Aqueduto da Carioca, Leandro Joaquim
Embora ligado aos espanhóis por laços de sangue, pois descendia pelo lado materno de família espanhola, Salvador Correia de Sá e Benevides, nomeado governador do Rio de Janeiro pela terceira vez (1659-1660), desfrutava de grande prestígio, tanto assim que também recebeu a jurisdição sobre toda a costa do sul. Em conseqüência, seus poderes não ficavam subordinados à autoridade do governador-geral residente na Bahia. Sá e Benevides era um oligarca típico, grande proprietário, e contra ele existem inúmeros depoimentos negativos.
Logo nos primórdios de sua
administração solicitou ao Senado da Câmara a criação de um imposto predial. A
receita proveniente dessa nova tributação visava atender despesas com o aumento
da tropa, subordinada ao governador. Além do mais, a receita apurada também se
destinava a evitar atrasos no pagamento da guarnição, o que ocorria com freqüência.
Como ainda hoje acontece,
apareceram propostas de isenção ao imposto em discussão, sendo tal benefício
concedido às ordens religiosas dos jesuítas, dos carmelitas e dos beneditinos.
Diante das controvérsias
surgidas, como alternativa, a Câmara aprovou a cobrança de impostos sobre a
venda de cachaça e de carne. Ora, essa tributação indireta atingia os setores
populares da sociedade, ao passo que o imposto predial incidia apenas sobre os
proprietários de imóveis. Todavia, após alguns meses, permanecia baixa a
arrecadação com a cobrança dos impostos indiretos sobre a cachaça e a carne, o
que levou o governador a ordenar que também fosse recolhido o imposto predial.
Em seguida partiu para a
capitania de São Paulo, a fim de verificar como andava a mineração de ouro,
tendo deixado Tomé Correia de Alvarenga, seu primo, para substituí-lo e
designado outro parente para presidir o Senado da Câmara.
No dia 8 de novembro de 1660
explodiu a revolta, liderada por Jerônimo Barbalho Bezerra, filho de Luís
Barbalho Bezerra, que governara o Rio de Janeiro (1643-1644) e se destacara na
luta contra os holandeses.
Por que a revolta?
Basicamente por causa do peso da
tributação estabelecida. A isso se juntou o fato de o governador favorecer
abertamente seus parentes, arrivistas e sem escrúpulos, ele próprio sendo
acusado de tirania, de peculiato e de manter ligações escusas com donos de
casas de jogo. Além do mais, os Sá e Benevides tinham como aliados os jesuítas,
contra os quais existiam fortes animosidades porque eram defensores da
liberdade dos índios.
O governador interino foi deposto
e recolhido preso à fortaleza de Santa Cruz, após fracassar sua tentativa de se
asilar no mosteiro de São Bento. Em meio ao tumulto, realizaram-se eleições
para escolha de novos integrantes do Senado da Câmara (ou Câmara Municipal) não
vinculados à família ou à clientela dos Benevides. Nomeou-se governador
Agostinho Barbalho Bezerra, irmão do líder dos sublevados (8 de novembro de
1660).
Contando com o apoio da guarnição
militar, os revoltosos enviaram para Portugal muitos dos aliados do governador
Salvador Correia de Sá e Benevides.
A população revoltada chegou a
saquear imóveis dos Correia de Sá e, quando o Senado da Câmara descobriu
manobras conciliatórias do recém-eleito Agostinho Bezerra, destituiu-o do cargo
e assumiu o governo da cidade, em fevereiro de 1661.
Contudo, Salvador Correia
habilmente retornou ao Rio de Janeiro, quando pôde contar com a ajuda de forças
militares vindas do reino. De surpresa, invadiu a cidade e reconquistou o poder
em abril de 1661.
De imediato, designou o
desembargador Antônio Nabo Pessanha para abrir devassa, sendo apontados Jerônimo
Barbalho Bezerra e Jorge Ferreira Bulhões como chefes da revolta. O primeiro
foi condenado à morte e, a 10 de abril de 1661, enforcado no Largo do Polé,
hoje Praça XV de Novembro. Em seguida, como prática usual da justiça colonial,
foi decapitado a machadadas, tendo a cabeça ficado exposta no pelourinho
existente próximo à forca.
Outros participantes da revolta
foram postos a ferros e ficaram presos por alguns anos em presídios de
Portugal, até serem perdoados e voltarem ao Brasil. A exceção foi Jorge
Ferreira Bulhões, que, devido a maus-tratos, faleceu na prisão de Limoeiro.
No entanto, a corte havia
designado outro governador, e sua carta de nomeação era dirigida a Agostinho
Barbalho Bezerra (1º de julho de 1661), o que evidenciava o enfraquecimento político
do velho oligarca.
Como Pedro de Melo assumiu o
cargo somente em 29 de abril de 1662,
“Salvador aproveitou esse prazo
para realizar um dos seus projetos: a construção de um barco de grandes proporções
(o maior do mundo, diziam): o Padre Eterno – que deu nome à ponta do ‘Galeão’,
na Ilha do Governador. Mas não ousou impor novamente os tributos, e não
conseguiu antes de alguns anos levantar o seqüestro que fora imposto às suas
propriedades pelos oficiais da Coroa [...] Salvador nunca mais voltou ao Brasil
[...] Mais tarde [...] obteve para os seus filhos a outorga de Capitanias na
antiga de São Tomé (Paraíba do Sul); aí fundaram-se as Vilas de São Salvador de
Campos (hoje cidade deste último nome) e de São João da Barra.” (BUARQUE DE
HOLANDA, Sérgio. História geral da
civilização brasileira: A Época Colonial. Tomo I, v. 2. São Paulo: DIFEL,
1985. p. 17-18)
AQUINO, Rubim Santos Leão de [et
all]. Sociedade brasileira: uma história
através dos movimentos sociais. Rio de Janeiro: Record, 2008. p. 292-294.
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