Em 1516, um navio afundou no litoral catarinense, e alguns
sobreviventes passaram a habitar a região, fazendo amizade com os guaranis. Os
índios falaram a um dos náufragos, o português Aleixo Garcia, da existência de
grandes cidades com ouro na região onde o sol se põe e o levaram até as
imediações de Chuquisaca, na Bolívia, onde obteve um grande saque em objetos
preciosos. A incursão de Garcia, saindo de Santa Catarina e chegando aos
limites do Império inca, só foi possível graças a uma grande via terrestre, de
nome Peabiru.
Também chamado de Peabiyu, Piabuiu, Caminho de São Tomé ou
Sumé, este sistema de trilhas, anterior à chegada dos portugueses, facilitou a
conquista e exploração do Sul do país durante o período colonial, e vem
despertando grande interesse turístico e histórico em nossos dias. O nome
Peabiru é de origem tupi-guarani e significa "caminho forrado",
"caminho batido", entre outras possíveis traduções. Com uma largura
média de um metro e profundidade de quarenta centímetros, era forrado por vegetação
rasteira, impedindo o crescimento de grandes arbustos e evitando o fechamento
natural das vias.
Seu trajeto total é calculado atualmente em cerca de 3 mil
quilômetros, cujas trilhas passavam pelos estados brasileiros de Santa
Catarina, São Paulo, Paraná e Mato Grosso do Sul e atingiam o centro-norte do
Paraguai. O Peabiru possuía cinco rotas, a mais importante estendendo-se entre
Assunção e São Vicente, atingindo a região dos rios Tibagi e Piqueri no Paraná.
A segunda via partia de São Vicente e chegava ao rio Paranapanema, seguindo até
o rio Ivaí; a terceira saía de Cananéia em direção ao vale do Tibagi. Outra
envolvia o interior catarinense, partindo do rio Itapocu até chegar às
proximidades do planalto e encontrar o ramal paulista. A última via, o ramal
sul, atingia o vale do rio Uruguai.
O sistema de trilhas do Peabiru facilitou a conquista e a exploração do Sul no período colonial. Trecho calçado de ramal do Peabiru..
Além de Garcia, muitos exploradores dos séculos XVII e XVIII
se aventuraram pelo Peabiru. [...]
Religiosos também trilharam o Peabiru, como o jesuíta
Antônio Ruiz de Montoya no século XVII, facilitando suas missões de catequese.
[...] Ironicamente, as vias serviam tanto para ajudar os jesuítas a montar
missões paranaenses [...] quanto para facilitar a penetração dos bandeirantes
que as destruíram, especialmente a expedição de Raposo Tavares, em 1628.
[...] Atualmente, os principais pesquisadores tentam
descobrir a autoria e os motivos da construção dos sistemas de caminhos. Muitas
teorias foram criadas [...]. Uma das mais conhecidas credita aos incas a
autoria dos caminhos brasileiros.
Sem maior respaldo entre os acadêmicos atuais, esta
interpretação é enfraquecida perante dois pontos básicos. O primeiro é que não
existem vestígios descobertos por escavações arqueológicas [...] atestando a
presença inca no Brasil. [...]
Outra constatação que enfraquece a suposta origem inca dos
caminhos brasileiros é uma comparação física entre os dois sistemas viários.
Enquanto os caminhos encontrados no Brasil utilizavam técnicas extremamente
simples, os construídos pelo Império inca eram muito complexos e sofisticados,
possuindo canaletas, pontes, fortificações, sistemas de abastecimento e, é
claro, pavimentação e calçamento em grande parte das vias.
A única escavação arqueológica relacionada ao Peabiru foi
efetuada em 1970 por especialistas da Universidade Federal do Paraná (UFPR). No
município de Campina da Lagoa, foram descobertos restos do caminho original.
Segundo estimativas do arqueólogo Igor Chmyz, a estrada remontaria entre os
anos 400 e 800 da nossa era. Uma grande quantidade de vestígios indígenas foi
descoberta ao longo dos caminhos, entre os quais aldeias e túmulos,
especialmente da cultura itararé. Ao que tudo indica, o Peabiru foi
originalmente construído por índios brasileiros antes de Cabral, mas as razões
de tamanho esforço ainda são ignoradas.
[...]
Fascinando as novas gerações, o Peabiru vem sendo motivo
central de estudos turísticos, eventos acadêmicos, explorações ecológicas e
muitas publicações. Rotas já bem conhecidas dos turistas, como o caminho de
Itupava e Graciosa, ambos no Paraná, Monte Castelo e Garuva, estes dois em
Santa Catarina, passaram a ser consideradas antigas vias ou ramais do Peabiru
que foram pavimentadas posteriormente pelos colonos e erroneamente denominadas
de "caminhos dos jesuítas". [...] Resta aos pesquisadores futuros a
missão de encontrar respostas baseadas em análises de documentos coloniais e
principalmente em escavações arqueológicas credenciadas pelo IPHAN, bem como a
preservação do que sobreviveu dessa importante faceta do patrimônio cultural
brasileiro.
Johnni Langer. Caminhos ancestrais. In: Revista
Nossa História. Ano 2. n. 22. p. 20-24.
Oi Pr. sou sua seguidora. Seu blog é especial fornece muitos dados bacanas, parabéns.
ResponderExcluirAbços
www.claudilicearagao.blogspot.com
Muito obrigado pelas palavras. Abraços.
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