Ao chefiar uma missão científica
no Peru, em julho de 1911, Hiram Bingham – professor de História das Américas na Universidade de
Yale – revelou ao mundo a existência de Machu-Picchu, “a cidade perdida dos Incas”.
Vista de Machu Picchu
Foto: Martin St-Amant
Situada em uma das mais
inacessíveis regiões dos Andes, entre os rios Apurimac e Urubamba, essa cidade
permanecera a salvo dos conquistadores espanhóis, protegida pelo canyon de Urubamba, com cerca de 30 quilômetros de
extensão e cerca de 1 500
metros de profundidade. Geleiras, selvas equatoriais e
poderosas correntes completavam o quadro de baluartes naturais que a
conservaram ignorada por longo tempo.
O rio Urubamba corre entre duas
cadeias de montanhas, a cordilheira de Urubamba e a de Vilcabamba. Nesta última,
encontra-se Machu Picchu (“Velho Pico”), de onde se tem uma visão panorâmica
tanto do nascer como do pôr-do-sol. Esta posição privilegiada foi aproveitada
pelos incas para os fins religiosos desse santuário, dedicado ao culto solar, e
para a finalidade científica de registrar o movimento solar, com base no qual
se determinavam a duração das estações e as divisões do dia.
Templo do Sol
Foto: David Stanley
Se, vista do alto, Machu Picchu dá
uma impressão de harmonia, isso se percebe que cada uma de suas partes está
perfeitamente integrada ao todo, constituindo uma unidade indeformável. Essa
harmonia não se manifesta somente no povoado em si mas, sobretudo, em sua adequação
ao meio ambiente, magnífico exemplo de integração da obra do homem com a
natureza.
Da mesma forma que em Cuzco e
outras cidades incas, os recintos fechados abrem-se por meio de portas e
janelas conforme as exigências do clima tropical. O problema de escassez de água
foi solucionado com a construção de um sistema de canais para transportá-la até
grandes cisternas, onde era armazenada, sem que houvesse qualquer desperdício. Os
telhados são muito mais inclinados do que as construções de outras áreas, em
virtude das fortes chuvas que ocorrem nessa região anualmente durante pelo
menos seis meses. O problema apresentado pelos terrenos íngremes, de difícil
aproveitamento para a agricultura, foi resolvido com a construção de vastas áreas
de terraços, enquanto os desníveis urbanos e viários eram solucionados com a
construção de rampas e escadas.
Escadarias no setor residencial
Foto: Colegota
A construção de Machu Picchu é,
indubitavelmente, uma obra dos arquitetos cusquenhos do período de apogeu da
civilização Inca. Inteiramente construída em granito branco, a cidade é
mencionada por cronistas espanhóis da época da conquista como uma lendária
cidade de mármore. Em seu majestoso conjunto arquitetônico, formado por mais de
duzentos edifícios, destacam-se o observatório solar, situado no ponto mais
alto da cidade, e dois grandes templos: o Principal e o “das Três-Janelas”.
Com paredes de quase 4 metros de altura, o
Templo Principal apresenta como principal peculiaridade o fato de as
extremidades de suas fachadas este e oeste serem inclinadas para fora. Um de
seus lados é aberto e desemboca em uma praça, conhecida como Praça Sagrada. No
lado ocidental dessa praça ergue-se um edifício semicircular, com 3 metros de diâmetro por 2,5 metros de altura,
construído com grandes blocos de granito talhados de modo a formar um semicírculo
quase perfeito. Este notável trabalho de corte e modelagem da pedra atesta o
alto nível atingido pela arquitetura inca, embora as técnicas de construção de
torres circulares tenham-se desenvolvido tardiamente.
Templo das Três Janelas
Foto: McKay Savage
Situado no extremo oriental da
Praça Sagrada, o Templo das Três Janelas tem uma estrutura semelhante à do
Templo Principal. Seus muros também são feitos com blocos de granito branco,
alguns de formato irregular, mas todos perfeitamente trabalhados.
Os edifícios de Machu Picchu são
bastante sólidos, construídos a partir da justaposição de grandes blocos de
granito, maiores na base e menores na parte superior, sem a utilização de
qualquer tipo de massa para ligá-los. Considerando-se que os incas não possuíam
ferramentas de ferro ou aço, pode-se avaliar o esforço despendido na construção
desses edifícios, em que foram utilizados muitas vezes monólitos pesando até 3
toneladas.
Supõe-se que uma regra observada
pelos incas na construção de suas cidades mais importantes era a presença de um
templo do Sol, uma casa para as akllas
e um palácio real. Em Machu Picchu, porém, somam-se a esses edifícios grandes
construções de outros tipos.
Entre os restos humanos
encontrados (185 esqueletos), destaca-se o número desproporcional de esqueletos
femininos (109), o que confirma a suposição de que Machu Picchu teria servido
de refúgio para as akllas de Cuzco após
a chegada dos espanhóis.
Templo da Lua
Foto: Martin St-Amant
O segredo de Machu Picchu foi
muito bem guardado pelos imperadores incas, que preferiram transferir a sede do
império da cidade de Cuzco para povoados como Victos e Vilcabamba, a fim de
evitar que os espanhóis descobrissem essa cidade perdida nas selvas, sobre a
qual ainda existem muitas controvérsias. Alguns a consideram uma fortaleza,
outros um centro de trabalho feminino ou um santuário.
Com base nos estudos do sociólogo
Mircea Elíade, Luís Valcárcel, autor de várias obras sobre a civilização Inca,
analisa a construção de Machu Picchu de acordo com o pensamento mítico “primitivo”:
“Ao edificar o templo, (o homem) reproduzia a imagem da montanha sagrada; e ao situa-lo
estava, ao mesmo tempo, marcando um centro que correspondesse ao umbigo do
mundo, ponto de partida de toda criação. Colocado o santuário no alto da
montanha, era uma imagem elaborada pelo homem como símbolo do centro e do eixo
cósmicos. Tudo que realizasse no templo repercutiria em toda a paisagem. Ao
construir terraços, os lances de escadas simbolizavam os distintos níveis do
cosmo, a comunicação entre o céu, a terra e o subsolo. Ao traçar os canais e
abrir os poços, domesticava a água, fazendo-a manifestar-se somente em sua face
positiva. O rio também era canalizado. Desta maneira a técnica não só servia ao
lado profano, como também as sagrado”.
HISTÓRIA DAS CIVILIZAÇÕES. São Paulo: Abril Cultural, 1975. p. 26 e
28. Volume 3.
NOTA: O texto "Machu Picchu, a cidade perdida dos Incas" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
NOTA: O texto "Machu Picchu, a cidade perdida dos Incas" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico.
Nenhum comentário:
Postar um comentário