Aldeia de índios tapuios cristianizados, Rugendas
Chegam os mamelucos da região de São Paulo, caçadores de índios, devastadores de terras: avançam ao som da caixa, bandeira estendida e ordem militar, troar de guerra, vento de guerra, através do Paraguai. Trazem longas cordas com colares para os índios que agarrarão, e venderão como escravos nas plantações do Brasil.
Os mamelucos ou bandeirantes estão há anos arrasando as missões dos jesuítas. Das treze missões do Guayrá, não sobram mais que pedra e carvão. Novas comunidades evangélicas nasceram do êxodo, águas abaixo do Paraná; mas os ataques, incessantes, continuam. Nas missões, a serpente encontra os passarinhos reunidos e engordados, milhares de índios treinados para o trabalho e a inocência, sem armas, fáceis para o bote. Sob a tutela dos sacerdotes, os guaranis partilham uma vida regulada, sem propriedade privada nem dinheiro nem pena de morte, sem luxo nem escassez, e caminham para o trabalho ao som das flautas. Nada podem suas flechas de taquara contra os arcabuzes dos mamelucos, que provam os aços de suas alfanjes fendendo em duas partes as crianças e que como troféu levam tiras esfarrapadas de batinas e caravanas de escravos.
Mas desta vez uma surpresa espera pelos invasores. O rei da Espanha, assustado pela fragilidade destas fronteiras, ordenou que entregassem armas de fogo aos guaranis. Os mamelucos fogem em debandada.
Das casas brotam penachos de fumaça e cantos de alabança a Deus. A fumaça, que não é de incêndio e sim de lareiras, celebra a vitória.
GALEANO, Eduardo. Memória do fogo: Os nascimentos. Porto Alegre: L&PM, 2013. p. 222.
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