Jean-Jacques
Rousseau, meditando no parque a La Rochecordon , perto de Lyon, 1770. Alexandre-Hyacinthe
Dunouy
[...] para Rousseau a humanidade não se tornou melhor ao progredir. Ao contrário, os progressos foram acompanhados de males tão difíceis de suportar que o homem primitivo, embora se abrigando precariamente e se alimentando apenas daquilo que a natureza oferecia, era mais feliz do que o homem civilizado. Assim, a visão que Rousseau tem da história humana é marcada por um certo pessimismo: aos ganhos do progresso sempre corresponde alguma perda inevitável.
Por exemplo, é claro que o fato de o homem natural ter aprendido a utilizar um instrumento qualquer para poder alcançar mais facilmente um fruto no alto de uma árvore constituiu um progresso. Mas, a partir desse momento, como passou a precisar de menos força física e agilidade para obter seu próprio alimento ou se defender, enfraqueceu-se fisicamente. Mais ainda, as perdas acarretadas pelo progresso não são apenas físicas, mas também psicológicas. O homem primitivo podia ser feliz dormindo embaixo de uma árvore, tão logo o sol de punha, sem pensar no dia seguinte. Hoje, nós, homens civilizados, não podemos suportar a vida ao relento; precisamos de uma casa confortável, de roupas, de coisas supérfluas; se não as temos, sentimo-nos infelizes. Na verdade, diz Rousseau, o homem moderno tornou-se escravo de suas necessidades.
No Discurso sobre a origem da desigualdade, Rousseau traça um quadro da vida do homem nas sociedades de seu tempo com uma tal perspicácia que parece falar dos homens de nossa própria época. Como é a condição do homem civilizado? Sua alma se consome em paixões violentas; os pobres se arruínam com trabalhos excessivos, enquanto os ricos adoecem por não fazer nada. Assim, uns morrem por causa das necessidades, outros por causa dos excessos. Isso sem falar nas misturas alimentares, nos temperos fortes, nas mercadorias adulteradas, nos remédios falsificados. Diz Rousseau no seu texto:
Se prestardes atenção às doenças endêmicas oriundas do ar confinado entre multidões de homens reunidos, às que são ocasionadas pela delicadeza de nosso modo de vida [...]. Se levardes em consideração os tremores de terra e os incêndios que, consumindo cidades inteiras, fazem com que os habitantes morram aos milhares; numa palavra, se reunirdes os perigos que todas estas causas juntam continuamente sobre nossas cabeças, vereis como a natureza faz com que paguemos caro o desprezo que demos às suas lições.
Para o filósofo, quanto mais os homens se distanciaram de suas origens, mais infelizes se tornaram.
É por isso que Rousseau, no livro O Emílio (1762), ao perguntar qual a utilidade do estudo da história para os jovens e quais seriam os melhores livros para os adolescentes, responde que de nada adianta, para a formação moral dos alunos, estudar a história dos povos modernos e civilizados. Nela só vemos guerras, injustiças, sofrimento, desigualdade. É melhor estudar a história dos povos antigos. Menos distanciados da natureza, os povos da Antiguidade podem nos dar exemplos de virtude cívica, de força moral, de generosidade - qualidades que os civilizados acabaram perdendo na busca do progresso.
Contudo, uma coisa é certa para Rousseau: se a história humana começou mal e deu como resultado este mundo injusto e tumultuado no qual vivemos, isso não é culpa de algum pecado, nem é um castigo de Deus. Ao contrário, os males que nos atormentam são em sua maioria obra do próprio homem; assim, não são por natureza necessários ou fatais. Rousseau, portanto, rejeita a doutrina providencialista. A história é para ele o resultado das decisões e ações dos homens em relação a suas instituições sociais e à sua cultura. Se é assim, nem tudo está perdido para a humanidade.
NASCIMENTO, Milton Meira do; NASCIMENTO, Maria das Graças S. Iluminismo: a revolução das luzes. São Paulo: Ática, 2008. p. 41-3. (História em movimento)
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