"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

segunda-feira, 21 de março de 2011

Os jovens e a Primeira Guerra Mundial

Soldados em uma trincheira durante a Primeira Guerra Mundial

[Texto 1] Muitos historiadores têm chamado a atenção para a atmosfera que por toda a Europa em 1914 promovia uma mentalidade bélica, e para a excitação gerada pela declaração de guerra. Em agosto de 1914, os jovens clamavam por serem convocados. Não só na Alemanha, mas também na Grã-Bretanha, na França e na Rússia, considerava-se que a guerra oferecia uma fuga pitoresca de uma vida aborrecida, dando oportunidade ao heroísmo individual e aos atos de rebelde bravura. Nas décadas anteriores a 1914, a educação se difundira por toda a Europa, e com ela chegaram os jornais populares e a ficção romântica escapista. A guerra foi popularizada por essa literatura como uma força positiva que podia promover a disciplina, a lealdade e a camaradagem. Os jovens liam contos épicos sobre feitos heróicos na fronteira noroeste, sobre lutas na floresta para disseminar a civilização e o cristianismo, e sobre batalhas contra os índios nas fronteiras do oeste selvagem. [...]

Ao mesmo tempo, a imprensa popular tinha um tom xenófobo e apressava-se em promover os interesses do governo nacional em face dos desafios estrangeiros. As teorias da evolução e as noções populares a respeito da sobrevivência dos mais aptos derramavam-se sobre o pensamento nacionalista. Os países precisavam expandir sua influência, ou entrariam em decadência. As nações brancas deviam levar as luzes para os zulus, os hindus e os chineses, e o poder exercido sobre povos não-europeus acrescia prestígio e status perante outras grandes potências. Havia uma competição aguda entre todas as grandes potências europeias pela influência e domínio sobre o mundo menos civilizado, por motivos tanto políticos quanto econômicos. Como comentou em 1901 lorde Curzon, vice-rei britânico na Índia, posteriormente ministro do Exterior: "se perdermos [a Índia], passaremos diretamente a uma potência de terceira categoria". E era apavorante demais a expectativa das consequências de uma perda tão catastrófica do status de grande potência. [...]

Os países entraram em guerra porque acreditavam que podiam conseguir melhores resultados por meio da guerra do que por negociações diplomáticas, e achavam que, se permanecessem de fora, seu status de grandes potências seria gravemente abalado. Esse foi seu maior equívoco. O balanço final em 1918 mostrou o quão errados estavam naquele momento, o status de todas as maiores potências da Europa se havia reduzido substancialmente e praticamente nenhum dos objetivos das elites governantes europeias se concretizara. Ruth Heing. As origens da Primeira Guerra Mundial. São Paulo: Ática, 1991. p. 65-70.

[Texto 2] A Primeira Guerra Mundial fez muitas vítimas, entre elas muitos jovens, civis e militares. Leia o poema do soldado L. S. Flint:


Os jovens do mundo
Foram condenados à morte.
Eles foram convocados a morrer
Pelo crime dos seus pais.

Os jovens do mundo
Os frutos que crescem e amadurecem,
Foram arrancados de seus galhos [...]
e foram destinados a um fim cruel
No triturador e na fornalha.

Os jovens do mundo
Não mais possuem a estrada:
A estrada os possui.
Eles não mais herdarão a terra:
A terra os herdou.
Eles não são mais os mestres do fogo:
O fogo tornou-se seu mestre;
Eles o servem, ele os destrói. [...]

Os jovens do mundo
Foram envolvidos pela morte
Que os cerca por toda parte
Num círculo de fogo e baionetas. [...]

Nicolau Sevcenko. O impacto da grande guerra e os clamores pela nova ordem. Em: D. O. Leituras. São Paulo, imprensa Oficial do Estado, jan./fev. 2002.

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