"Os espelhos estão cheios de gente.
Os invisíveis nos vêem.
Os esquecidos se lembram de nós.
Quando nos vemos, os vemos.
Quando nos vamos, se vão?"
Eduardo Galeano: Espelhos

sexta-feira, 5 de setembro de 2014

Gregos, romanos e africanos

O conhecimento do mundo ocidental sobre o continente negro sempre foi precário. Desde a Antiguidade Ocidental, a imagem da África foi fantasiosa, sem respaldo de uma ideia sólida sobre o povo africano. Heródoto, historiador grego do século V a.C., acreditava que os homens nascidos ao sul do Saara tinham cabeça de cão e os olhos no peito. Com base nos seus estudos, o romano Plínio, o Velho, no século I d.C., escreveu que os habitantes da África Negra tinham perdido as características de seres humanos. Ptolomeu, geógrafo grego, do século II d.C., cujos escritos serviram, até o período do Renascimento, como fontes para os estudiosos ocidentais descreverem geograficamente o mundo, dizia que, abaixo da região da Floresta Tropical, era impossível existirem seres humanos. Essas terras tórridas e os homens e os homens que lá viviam eram deformados, monstruosidades resultantes do clima. Os gregos e os romanos tinham ideias confusas a respeito dos limites geográficos africanos e nada sabiam das diferenças internas do continente.

Mapa do mundo de Ptolomeu, 150 d.C. Redesenhado no século XV.

O mundo cristão medieval perpetuou essa ignorância. A Idade Média Ocidental contribuiu muito para uma percepção especulativa sobre a desigualdade dos negros, favorecendo, assim, a consolidação dos estereótipos populares que continuaram a contaminar a compreensão dos europeus sobre aquelas sociedades. Somente na Europa renascentista a visão do mundo ptolomaico foi ultrapassada, quando as grandes viagens pelo Atlântico provaram que a África Negra não era povoada por monstros. Apesar de não duvidar que o continente negro fosse um mundo real, persistiram, no imaginário da Europa cristã, os mitos herdados dos tempos clássicos. Com base nesse imaginário, criaram-se paralelos entre a cor negra, o diabo e o pecado.

Hoje, o conhecimento do continente africano situa-se em graus mais elevados do que há 50 anos na História Universal. Apesar disso, permanecem grandes lacunas sobre o conhecimento de áreas específicas do continente.


PANTOJA, Selma. Uma antiga civilização africana: história da África Central Ocidental. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2011. p. 17-18.

NOTA: O texto "Gregos, romanos e africanos" não representa, necessariamente, o pensamento deste blog. Foi publicado com o objetivo de refletirmos sobre a construção do conhecimento histórico. 

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