Guernica, Pablo Picasso
Picasso foi definitivo: "Gritos das crianças, gritos das mulheres, gritos dos pássaros, gritos das flores, gritos das camas, gritos das árvores e pedras, gritos dos tijolos, dos móveis, dos carros, das cadeiras, dos cortinados, das panelas, dos gatos e do papel, gritos dos cheiros, que se propagam um após o outro, gritos do fumo, que pica nos ombros, gritos que cozem na grande caldeira, e da chuva de pássaros que inundam o ar."
(Este poema, criado pelo artista, descreve os horrores vistos no quadro. A cidade de Guernica ficou em chamas após sucessivos ataques a bombas e metralhadoras. Seu pincel não se calou diante do ocorrido. Na tela, Picasso deposita toda sua consternação. A obra, ainda atual, está presente na memória artística da humanidade.)
Localizada numa região montanhosa, Guernica era uma cidade basca cuja população não passava de 7 mil habitantes. No dia 26 de abril de 1937, a cidade foi totalmente destruída por um bombardeio da força aérea alemã, que apoiava as forças do general Franco. Para o governo nazista da Alemanha, tratava-se de um teste: seu objetivo era observar os efeitos devastadores do bombardeio. Guernica era um ensaio para os ataques aéreos da Segunda Guerra Mundial.
Indignado com essa cruel experiência que acabou com a vida de centenas de pessoas e destruiu mais de 75% das casas da pequena cidade, o pintor espanhol Pablo Picasso (1881-1973) retratou os horrores do bombardeio num quadro que é hoje sua obra mais conhecida: Guernica.
O quadro, que mede 8 metros de largura por 3,5 metros de altura, tornou-se um símbolo contra as ditaduras e as guerras. O cavalo caído, derrotado, o guerreiro esquartejado, a mãe que clama com seu filho morto nos braços, a flor que nasce de uma mão sem vida, uma espada quebrada - são todos símbolos das vítimas da opressão e da violência política.
Atualmente esse quadro encontra-se em Madri, mas ficou cerca de trinta anos nos Estados Unidos, pois Picasso tinha determinado que Guernica retornasse à Espanha apenas quando terminasse a ditadura de Franco.
Picasso não chegou a ver sua pintura admirada pela população espanhola, já que o fim do regime franquista ocorreu somente em 1975, dois anos após a morte do artista.
A seguir, leia o depoimento do prefeito de Guernica após sua cidade ter sido bombardeada pelos nazistas, durante a Guerra Civil Espanhola:
Em pé, diante desses microfones, quero contar o que os meus olhos viram no lugar do que já foi Guernica, e tomo Deus como testemunha:
Envergonhados pelo monstruoso crime que cometeram, os rebeldes [seguidores de Franco] apelam para a falsidade para camuflar, para negar o mais vil das proezas da história, a total e absoluta destruição da cidade de Guernica.
Aquele dia fatal, 26 de abril, era dia de mercado e a cidade estava cheia de gente. Em Guernica havia milhares de camponeses de toda a vizinhança, numa atmosfera de camaradagem basca, e ninguém suspeitaria de que uma tragédia se aproximava.
Pouco depois das 4 da tarde, aviões jogaram nove bombas no centro da cidade.Procurávamos os feridos, quando mais aviões surgiram, jogando todo tipo de bombas, incendiárias e explosivas.
As feras que pilotavam tais aviões, lovo que avistavam nas ruas ou fora da cidade uma figura humana, focalizavam nela suas metralhadoras, semeando terror e morte, entre mulheres, crianças e velhos. Tal foi a tragédia de Guernica, cuja verdade eu, prefeito da cidade, afirmo diante do mundo inteiro.
A milícia estacionada em Guernica, naquele dia, era exatamente a mesma que havia confraternizado todos esses meses com o povo de Guernica, ganhando sua afeição. Foi a primeira a prestar auxílio naqueles momentos terríveis. Não foi nossa milícia que ateou fogo a Guernica, e, se o juramento de um alcaide cristão e basco tem algum valor, juro diante de Deus e da história que aviões alemães bombardearam cruelmente nossa cidade até riscá-la do mapa.
Guernica foi ferida, mas não morrerá. Da árvore brotarão novas folhas verdes em toda a primavera: seus filhos a ela retornarão, suas casas sendo reconstruídas, suas igrejas escutando novamente seus hinos e preces [...] Guernica, o símbolo de nossas liberdades nacionais, e o símbolo da ferocidade do fascismo internacional, não pode morrer.
(Declaração do prefeito de Guernica ao povo espanhol sobre a acusação dos rebeldes franquistas de que essa cidade basca tinha sido destruída pelos próprios republicanos, 4 de maio 1937. História do século XX. São Paulo: Abril, 1974. v. IV. p. 1 942.
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