O realismo, movimento dominante na arte e na literatura em meados do século XIX, opunha-se ao sentimentalismo e à veneração da vida interior que caracterizavam o romantismo. Os românticos exaltavam a paixão e a intuição, deixavam-se conduzir por sua imaginação a um passado medieval pretensamente idílico e buscavam a solidão interna em meio às maravilhas da natureza. Os realistas, por sua vez, concentravam-se no mundo real: nas condições sociais, no modo de vida contemporâneo e nos detalhes conhecidos da vida cotidiana. Com um distanciamento clínico e um zelo meticuloso, analisavam a visão, o trabalho e o comportamento das pessoas.
Mulher pobre da aldeia, Gustave Courbert
Tal como os cientistas, os escritores e artistas realistas investigavam minuciosamente o mundo empírico. Gustave Courbert (1819-1877), por exemplo, representante do realismo na pintura, buscou pôr em prática o que ele denominava "arte viva". Assim, dedicou-se a pintar pessoas comuns e cenas corriqueiras: trabalhadores quebrando pedras, camponeses lavrando o solo ou voltando de uma feira, um funeral no campo, lutadores, banhistas, grupos familiares. Em estilo prosaico, sem nenhuma tentativa de glorificação, os artistas do realismo também representaram limpadores de chão, trapeiros, prostitutas e mendigos.
Procurando retratar a vida tal como ela é, os escritores realistas frequentemente abordam os ultrajes sociais e os aspectos sórdidos do comportamento humano e da sociedade. Em seus romances, Honoré de Balzac (1799-1850) descreveu de que maneira os fatores econômicos e sociais afetavam o comportamento das pessoas. Esboços (1852), de Ivan Turguéniev, retratou as condições rurais na Rússia e expressou compaixão pela vida brutalmente difícil dos servos. Em Guerra e paz (1863-1869), Leon Tolstói descreveu com detalhes os costumes e a visão de mundo da nobreza russa, bem como as tragédias que se seguiram à invasão da Rússia por Napoleão. Em Anna Karenina (1873-1877), abordou a realidade das divisões de classe e a complexidade das relações conjugais. Os romances de Charles Dickens - Bleak House (1853), Hard Times (1854) e vários outros - descreviam a vileza da vida, a hipocrisia da sociedade e a massacrante rotina de trabalho nas cidades industriais inglesas.
Muitos consideram Madame Bovary (1857), de Gustave Flaubert, o romance realista por excelência; narra a história de uma esposa egocêntrica que, mostrando sua aversão ao marido - um homem devotado e diligente, mas fraco -, comete adultério. Ao comentar o realismo da obra, um crítico observou que ela "reflete uma obsessão com a descrição. Os detalhes são relatados um a um, dando-se a todos a mesma importância, cada rua, cada casa, cada livro, cada folha de grama, tudo é descrito em pormenor".
O realismo literário evoluiu para o naturalismo quando os escritores tentaram demonstrar a existência de uma relação causal entre o caráter humano e o ambiente social: de que certas condições de vida produziam traços de caráter previsíveis nos seres humanos. A crença de que a lei de causa e efeito regia o comportamento humano refletia o enorme prestígio atribuído à ciência nas últimas décadas do século XIX. Émile Zola (1840-1902), o principal romancista do naturalismo, sondou cortiços, bordéis, vilas de mineradores e cabarés da França, examinando de que maneira as pessoas eram condicionadas pela sordidez do ambiente em que viviam. O norueguês Henrik Ibsen (1828-1906), o mais destacado dramaturgo naturalista, estudou com precisão clínica as classes comerciais e profissionais, suas ambições pessoais e relações familiares. Em Pilares da sociedade (1877), vasculhou as pretensões sociais e a hipocrisia burguesas. O tema de sua Casa de bonecas (1879) chocou a platéia burguesa do final do século XIX: a mulher que deixa seu marido em busca de uma vida mais gratificante.
No esforço de oferecer um retrato real do comportamento humano e do ambiente social, o realismo e o naturalismo reproduziram as atitudes moldadas pela ciência, pelo industrialismo e pelo secularismo, que enfatizavam a importância do mundo externo. A mesma perspectiva também deu origem, na filosofia, ao positivismo.
PERRY, Marvin. Civilização ocidental: uma história concisa. São Paulo: Martins Fontes, 2002. p. 421-423.
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