Engels via os trabalhadores amontoados como ratos em suas moradas apertadas, famílias inteiras - e às vezes mais de uma família - socadas num único cômodo, os sãos junto aos doentes, adultos junto às crianças, parentes próximos dormindo juntos, às vezes sem camas, por terem sido obrigados a vender todos os móveis para serem queimados como lenha, às vezes em porões úmidos de onde se tirava água aos baldes quando chovia, às vezes vivendo no mesmo cômodo que os porcos comendo farinha misturada com gesso e chocolate misturado com terra, intoxicados por carne impregnada de ptomaína, drogando a si próprios e a seus filhos doentios com láudano: vivendo sem esgotos, em meio a seus próprios excrementos e lixo, vitimados por epidemias de tifo e cólera, que por vezes chegavam até os bairros mais prósperos.
Mulheres e crianças trabalhando em uma fábrica de algodão, Inglaterra, 1830. Artista desconhecido.
A demanda crescente de mulheres e crianças nas fábricas fazia com que muitos chefes de família se tornassem desempregados crônicos, prejudicava o crescimento das meninas, facilitava o nascimento de filhos de mães solteiras e ao mesmo tempo obrigava as jovens mães a trabalharem grávidas ou antes de se recuperarem plenamente do parto, terminando por encaminhar muitas delas à prostituição. As crianças, que começavam a trabalhar nas fábricas aos 5 ou 6 anos de idade, recebiam pouca atenção das mães, que também passavam o dia inteiro na fábrica, e nenhuma instrução de uma sociedade que só queria delas que executassem operações mecânicas. Quando as deixavam sair das verdadeiras prisões que eram as fábricas, as crianças caíam exaustas, cansadas demais para lavar-se ou comer, quanto mais estudar ou brincar - às vezes cansadas demais até para ir para casa. Também nas minas de ferro e carvão, mulheres e crianças, juntamente com os homens, passavam a maior parte de suas vidas rastejando em túneis estreitos debaixo da terra, e, fora deles, viam-se presas nos alojamentos da companhia, à mercê da loja da companhia, sofrendo atrasos no pagamento do salário de até duas semanas. Cerca de mil e quatrocentos mineiros morriam por ano quando se partiam cordas apodrecidas, quando desabavam túneis devido à escavação excessiva dos veios, quando ocorriam explosões devido à ventilação deficiente ou à negligência de uma criança exausta: e os que escapavam de acidentes catastróficos morriam de doenças dos pulmões. Por sua vez, os habitantes do interior, que com a industrialização perderam sua antiga condição de artesãos, pequenos proprietários e arrendatários de quem, mal ou bem, os grandes proprietários cuidavam - esses haviam sido transformados em diaristas sem eira nem beira, por quem ninguém era responsável, e que eram castigados com a prisão ou a deportação se, em épocas de necessidade, roubavam e comiam a caça das terras dos grandes proprietários.
Crianças trabalhando em uma fábrica de algodão, Artista desconhecido
Para Engels, parecia que o servo medieval, que ao menos estava fixo à terra e ocupava uma posição definida na sociedade, estivera em melhor situação que o operário industrial. Naquela época em que as leis de proteção aos trabalhadores praticamente ainda não existiam, os antigos camponeses e trabalhadores braçais da Inglaterra, e até mesmo a antiga pequena burguesia, estavam sendo levados para as minas e as fábricas, tratados como matéria-prima para os produtos a serem fabricados, sem que ninguém se importasse nem mesmo com o problema do que fazer com o refugo humano gerado pelo processo. Nos anos de depressão, o superávit de mão-de-obra, que era tão útil nos anos em que a economia ia bem, era despejado nas cidades: estas pessoas tornavam-se mascates, varredores, lixeiros ou simplesmente mendigos - viam-se às vezes famílias inteiras mendigando nas ruas - e, o que era quase igualmente comum, prostitutas e ladrões. Thomas Malthus - dizia Engels - afirmara que o aumento de população estava sempre pressionado os meios de subsistência, de modo que era necessário que grande número de pessoas fossem exterminadas pela miséria e pelo vício; e a nova legislação referente aos pobres havia posto em prática essa doutrina, transformando os asilos de indigentes em prisões tão desumanas que os pobres preferiam morrer de fome pelas ruas.
WILSON, Edmund. Rumo à Estação Finlândia. São Paulo: Companhia das Letras, 1987. p. 132-133.
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