Acampamento indígena, Jules Tavernier
E por acaso alguém escuta o velho chefe Seattle? Os índios estão condenados, como os búfalos e os alces. Quem não morre de tiro morre de fome ou de pena. Da reserva onde definha, o velho chefe Seattle fala na solidão sobre explorações e extermínios, e diz sabe-se lá o quê sobre a memória de seu povo circulando pela seiva das árvores.
Zune o Colt. Como o sol, os pioneiros brancos marcham rumo ao oeste. Uma luz de diamante os guia lá das montanhas. A terra prometida rejuvenesce aquele que lhe crava o arado para fecundá-la. Num piscar de olhos brotam ruas e casas na solidão habitada por cactos, índios e serpentes. O clima, dizem, é tão, tão sadio, que para se inaugurar os cemitérios o único remédio é derrubar alguém a tiro.
O capitalismo adolescente, atacante guloso, muda o que toca. Existe o bosque para que o machado o derrube e o deserto para que o atravesse o trem; o rio vale a pena se tem ouro e a montanha se contém carvão ou ferro. Ninguém caminha. Todos correm, urgentes, impedidos, atrás da errante sombra da riqueza e do poder. Existe o espaço para que o derrote o tempo, e o tempo para que o progresso o sacrifique em seus altares.
GALEANO, Eduardo. Memória do Fogo: As caras e as máscaras. Porto Alegre: L&PM, 2013. p. 459.
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