O apóstolo Paulo escreve aos
coríntios: "A própria natureza não vos ensina que é uma desonra para o
homem usar cabelo comprido? Ao passo que é glória para a mulher uma longa
cabeleira, porque lhe foi dada como um véu". Tudo está dito: a
"natureza" dita a honra que comanda o comprimento dos cabelos de
acordo com os sexos. Deus nada mais faz além de seguir as regras criadas por
ele mesmo. Do mesmo modo os fiéis.
A diferença dos sexos é marcada
pela pilosidade e seus usos: os cabelos para as mulheres, a barba para os
homens. Os cabelos são considerados, com frequência, signo da efeminação. As
épocas andróginas deixam-nos crescer: como durante o romantismo ou nos anos
posteriores a 1968. Nas empresas, nessa época, os "cabelos longos"
eram censurados e os jovens ameaçados de exclusão, ou efetivamente despedidos,
se persistissem em não cortá-los. Os conflitos foram frequentes a esse
respeito.
A virilidade se afirma
frequentemente pelo crânio raspado; foi assim na Roma antiga, e posteriormente
cristã. Paulo preconiza o véu para as mulheres, mas não para os homens, que, ao
contrário, devem cortar os cabelos: "É uma desonra para o homem usar
cabelo comprido". Os guerreiros trazem o crânio liso. Os neonazistas fazem
disso uma proclamação de virilidade.
A barba é outra coisa. Pode ser
um sinal de virilidade. Molière fala da "potência da barba". "A
barba é onipotente", diz Arnolphe na L' École des femmes. A
santa que quer conservar a virgindade pede a Deus para lhe fazer crescer pelo
no queixo: a "santa barbuda" se preserva adotando a identidade do
outro sexo.
Há um simbolismo viril da barba.
Ela significa potência, calor e fecundidade, coragem (a juba dos leões) e
sabedoria. Deus Pai é representado barbudo, como Abraão, seu submisso. A barba
mostra a ancianidade do homem, sua anterioridade com relação à mulher segundo
Clemente de Alexandria. Ela representa a idade, a duração fundadora, o tempo. A
paternidade. Mas ela deve ser domesticada. No século IV, os Pais da Igreja
combatem "os monjes barbudos", principalmente os discípulos de um
certo Eustátio de Sebaste, que prega um ascetismo rigoroso, o abandono da
sexualidade, e preconiza deixar crescer barba e cabelos. A indiferenciação da
cabeleira encobre o desejo de indiferenciação sexual. Assim ocorreu com o
unissex apregoado nos últimos trinta anos do século XX por nossos cabeleireiros
urbanos, o que hoje em dia já saiu de moda.
PERROT, Michelle. Minha
história das mulheres. São Paulo: Contexto, 2013. p. 52-53.
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