízes comestíveis, de que se teria originado a agricultura, e talvez a domesticação dos animais. A caça era atividade masculina, tendo sido por muito tempo o principal meio de subsistência da comunidade. Porém, mesmo depois que a caça teve diminuída a sua importância econômica, em algumas comunidades esse fato não correspondeu ao seu declínio em prestígio social e político. Na realidade, a contribuição da caça, atividade praticada pelos homens, era ocasional, enquanto que a coleta de frutos e raízes, atividade feminina, era muito mais regular. Já havia, portanto, na comunidade primitiva uma divisão natural do trabalho. As mulheres, tanto quanto os homens, asseguravam o sustento do grupo, embora cuidassem também das tarefas domésticas.
[...]
Na comunidade primitiva, as mulheres não viviam "fechadas dentro de casa" - na verdade não havia casas individuais para uma só família: os abrigos eram habitações coletivas. "Os artesanatos neolíticos foram apresentados como indústrias domésticas. Não obstante, não constituem tradições individuais, mas coletivas. A experiência e o conhecimento de todos os membros da comunidade são constantemente reunidos. [...] Todas as mulheres da aldeia trabalham juntas, conversando e comparando seu trabalho; chegam a ajudar-se mutuamente. A ocupação é pública, mas as regras resultam da experiência comunal." (GORDON CHILDE, V. A evolução cultural do homem. Rio de Janeiro: Zahar, 1971. p. 103.)
O trabalho era realizado coletivamente, tendo nele homens e mulheres uma mesma importância. A mulher não era apenas reprodutora, embora esse papel fosse importante e necessário para a própria sobrevivência da comunidade: assegurar o crescimento do grupo era uma necessidade objetiva da comunidade primitiva - donde as práticas usuais da poligamia e da endogamia, dos casamentos entre parentes (permitidos a princípio) etc.
Não se deve, porém, idealizar a época "primitiva". Tais práticas não eram, propriamente, uma opção individual, mas o resultado das condições da forma de organização econômica da sociedade, a fim de assegurar o crescimento da espécie, principalmente com o início do pastoreio e da agricultura, que permitiram empregar o trabalho das crianças, ao contrário da caça, atividade dos adultos. Ao mesmo tempo, o pastoreio e a agricultura, possibilitando fazer reservas, tornaram possível o aumento da população.
A importância da mulher deveu-se também à sua condição de criadora, fixadora e transmissora de hábitos culturais, da experiência coletiva acumulada pelo grupo. Num certo sentido, pode-se dizer que a Revolução Neolítica - passagem à agricultura - foi obra das mulheres, assim como a domesticação dos animais (origem da pecuária), a fabricação da cerâmica, a fiação e a tecelagem (linho e algodão), a medicina caseira etc. Além disso, transmitiram esses conhecimentos às novas gerações, fixando e difundindo hábitos culturais.
Inicialmente, na comunidade primitiva, a mulher ocupava uma posição de igualdade e mesmo de superioridade em relação ao homem. Devido aos casamentos múltiplos, a linha de parentesco era dada pela mãe, isto é, a descendência se contava em linha feminina - é o direito materno (matriarcado). Quando, mais tarde, correspondendo ao aparecimento da propriedade privada dos rebanhos e, depois, da terra, o direito materno foi derrubado, a linha de descendência passou a se fazer pelo pai, a fim de se garantir o direito dos filhos à herança (patriarcado). Começou-se, então, a exigir da mulher a virgindade, antes do casamento, e a fidelidade conjugal, depois dele. [...]
A monogamia foi a condição imposta, principalmente à mulher, para garantir ao homem a certeza da paternidade e legitimar os filhos com direito à herança (partilha dos bens após a morte do pai).
O rompimento dos laços conjugais - o divórcio - que antes podia ser feito por qualquer um dos cônjuges (homem ou mulher), em algumas sociedades passou a ser privilégio do homem. Idealizou-se o papel biológico feminino: a maternidade foi "santificada".
Tais modificações ocorriam no nível jurídico-ideológico da sociedade, porquanto o papel econômico da mulher continuava tão importante quanto o do homem, por exemplo na agricultura, base da maior parte das sociedades antigas.
A opressão da mulher não foi produto da mente "má" dos homens individualmente, mas uma exigência objetiva da propriedade privada dos meios de produção, quando a mulher também se tornou um objeto do homem - tal qual a terra, o gado, os escravos etc.
AQUINO, Rubim Santos Leão de et all. História das sociedades: das comunidades primitivas às sociedades medievais. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio, 2008. p. 111-113.
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