A refeição da tarde, François
Boucher. As mulheres são retratadas como mães e figuras sacralizadas no
ambiente familiar. Matrimônio e maternidade exigiam postura mais equilibrada das
mulheres
Romance epistolar, com narrativa
desenvolvida a partir de cartas trocadas entre os personagens, A Nova
Heloísa marcou outro momento dos "romances filosóficos", com
novas opiniões sobre o feminino. Nele, as mulheres não foram descritas apenas
pelo ângulo das "paixões". O "belo sexo" passava a ser
relacionado também a uma ideia de virtude, que estava estreitamente ligada a
três pilares: à virgindade na juventude - afinal, "o amor nas moças é
indecente e escandaloso e apenas um esposo autorizaria um amante" -, ao
matrimônio e à maternidade. Segundo Rousseau, quando adulta, a mulher deveria
saber qual é o seu lugar. A "mulher virtuosa" seria a esposa casta e
submissa e a mãe que prepara os filhos para serem educados pelos homens: "Mas
há um longo caminho dos seis anos aos 20; meu filho não será sempre criança e,
à medida que sua razão comece a nascer, a intenção de seu pai é de realmente a
deixar exercer. Quanto a mim, minha missão não vai até lá. Alimento crianças e
não tenho a presunção de querer formar homens. Espero, disse olhando seu
marido, que mãos mais dignas venham a se encarregar desse trabalho. Sou mulher
e mãe, sei manter-me em meu lugar. Ainda uma vez, a função de que estou
encarregada não é a de educar meus filhos, mas de prepará-los para serem
educados".
Essas opiniões novamente se
refletiram na caracterização das próprias personagens. Se nos romances
anteriores à obra de Rousseau as heroínas não foram pensadas para viver a
maternidade e o matrimônio, e sim para deixarem transparecer "os efeitos
das paixões", na Nova Heloísa a situação se inverte.
Neste romance, as personagens estão envolvidas com suas futuras obrigações de
mãe e esposa durante quase toda a narrativa.
De Montesquieu a Rousseau, os
"romances filosóficos" estiveram longe de propagandear uma
emancipação feminina. Suas personagens bem demonstraram isso. Apaixonadas ou
virtuosas, as mulheres foram sempre vistas nas obras como seres inferiores aos
homens, tanto em sua capacidade psicológica quanto nos seus direitos perante a
sociedade. A situação era bem difícil: se ousassem expor seus sentimentos,
seriam encaradas como escravas de suas paixões. Se optassem por não
abraçar a maternidade e o matrimônio, estariam se afastando da virtude. Mas,
apesar de tanta resistência, as mulheres, mesmo vivendo em tal contexto,
conquistaram importantes avanços. E continuam conquistando. Apaixonados e
virtuosas.
Renato Sena Marques. As
perseguidas. In: Revista de História da Biblioteca Nacional. Ano 7
/ Nº 79 / Abril 2012. p. 48-51.
Nenhum comentário:
Postar um comentário